Congresso deve priorizar reforma administrativa
O Globo
Disposição de Motta de investir em projeto do
deputado Pedro Paulo pode enfim transformar serviço público
É alvissareira a disposição do presidente da
Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB),
de investir na formulação e na aprovação de uma reforma
administrativa. Já não era sem tempo. Ajustar e aperfeiçoar a
máquina estatal é uma das mais urgentes prioridades nacionais. O Estado
brasileiro é ineficiente, caro e repleto de privilégios inaceitáveis. Custos
exorbitantes recaem sobre os contribuintes, e as consequências nefastas sobre
os usuários de serviços públicos.
Já houve tentativas de mudanças para transformar essa realidade, mas as corporações do funcionalismo sempre fizeram pressão sobre o Congresso para garantir regalias em detrimento da maioria. O fato de Motta ter escolhido a reforma administrativa como legado de sua presidência aumenta a chance de que, desta vez, o tema enfim avance. É esperada uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), seguida de detalhamentos em projetos de lei complementar e ordinária.
O ponto de maior repercussão na reforma
certamente será o corte de privilégios, abundantes nas categorias de elite do
funcionalismo, como Judiciário e Ministério Público. A intenção do relator,
deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), é concentrar-se nos casos mais absurdos, como as
férias de 60 dias dos juízes. É o tipo de regalia impossível de defender. Outro
capítulo fundamental diz respeito à definição de verbas indenizatórias, os
proverbiais “penduricalhos” usados para engordar salários para além do teto
constitucional. O texto deverá definir que sejam temporárias e tenham um limite
— que também deverá ser estendido às empresas estatais. “O orçamento total dos
órgãos que pagam verbas indenizatórias não poderá correr sem regras”, diz Pedro
Paulo.
A ambição do projeto vai além de acabar com
esse tipo de distorção, inaceitável na remuneração do funcionalismo. A ideia é
implantar metas de indicadores de gestão em todo o serviço público. Como diz o
próprio Pedro Paulo, a noção de meritocracia não deveria ser tão estranha ao
funcionalismo, afinal todo funcionário público deve, como princípio, ser
aprovado em concurso. Para reduzir resistências às mudanças, a reforma não
deverá alterar as regras de estabilidade de emprego. O foco do aumento da
produtividade estará nos incentivos, com avaliações periódicas e bonificação
por cumprimento de objetivos. A ideia é que todo órgão público, da escola ao
posto de saúde, esteja comprometido com metas e indicadores. Pelo projeto, o
governo terá prazo de 180 dias para entregar um plano estratégico, com todas
essas métricas estipuladas até o fim do mandato. No capítulo da digitalização,
para aumentar a transparência e o controle, atos rastreáveis serão
obrigatórios.
Até a aprovação da reforma tributária em
2023, mexer no cipoal dos impostos parecia tarefa acima da competência do
Parlamento. O resultado ficou aquém da perfeição, mas houve avanço inestimável.
Algo semelhante pode acontecer agora com a reforma administrativa. O
funcionalismo conta com profissionais capazes e competentes. Precisa se livrar
das aberrações e funcionar com regras e incentivos que permitam alcançar
resultados melhores, como qualquer organização humana. Uma reforma que acabe
com os privilégios e crie os incentivos certos poderá impulsionar a
produtividade do setor público, ter impacto fiscal positivo e, acima de tudo,
melhorar a vida de milhões de brasileiros.
Explosão de crimes digitais exige ação de
autoridades, empresas e usuários
O Globo
Em 12 meses, um em três brasileiros com mais
de 16 anos sofreu perda financeira para golpes, diz pesquisa
Um terço dos brasileiros com mais de 16 anos,
ou aproximadamente 56,4 milhões de pessoas, sofreu prejuízo financeiro nos
últimos 12 meses em fraudes no meio digital, constatou pesquisa Datafolha,
encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Há golpes de
todo tipo: no Pix, no pagamento de boletos falsos ou em cartões de crédito
capturados pelos estelionatários. A estimativa é que, no período de um ano, R$
111,9 bilhões tenham sido surrupiados em golpes digitais.
O vazamento de dados pessoais atingiu 53,1
milhões de brasileiros, causando prejuízo de R$ 54,5 bilhões. Golpes virtuais
vitimaram 61,3 milhões, quase o dobro dos 36,8 milhões de vítimas de roubo ou
assalto tradicionais, com ameaça física. O crime digital já lidera as
estatísticas da violência com
perdas financeiras.
