domingo, 14 de dezembro de 2025

Opinião do dia – Karl Marx* (Democracia)

“Hegel parte do Estado e faz do homem o Estado subjetivado; a democracia parte do homem e faz do Estado o homem subjetivado. Do mesmo modo que a religião não cria o homem, mas o homem cria a religião, assim também não é a constituição que cria o povo, mas o povo a constituição. A democracia, em um certo sentido, está para as outras formas de Estado como o cristianismo para outras religiões. O cristianismo é a religião ’preferencialmente’, a essência da religião, o homem deificado como uma religião particular. A democracia é, assim, a essência de toda constituição política, o socializado como uma constituição particular; ela se relaciona com as demais constituições como gênero como suas espécies, mas o próprio gênero aparece, aqui, como existência e, com isso, como uma espécie particular em face das existências que não contradizem a essência. A democracia relaciona-se com todas as outras formas de Estado como com seu velho testamento. O homem não existe em razão da lei, mas a lei existe em razão do homem, é a essência humana, enquanto nas outras formas de Estado o homem é a existência legal. Tal é a diferença fundamental da democracia."

*Karl Marx (1818-1883), Critica da filosofia do direito de Hegel, p.50. Boitempo Editorial, 2005

 

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Brasil reforça desigualdade com gasto e juros altos

Por Folha de S. Paulo

Governo Lula busca justiça tributária, mas impede avanço ao favorecer rentismo com despesas descontroladas

Serão R$ 1 tri em juros pagos neste ano a quem tem dinheiro aplicado, o que estimula perpetuação de desigualdades via 'financeirização'

A desigualdade é traço característico da história da humanidade, e soa utópica uma configuração igualitária entre todos do ponto de vista econômico. A maior tentativa de experiência moderna nesse sentido foi a falida União Soviética, que acabou aderindo ao sistema capitalista no início dos anos 1990.

Afinal, alguns indivíduos ousam mais do que outros, correm riscos e acabam recompensados por criar oportunidades e invenções que os enriquecem, ao mesmo tempo em que espraiam bem-estar social com produtividade.

É bom o Brasil sair às ruas. Por Dorrit Harazim

O Globo

Sobram motivos para a crescente ira cívica diante do apodrecimento moral, ético e político da Casa do Povo

Uma parte do Brasil promete ir às ruas hoje. A esbórnia encenada na Câmara acéfala do minúsculo Hugo Motta, e pela liderança ressentida de Davi Alcolumbre no Senado, conseguiu atropelar o torpor nacional. Truculência institucional à parte, o estopim para a convocação dos movimentos sociais de esquerda foi a aprovação do PL da Dosimetria, que reduz as penas para condenados nos atos antidemocráticos do 8 de Janeiro, enxugando para pouco mais de 36 meses os 27 anos de prisão do chefe da quadrilha e ex-presidente, Jair Bolsonaro.

Sobram, portanto, motivos para a crescente ira cívica diante do apodrecimento moral, ético e político da Casa do Povo. Mas indignação sem ação serve apenas para aplacar a consciência do indignado — libera-o da obrigação de analisar como chegamos a este nível de apodrecimento. Ir às ruas empunhando um cartaz “Congresso Inimigo do Povo” é fácil, porém quase suicida — equivale ao direitista “STF Inimigo do Povo”. Bem mais eficaz é tomar as ruas nomeando quem julgamos indignos do voto recebido e trabalhar para que não sejam reeleitos.

País em transe. Por Merval Pereira

O Globo

Ministro do STF viajar de jatinho particular de empresário com advogado de banqueiro corrupto é uma versão moderna dos favores dos senhores de engenho.

O cineasta Glauber Rocha esteve presente na boca de repórteres, comentaristas e locutores na semana passada, quando a crise institucional estava em seu auge. Tratou-se de um lapsus linguae coletivo, erro acidental que altera o sentido do que se quer falar considerado pela psiquiatria expressão de pensamentos reprimidos. O objeto dos comentários era a cassação do deputado do Psol Glauber Braga, mas o ambiente político era o dos filmes do outro Glauber, que muitos anos antes, na década de 1960, mostrou nas telas em filmes como Deus e o Diabo na Terra do Sol ou Terra em Transe as trapaças dos deputados corruptos, dos empresários venais, dos donos de terras que exploram os trabalhadores, o mesmo panorama que, 65 anos depois, nos confronta hoje.

