- Folha de S. Paulo
Extinguir a vigilância eletrônica que reprime acidentes é agir contra a vida
As asnices oficiais, a um só tempo tristes e anedóticas, juntam-se ao blá-blá-blá sobre a Previdência e formam uma névoa que encobre certos atos de irresponsabilidade ou de má-fé no governo. Até mesmo com grande potencial de ameaça à vida.
Embora em Israel, Jair Bolsonaro propalou um exemplo desses atos, cuja alucinação é comprovável em números captados por meio eletrônico. Pela internet, interrompeu a participação na campanha eleitoral da direita radical israelense e comunicou o fim, à medida que acabem os contratos, da vigilância eletrônica das velocidades em rodovias federais —as lombadas eletrônicas ou radares fixos.
Não teve cerimônia em expor seu raciocínio: "É quase impossível você viajar sem receber uma multa". Culpa dos radares. Não lhe ocorreu que multas respondem ao abuso de quem dirige, e não do radar. Do próprio Bolsonaro, pois, nas idas dos fins de semana em Angra dos Reis. Onde, por sinal, o ímpeto desordeiro submeteu-o a outro tipo de multa, por invadir estação ecológica vedada à presença humana, por uso de motor de popa e pesca proibida na área. O fiscal do Ibama que o multou foi demitido há dias.
A eficiência dos radares está comprovada pela redução de mortes nas estradas que os têm. E ainda pelo aumento de 50% dos registros de infração em 2017-18. Extinguir a vigilância eletrônica que reprime a provocação de mortes, portanto, é agir contra a vida. Coerente em governo que promove o uso de armas, porém mais uma atitude contrária ao povo desprovido de governo.
Bolsonaro armou-se também de um argumento ao gosto popular: "Por que queremos acabar com isso? É a indústria da multa, é para meter a mão no seu bolso, nada além disso". É ainda a campanha da mentira. O pagamento das multas é recolhido pelo governo, sem participação das concessionárias.
Não é diferente, senão na forma, a providência de Sergio Moro como ministro da Justiça: uma comissão especial para estudar os tributos incidentes sobre os cigarros. Bem entendido, para a possibilidade de que o ministro sugira a redução. Em toda parte, mesmo no Brasil e apesar da força dos fabricantes e da publicidade, há sempre mais medidas para reduzir o consumo de tabaco, em especial o do cigarro. Apesar da astronômica arrecadação que a indústria cigarreira representa para os governos, a luta da medicina se impôs contra essa causa de doenças horríveis e mortes prematuras. É uma vitória de alcance mundial.
O ministro da Justiça nada tem a ver com tributos. O pretexto é o contrabando de cigarro paraguaio, que, na verdade, nem sempre é paraguaio: é brasileiro mesmo, dá umas voltinhas e figura como estrangeiro contrabandeado. Contrabando é reprimível com ação policial eficaz, cuja responsabilidade, no caso, é do ministro da Justiça interessado em tributos que baixem o preço do cigarro brasileiro.
Cigarro mais barato é estímulo a consumo maior. No mínimo, à contenção da constante queda. Logo, é um modo de disseminar doenças e mortes em maior número, sobretudo entre jovens e os mais pobres, uns e outros com menos dinheiro disponível. Missão injustificável que Sergio Moro se atribuiu. Ou aceitou. Em favor da única indústria que tem um lobby equivalente ao das armas, se não mais forte.
Um comentário:
O presidente e seus ministros estão querendo encurtar a vida de todo mundo,de repente é pra salvar a previdência da bancarrota.
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