Há no Brasil 258 milhões de smartphones, ou
1,2 aparelho por habitante, segundo a Fundação Getulio Vargas. O celular é a
porta de acesso para os criminosos agirem. Entre julho de 2024 e junho de 2025,
revelou a pesquisa, quem perdeu o telefone por roubo ou furto passou a ter 3,7
vezes mais chances de sofrer um golpe virtual. O crime organizado, cuja
principal fonte financeira é o tráfico de drogas, também entrou no mercado de
golpes, com centrais telefônicas simulando à perfeição o atendimento de bancos.
Com o advento da inteligência artificial (IA), a atividade criminosa se tornou
ainda mais sofisticada.
Para proteger os clientes, as plataformas
financeiras e de comércio eletrônico também têm lançado mão da IA, para
identificar padrões de acesso e tentar prever o comportamento criminoso. No
Reino Unido, bancos como o Barclays e empresas de tecnologia compartilham
automaticamente endereços suspeitos e padrões de transações anormais para se
antecipar aos golpistas. Antivírus, constantemente atualizados, emitem alertas
sobre endereços aparentemente inofensivos de sites que na verdade tentam
subtrair informações pessoais sensíveis. A polícia especializada e as
autoridades evidentemente têm papel fundamental a desempenhar.
Mas nada é capaz de proteger tanto quanto a educação para evitar cair nas armadilhas. Quanto mais bem informada for a população, menos exposta estará à crescente e ativa criminalidade digital. É verdade que o constante aperfeiçoamento das tecnologias torna impossível chegar ao risco zero. Mas, tendo conhecimento sobre as vantagens e os os perigos inerentes às ferramentas, o usuário evita clicar em links suspeitos e cair nos golpes mais frequentes. Por isso são tão importantes a inclusão da educação digital no currículo das escolas e o envolvimento das operadoras de celular e empresas de tecnologia, disseminando dispositivos e comportamentos mais seguros.
Uma reforma administrativa válida, mas
modesta
Folha de S. Paulo
Proposta traz mudanças corretas, mas não muda
estabilidade do servidor, que faz do Brasil anomalia
É correto eliminar férias de 60 dias,
disciplinar supersalários, regulamentar demissão por desempenho e reduzir
salários iniciais
Há avanços na modesta proposta de reforma
administrativa que se desenha na Câmara dos
Deputados. Os principais pontos foram
antecipados ao C-Level, videocast da Folha, pelo deputado Pedro
Paulo (PSD-RJ), coordenador do grupo de trabalho que prepara os textos legais
do projeto.
Na maior parte,
as mudanças —apresentadas tardiamente, num momento político pouco favorável em
meio de legislatura— estão na direção correta.
Eliminar as absurdas férias de 60 dias no
Judiciário, disciplinar supersalários, regulamentar a demissão por desempenho,
reduzir os salários de entrada das carreiras, aumentar os níveis de progressão
das carreiras e alcançar os servidores da ativa são medidas que precisam ser
implementadas na reestruturação da administração pública brasileira.
Deixa-se de lado, no entanto, o alcance
excessivo da estabilidade do funcionalismo no emprego, que faz do
Brasil uma anomalia global e desincentiva a produtividade. A
garantia deveria ser restrita a carreiras típicas de Estado que precisam estar
a salvo de pressões e retaliações políticas, como juízes, procuradores,
policiais e auditores.
Quanto aos supersalários, concentrados no
Judiciário e no Ministério Público, a proposta inclui restrições que os
congressistas devem à sociedade há quase dez anos, quando texto sobre o tema
começou a tramitar.
O projeto de lei dos Penduricalhos, aprovado
pela Câmara e agora em debate no Senado, na verdade aumenta o problema ao
ampliar o número de exceções que escapam do teto remuneratório do funcionalismo
público, baseado no salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Pedro Paulo inverte a lógica ao propor listar
na legislação os critérios para a definição das verbas indenizatórias, em vez
de repetir a estratégia de elencar quais penduricalhos extrassalariais podem
existir. Será preciso atenção aos detalhes para verificar se a mudança não
representa apenas uma flexibilização inócua.
A reforma também pretende disciplinar o
teletrabalho, limitando-o a um dia na semana, para acabar com os abusos
crescentes que acontecem nos três Poderes.
Um ponto positivo do texto elaborado na
Câmara é estender a reforma para estados e municípios, o que é sempre difícil
passar pelo Congresso.
Já a permissão para criação de uma 14ª folha
de pagamentos a fim de pagar um bônus ao servidor, diretamente vinculado ao
atingimento da meta do órgão para o qual trabalha, é uma dúvida. Há risco de o
bônus abrir uma nova porteira e acabar aumentando os gastos de governo federal,
estados e municípios.