Entre as dores e as artes do Brasil. Por Míriam Leitão

O Globo

A arte vira abrigo em uma semana de tensão institucional entre os Três Poderes e afrontas ao Estado de Direito

A literatura e o teatro me protegeram enquanto eu atravessava a tormentosa semana que passou. Conflitos entre poderes chegaram ao nível de se temer pela firmeza dos edifícios. Uma ventania, que lembrou ciclone, varreu São Paulo avisando que os extremos do clima chegaram. No domingo, li “Coração sem medo” de Itamar Vieira Junior e, logo de início, me encantei com esta frase: “As águas, as águas daquele instante, correm para sempre e sem destino”.

Nos dias da semana, o Congresso nos deu seguidas razões para a descrença. Na terça-feira, as cenas de briga física no arranca-deputado da cadeira da presidência da Câmara foram inomináveis. Votações ruins na madrugada informaram que o parlamento brasileiro espera os eleitores dormirem para sorrateiramente cumprir seus desígnios. A quinta-feira amanheceu sobre o nosso espanto porque a Câmara havia ultrapassado todos os limites, atacando uma das bases fundantes do Estado de Direito: a de que ordem judicial se cumpre.

A doutora Viviane Moraes e o Master. Por Elio Gaspari

O Globo

O repórter Lauro Jardim revelou no último dia 7 que a Polícia Federal (PF) encontrou na papelada do Banco Master um contrato de honorários do escritório da advogada Viviane Barci de Moraes.

Dois dias depois, a repórter Malu Gaspar deu detalhes do negócio:

O contrato entre o escritório da doutora Viviane e o banco do doutor Daniel Vorcaro previa uma remuneração total de R$ 129 milhões ao longo de 36 meses. Isso daria o pagamento de R$ 3,6 milhões mensais, e uma mensagem capturada pela PF indica que o doutor Vorcaro instruiu sua tesouraria para dar prioridade aos pagamentos ao escritório.

A banca da doutora Viviane atuou em pelo menos um caso, com uma equipe de dez advogados, entre os quais estavam seu filho e sua filha.

Viviane Barci de Moraes é a mulher do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

A equipe de Malu Gaspar procurou o escritório da doutora, representantes do banco e o próprio ministro Alexandre de Moraes. Silêncio total.

Em maio de 2024 o banco Master custeou uma farofa londrina que incluía um painel enfeitado pelo ex-primeiro ministro Tony Blair, um farofeiro cosmopolita. O ministro Alexandre de Moraes esteve em painéis do evento.

O governo Boric, sucessão chilena e isolamento de Lula. Por Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

As eleições no Chile simbolizam o esgotamento de um ciclo da esquerda latino-americana, que não traduziu vitória eleitoral em hegemonia social e avanço econômico

Os chilenos vão às urnas hoje para escolher seu novo presidente. À noite saberemos quem ganhou as eleições, se Jeannette Jara — militante comunista, representante das esquerdas — ou José Antônio Kast — líder extremista do Partido Republicano, candidato das direitas. O presidente do Chile, Gabriel Boric, encerra um ciclo político no qual governos de centro-esquerda e centro-direita, desde a redemocratização, se alternaram no poder. Nada será como antes no Chile.

O fracasso do governo Boric expressa o esgotamento de um projeto pautado pela promessa de renovação geracional e moral, que se perdeu entre maximalismos identitários, incapacidade de construir maiorias sociais estáveis e uma leitura equivocada das prioridades chilenas após o chamado "estalido social", que durou de 2019 a 2021. Ao fim de quatro anos, Boric entrega um país mais inseguro, politicamente fragmentado e desconfiado do Estado, sem ter conseguido converter seu capital simbólico renovador em governabilidade efetiva.

‘Boa sorte’, Flávio! Por Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Flávio livra Tarcísio da armadilha de Lula, que o trata como ‘candidato de Bolsonaro’

Ao retirar a Lei Magnitsky de Alexandre de Moraes e sua mulher, Viviane, Donald Trump decretou o isolamento de Jair Bolsonaro, encerrou a carreira de traidor da Pátria do 03, Eduardo, e deixou a candidatura (ou “candidatura”) do 01, Flávio, à Presidência ainda mais desamparada. Lula agradeceu a Trump, mas quem faz a festa é o Centrão. Por ora.

