O Globo
Lula recorreu a Cortes internacionais
legítimas, enquanto Bolsonaro provocou um estrago econômico no país
incentivando a intervenção de um governo estrangeiro.
O presidente Lula, em seu bem estruturado
discurso de lançamento do programa Brasil Soberano, para ajudar as empresas que
serão prejudicadas pelo tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald
Trump, disse que o processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro corre dentro
dos parâmetros legais em vigor. Ele mesmo fez a comparação com seu próprio
caso, afirmando que não reclamara da Justiça e acatara a decisão final, indo
para a cadeia. Não é verdade que não tenha reclamado, direito de todo cidadão
acusado de algum crime.
Desde o início, seu advogado, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin, classificou de lawfare — transformar o sistema jurídico em uma arma com fins políticos — o processo contra Lula. No caso atual, os bolsonaristas acusam o Supremo de lawfare, alegando que tudo é feito com o objetivo de impedir que Bolsonaro dispute a eleição do próximo ano. Como os petistas acusaram o Supremo na ocasião da condenação de Lula, que liderava as pesquisas de opinião antes de ser preso.
A sensação dos bolsonaristas é que, em caso
de vitória de candidato oposicionista, o ex-presidente receberá um indulto que
o recolocará na vida política legalizada, mesmo que tenha de cumprir a
inelegibilidade a que foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral. De
qualquer maneira, as exorbitâncias jurídicas atribuídas às decisões do ministro
Alexandre de Moraes — apontadas pelo governo americano como prova de que há
abuso aos direitos humanos em curso no Brasil — serão arguidas no Supremo
tantas vezes quanto foram pela defesa de Lula. Isso torna possível chegar à
mesma conclusão. Uma diferença fundamental é que Lula recorreu a Cortes
internacionais legítimas, enquanto Bolsonaro provocou um estrago econômico no
país incentivando a intervenção de um governo estrangeiro.
A Primeira Turma do Supremo, presidida pelo
ministro Gilmar Mendes, considerou o então juiz Sergio Moro parcial nos
julgamentos que condenaram Lula, e a jurisdição de Curitiba, depois de cinco
anos de discussão, foi considerada inadequada. Tudo isso propiciou a anulação
pura e simples de todos os resultados dos julgamentos. A maioria dos condenados
foi solta devido a tecnicalidades abertas com as ressalvas do Supremo, e hoje,
legalmente, não aconteceu o petrolão.
A multa de bilhões que a Petrobras aceitou
pagar a investidores estrangeiros pela corrupção na empresa, desvalorizando as
suas ações no exterior, não parece comover os ministros do Supremo,
especialmente Dias Toffoli, que ultimamente tem, com uma canetada, liberado
vários condenados. A confissão dos delatores foi transformada em fruto de
tortura psicológica. O dinheiro que devolveram dissolveu-se no ar.
Do mesmo modo, os bolsonaristas alegam que a
jurisdição correta para julgar Bolsonaro é a primeira instância, não o Supremo;
as prisões preventivas alongadas, tão condenadas pelo Supremo, especialmente
pelo ministro Gilmar Mendes, acontecem de novo; o lawfare é alegado mais uma
vez, pela defesa de Bolsonaro. De tanto insistir nessa tese, Zanin foi
promovido de advogado de Lula a ministro do STF. Os advogados de Bolsonaro
podem ter a mesma expectativa. Mas demorará um pouco.
A composição do Supremo passou a ser uma
temática importante para a próxima campanha presidencial. Caso Lula se reeleja,
terá em seu quarto governo pelo menos três vagas para indicar: o ministro Luiz
Fux fará 75 anos em abril do segundo ano do mandato presidencial; a ministra
Cármen Lúcia e o decano Gilmar Mendes, respectivamente, no penúltimo e no
último ano. Sem contar a possível antecipação da aposentadoria de algum ministro,
a mais provável do atual presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, que
desejaria sair ainda neste ano.
Lula consolidaria, assim, maioria confortável
no Supremo. Caso um governante de direita seja eleito no ano que vem, com essas
três mudanças e, em caso de reeleição, mais uma quarta, a do presidente eleito
Luiz Edson Fachin em fevereiro do penúltimo ano do eventual segundo mandato,
poderá compor a maioria do plenário.
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