Nebulosa também é a extensão do entendimento
que o coordenador do grupo de trabalho angariou entre as lideranças partidárias
para protocolar a reforma e avançar na votação, além da posição do governo Luiz
Inácio Lula da Silva (PT), por natureza solidário aos interesses
corporativistas dos servidores públicos.
Suspender a moratória da soja é risco duplo
Folha de S. Paulo
Decisão liminar do Cade ameaça certificação
de sustentabilidade vigente desde 2006, com efeitos no meio ambiente e na
economia
Empresas brasileiras terão de provar para
seus parceiros internacionais que o grão produzido não tem relação com o
desmatamento na amazônia
Por despacho, o Conselho Administrativo de
Defesa Econômica, o Cade, suspendeu os
efeitos da maior certificação ambiental do país: a moratória da soja, em vigor desde 2006. A norma —de iniciativa
de grandes exportadoras, associações do setor e ambientalistas— proíbe a compra
de soja de áreas do bioma amazônico desmatadas após 2008.
Não há justificativa de urgência para que se
desmantele uma política privada enquanto o órgão concorrencial discute, até o
final do inquérito administrativo, se a medida autorregulável funcionaria como
um cartel de compra.
Acende-se, ademais, o alerta no mercado
internacional sobre a origem da soja brasileira e sua relação com a
desflorestação.
Estudos já apontam que o desmate em florestas
tropicais está associado, em grande parte, à agropecuária. Direta ou
indiretamente, de 90% a 99% do desmatamento em terras tropicais de 2011 a 2015
estiveram associados ao setor, segundo pesquisa publicada na revista Science em
2022.
No Brasil, especificamente, outro estudo de
2020 da mesma publicação revela que uma minoria de fazendas que violam as
regras ambientais pode estar contaminando cerca de 20% da soja exportada para a
União Europeia.
Além da proibição da compra do grão de áreas
desmatadas, o acordo previa um sofisticado sistema de mapeamento nessas terras.
O chamado Grupo de Trabalho da Soja
contratava empresas para monitorar por satélite a produção em áreas devastadas.
As empresas signatárias, por sua vez, a auditavam de forma independente, e
tradings informavam suas compras, cruzando-se os dados.
Ao suspender a norma e com ela a coleta e o
compartilhamento de informações sobre a origem da soja, o Cade impõe um risco
de reputação para as empresas brasileiras que, de todo modo, precisarão ainda
provar para seus parceiros internacionais que o grão produzido não tem relação
com o desmatamento na amazônia.
Em resposta à decisão, o Ministério do Meio Ambiente afirmou
que, desde 2006, a expansão da produção no bioma cresceu 427%, com a quase
totalidade dos novos desmatamentos sem conexão com a sojicultura.
Desmantelar a política do setor privado que
permite mais competitividade com maior respeito ao meio ambiente é um tiro no
pé do país que busca se colocar como líder mundial no tema.
No ano em que o Brasil se comprometeu com desmate zero até 2030 e sedia o maior encontro de clima do mundo, a COP30, a suspensão prejudica tanto o avanço econômico como a preservação.
Contra o populismo, a educação
O Estado de S. Paulo
Se o populismo prospera onde a ignorância
impera, superá-lo requer o inverso. Educação e informação são o melhor remédio
contra a doença do trumpismo, do bolsonarismo e do lulopetismo
O populismo prospera onde a ignorância
impera, informa uma máxima que traduz a natureza dos líderes populistas,
aqueles que agem a partir do princípio de que o povo liderado é ignorante e
acrítico, incapaz, portanto, de discernir o falso do verdadeiro em matéria de
política. Não é por outra razão que um dos seus truques é repetir mentiras
incansavelmente até que sejam aceitas como verdades. É o que fazem populistas
de caráter reacionário, radical e autocrático, como Jair Bolsonaro e Donald
Trump, ou aqueles que se apresentam, como Lula da Silva, como mágico de
quermesse, o tipo de demagogo incorrigível que acredita que ele e seu partido
detêm o monopólio da sensibilidade social e que conseguem transformar o Brasil
pela simples expressão de seu desejo – não sem a providencial ajuda do
estatismo, do clientelismo e do palanque como forma de governar. São líderes
que imaginam reconstruir o país que presidem: Trump e Bolsonaro como orgulhosos
agentes do caos e da destruição da ordem vigente; Lula, como seu infalível
reinventor.