Gilberto Kassab, do PSD, sigla do Centrão que tem mais municípios no País, deu a deixa. Na véspera do recuo do presidente americano, Kassab desejou um protocolar “boa sorte” a Flávio e declarou apoio a Tarcísio de Freitas (SP), com o cuidado de citar os também governadores Ratinho Jr. (PR) e Eduardo Leite (RS) como planos B e C.

Emprego, inflação e governo em nova disputa. Rolf Kuntz

O Estado de S. Paulo

Apesar do crescimento recente, é muito arriscado apostar em condições favoráveis no futuro próximo

Mais empregos, mais consumo e mais comida são os dados mais positivos no final do terceiro ano do atual mandato do presidente Lula, mas a qualidade dos empregos tem sido contestada e o mercado aponta insegurança nas contas públicas. Os 4,46% de inflação nos 12 meses até novembro indicam algum avanço na contenção dos preços. Mas essa taxa está muito próxima do teto da meta, 4,5%, e dificulta a redução dos juros. A taxa básica de 15% fixada pelo Banco Central deverá permanecer até o começo do ano e depois será reduzida lentamente, se nenhuma faísca reavivar a inflação. Há quem proponha o abandono da meta de 3% com tolerância de 1,5 ponto porcentual, mas a mudança pode ser perigosa, se resultar em maior tolerância a desarranjos das contas públicas.

Trump busca distensão com Brasil. Por Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Decisões de Trump, de adotar ou retirar sanções, se restringem a cálculos políticos do presidente

A decisão de retirar Alexandre de Moraes e sua mulher Viviane Barci da lista de sancionados pela Lei Magnitsky é parte da mudança radical na estratégia de Donald Trump para o Brasil. A aprovação do projeto de lei que reduz as penas para os acusados de tentativa de golpe, incluindo Jair Bolsonaro, explica o timing do anúncio, mas não a decisão em si, que já estava tomada.

Até porque o projeto ainda pode ser vetado por Lula. Se o governo americano quisesse ir em outra direção, poderia usar o escândalo envolvendo a contratação milionária de Viviane pelo banco Master, como pretexto até para adotar sanções secundárias contra bancos e empresas que prestam serviços ao casal.

Relação entre Motta e Lira azeda com sequência de crises. Por Beatriz Roscoe

Valor Econômico

Ex-presidente da Câmara afirmou a aliados que era preciso "reorganizar" a Casa

A relação entre o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e seu antecessor, Arthur Lira (PP-AL), voltou a azedar na última semana, após declarações de Lira a aliados em que classificou a Câmara como uma “esculhambação” e disse que era preciso “reorganizar” a Casa. Motta rebateu dizendo que a Presidência da Casa não deve servir como “ferramenta de revanchismo”.

Mesmo assim, os dois estiveram juntos na sexta-feira (12), depois de a Polícia Federal (PF) vasculhar o gabinete na Câmara de uma ex-assessora de Lira. A investigação, conduzida pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), mira irregularidades em emendas parlamentares.

O novo sistema político corrupto. Por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Todas as grandes operações recentes de polícia e Justiça esbarram na cúpula do poder

Além da roubança, caso das emendas deturpa eleições, votações parlamentares e negócios

O deputado federal Arthur Lira (PP-AL) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI) comandaram o semipresidencialismo de avacalhação de Jair Bolsonaro, a partir de 2021. Lira era presidente da Câmara; Nogueira, ministro da Casa Civil. Tentam manter o mando puxando por exemplo as cordinhas que movimentam o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que se enrola no barbante.

Poderosos têm muitos amigos, assessores, indicados e aliados. Lira e Nogueira são uns azarados, por assim dizer. Seus companheiros aparecem na mira de investigações como Carbono OcultoPoço de Lobato, Banco Master e, nesta semana, em mais uma rodada de apuração do rolo das emendas parlamentares.