Mas, se o populismo prospera onde a
ignorância impera, sua superação requer o inverso: conhecimento, informação,
educação. Sociedades bem informadas ainda constituem a melhor prescrição contra
a disseminação desse tipo de patologia política. Classificar populistas como
malucos, idiotas, delirantes, mentirosos ou fascistas pode ser politicamente
útil para atiçar ânimos, mas nada esclarece sobre a natureza desse populismo e
de seus efeitos danosos. É preciso que a sociedade tenha informação suficiente
para identificar o autoritarismo e defender-se das armadilhas do populismo.
Em outras palavras, é preciso reformar os
sistemas cuja disfunção gera e alimenta o populismo. Do ponto de vista de
princípios de gestão, a fórmula inclui responsabilidade social combinada com
responsabilidade fiscal, modernização administrativa, republicanismo e
pluralismo, combate a privilégios e visão de futuro conectada a oportunidades
globais. E do lado da sociedade, o que fazer?
David Brooks, colunista do jornal The New York Times, fez
recentemente essa pergunta num artigo intitulado America’s New Segregation, ou A nova segregação dos EUA. No
momento em que muitos consideram que a democracia americana está sob ameaça,
Brooks se questiona: “O que um cidadão pode fazer para ajudar a colocar os EUA
num caminho mais saudável?”. Para ele, um problema em especial aflige seu país:
a segregação. Não só a segregação racial, mas também segregação de classe e, em
particular, a segregação educacional. É ela que alimenta o apetite populista e
aprofunda os conflitos que reforçam o trumpismo.
Segundo Brooks, para resistir será preciso
tratar a doença, e não o sintoma. O sintoma é o populismo; a doença é a forma
como, segundo ele, “nossas sociedades se segregaram em sistema de castas, nos
quais toda a oportunidade, respeito e poder estão concentrados na casta
educada”. Em outras palavras, sem ampliar as oportunidades para os menos
privilegiados, dificilmente conseguiremos escapar da maré populista atual.
Se tal premissa é verdadeira para os EUA –
onde uma reforma educacional fracassou e o atual presidente não só sabota a
educação pública, como trabalha para desmontar a burocracia federal nessa área
–, parece igualmente real para o Brasil, que há décadas patina no campo
educacional, com efeitos nefastos na desigualdade, no padrão de
desenvolvimento, nos ganhos de produtividade e nos níveis de educação política
de sua população.
Mas aqui, como lá, não se pode culpar o
eleitorado, sobretudo quando os partidos e os líderes oferecem tão somente tons
distintos de populismo, preconceito e, por que não dizer, sandice. Se não
formos capazes de romper o ciclo perverso que condena parcela significativa do
País à falta de oportunidades, e se não conseguirmos apresentar alternativas
factíveis à oferta populista, seguiremos capturados na armadilha em que
estamos, premidos entre um ex-sindicalista demagogo e um golpista
desqualificado.
É o mínimo que se espera
O Estado de S. Paulo
Proposta de reforma administrativa acaba com
alguns privilégios da elite do funcionalismo e estabelece sistema de avaliação,
medidas básicas que já deveriam ter sido tomadas há tempos
Depois de anunciar que não pretendia
apresentar uma proposta de reforma administrativa apocalíptica para evitar que
ela fracassasse no Congresso, o coordenador do grupo de trabalho sobre o tema
na Câmara, Pedro Paulo (PSD-RJ), felizmente parece ter mudado de ideia. De
acordo com o parlamentar, o parecer vai atacar alguns dos principais privilégios
do Judiciário e do Ministério Público, entre eles o fim das férias de 60 dias e
a venda de parte do período. A ideia, segundo ele, é que as férias de juízes,
procuradores e promotores passem a ser de 30 dias anuais de descanso, como já é
a regra para os profissionais dos setores público e privado.
O fato de uma notícia como essa ganhar
destaque mostra quão fora da realidade estão as carreiras do topo do
funcionalismo público. Há outros avanços dignos de nota da proposta que o
deputado pretende apresentar. Ele pretende limitar o regime de teletrabalho de
servidores a um dia por semana, submeter salários de diretores de estatais não
dependentes e não listadas em Bolsa, como o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES), ao teto remuneratório de R$ 46.366,19 e reduzir o
salário inicial das carreiras para, no máximo, metade da remuneração paga ao
final delas. Bônus, por sua vez, serão atrelados ao atingimento de metas e não
poderão ser pagos a chefes dos Três Poderes.
Penduricalhos, a partir da aprovação da
reforma, terão de ser aprovados em lei, e não mais por órgãos vinculados às
próprias carreiras, como os Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério
Público. Além disso, será preciso comprovar o caráter indenizatório desses
pagamentos, ou seja, temporário e não repetitivo, para que eles não sejam
enquadrados como verba remuneratória, sobre a qual incide Imposto de Renda.