Trump larga Bolsonaro. Por Celso Rocha de Barros

Folha de S. Paulo

Sem a perspectiva de uma vitória fácil e barata, Trump deixou o Brasil de lado

A democracia brasileira ganhou sua queda-de-braço com a superpotência, mas continua ameaçada pelos bolsonaristas

É cedo para dizer que Trump não causará mais problemas ao Brasil, mas o líder americano já não parece disposto a nos causar problemas por causa de Jair Bolsonaro.

Na sexta-feira (12), o governo Trump retirou Alexandre de Moraes e sua esposa da lista de sancionados pela Lei Magnitsky. Jair continua em cana.

A dupla de palhaços Bananinha e Pauleta havia prometido para Trump uma vitória fácil e barata no Brasil. Segundo a cascata que vendiam, a população brasileira estava prestes a se revoltar contra Lula e o STF porque acreditava que a eleição de 2022 havia sido roubada. Em 2022, diziam, Jair teria tentado se rebelar contra isso, sem, entretanto, conseguir apoio do governo Biden. Se Trump acendesse a fagulha, mentiam Bananinha e Pauleta, o Brasil explodiria em uma revolta que instauraria em Brasília um governo 100% dócil diante dos Estados Unidos.

Com disputa entre Poderes, Brasil vive baderna institucional. Por Christian Lynch

Folha de S. Paulo

Colapso do presidencialismo de coalizão implodiu modelo de governabilidade e abriu caminho para Executivo fraco

Centrão se apropriou do Orçamento federal e busca, em afronta ao STF, absoluta impunidade de seus membros

[RESUMOEm análise da conjuntura política do país, autor argumenta que reconstruir um modelo de governabilidade estável se tornou inviável, já que cada Poder busca reafirmar a sua supremacia sem um pacto mínimo de convivência. Enquanto o Executivo busca recuperar seu poder de agenda, o STF resiste a perder espaço, a extrema direita bolsonarista tenta voltar à Presidência e o centrão se empenha em consolidar sua hegemonia no Congresso.

O artigo 2º da Constituição afirma que os Poderes da República são "independentes e harmônicos entre si". Trata-se de uma quimera: se são independentes, não são automaticamente harmônicos e, se pretendem sê-lo, precisarão moderar essa independência.

A harmonia institucional não decorre do texto constitucional, mas de modelos de governabilidade criados a partir de sua interpretação —modelos capazes de coordenar expectativas, prerrogativas e ambições de cada Poder, criando previsibilidade em suas relações. Quando esses modelos existem, o regime constitucional respira; quando se desfazem, o país entra em espiral de instabilidade.

Transparência afugenta as excelências. Por Dora Kramer

Folha de Paulo

O Supremo cobra correção a todos, mas não enquadra os seus às boas práticas da ética do comportamento

Negação ao código de conduta submete STF à lógica do faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço

Supremo Tribunal Federal cumpre seu dever quando avaliza atuação do ministro Flávio Dino no encalço dos parlamentares que violam requisitos de transparência e absoluta correção no uso das emendas ao Orçamento.

Parte do tribunal, contundo, prefere que os outros façam o que dizem os juízes, mas os deixem livres para fazerem o que bem entendem. É o que se depreende da resistência à criação de um código para regular condutas no exercício da magistratura.

Um clã bizarro no palco eleitoral. Por Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Briga da família Bolsonaro lembra "A Megera Domada", uma das primeiras comédias shakespearianas

A mulher de 'seu' Jair evoca a Catarina da obra por ser considerada tanto pelos enteados como pelo PL uma 'personagem incontrolável'

O apetite sucessório é só mordida e entredevoração. Houve quem associasse o racha no clã Bolsonaro à disputa entre as filhas do "Rei Lear", de Shakespeare, pela tomada do poder. O rei enlouquece, as filhas morrem. A briga do clã, entretanto, tem mais a ver com "A Megera Domada", uma das primeiras comédias shakespearianas, que narra os percalços da indomável Catarina com Petrúcio, o fidalgo de Verona, seu pretendente. Ao olhar woke, uma trama misógina. No fundo, uma bem-humorada discussão sobre desigualdade de gênero.

Poesia | Extravio, de Ferreira Gullar

 

Música | Sambô - Não deixe o Samba morrer