A divulgação dos textos – uma Proposta de
Emenda à Constituição (PEC), um projeto de lei complementar e um projeto de lei
ordinária – estava prevista para o início deste mês, mas foi postergada por
sugestão do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). As ministras de
Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e da Gestão e da Inovação, Esther
Dweck, já estão cientes do teor deles, mas a ideia é que haja tempo de
debatê-los com mais deputados para angariar apoio antes que eles sejam
formalmente protocolados e comecem a tramitar.
Há sempre o risco de que a proposta seja
desidratada por pressão dos servidores e pela resistência do governo em dar seu
aval ao tema, e o adiamento da apresentação reforça essa impressão. Seria uma
pena desperdiçar esta oportunidade, pois as linhas gerais da proposta do
deputado parecem muito melhores do que os textos mais recentes sobre o tema que
tramitaram no Legislativo.
Apresentada pela equipe econômica do governo
de Jair Bolsonaro, a PEC 32/2020 começou mal, precarizando as carreiras do
serviço público, e terminou pior, ampliando o número de carreiras com direito à
estabilidade. Já o projeto dos supersalários, que previa limitar os
penduricalhos, tornou-se inócuo ao aceitar nada menos que 32 exceções que
poderiam ser pagas fora do teto remuneratório, como auxílio-moradia, férias não
gozadas e licença-prêmio não usufruída, entre outras.
Bem se sabe que o funcionalismo público,
assim como a sociedade brasileira, é permeado de gritantes desigualdades. A
maioria dos servidores não tem direito a férias de 60 dias nem recebe salários
que passam perto do teto remuneratório ao longo de toda a sua carreira.
Professores, policiais e enfermeiros são a face mais visível do Estado e
garantem a execução de serviços públicos essenciais.
Tornar as condições de trabalho mais justas
para todos, unificar e reduzir funções e submeter os servidores a processos de
avaliação de desempenho para progressão de carreira são o mínimo que se espera
de uma reforma administrativa. Mas obter apoio para essas mudanças requer
enfrentar os privilégios de uma parte do serviço público que se comporta como
se fosse uma casta superior da sociedade brasileira. Pedro Paulo, felizmente,
parece ter compreendido que é preciso colocar o dedo nessa ferida.
A Tarcísio o que é de Tarcísio
O Estado de S. Paulo
Lula reivindica Túnel Santos-Guarujá, mas, se
enfim sair, a obra deve ser atribuída ao governador de SP
O leilão para a construção do Túnel
Santos-Guarujá nem mesmo foi realizado e as obras tampouco têm ainda data para
começar, mas a disputa pela paternidade do projeto atiça os spin doctors do lulopetismo,
sempre empenhados em atribuir a Lula da Silva a criação do universo.
Após décadas de planos frustrados de uma
ligação entre duas das principais cidades da Baixada Santista, ora por um
túnel, ora por uma ponte, decidiu-se pela construção de uma via submersa, que,
se sair do papel, não será por esforço do presidente Lula da Silva, como tentam
fazer crer o Palácio do Planalto e a sua propaganda na TV aberta com a
disseminação da narrativa de que se trata de uma obra do “governo do Brasil”.
O governo petista pouco mérito terá no
eventual êxito desse projeto. Recorde-se que foi na condição de ministro da
Infraestrutura de Jair Bolsonaro que o atual governador de São Paulo, Tarcísio
de Freitas, traçou um plano de desestatização do Porto de Santos com a
construção do túnel como contrapartida. A concessionária que ganhasse a
operação do terminal portuário teria a missão de entregar uma ligação submersa
capaz de beneficiar milhares de pessoas que enfrentam a fila da balsa ou têm de
contornar 40 quilômetros para transitar de uma cidade a outra. Com a volta do
estatista Lula da Silva à Presidência, a proposta naturalmente foi sepultada.
Tarcísio assumiu o Palácio dos Bandeirantes e
passou a liderar o projeto do túnel, agora como governador, qualificando o
empreendimento no Programa de Parcerias de Investimentos do Estado de São Paulo
(PPI-SP). Com isso, a obra, enfim, deverá ir a leilão neste terceiro trimestre
e será executada por meio de uma parceria público-privada (PPP), com investimentos
de R$ 6,8 bilhões. Por óbvio, o governo federal foi procurado para viabilizar o
projeto, porque a área é da União. Ficou acertado que os dois governos
dividirão R$ 5,4 bilhões dos custos, enquanto o restante será bancado pelo
setor privado, que terá a concessão por 30 anos.
Como se vê, houve perseverança do governador,
e todo esse empenho de Tarcísio levou o lulopetismo ao ataque. O golpe abaixo
da cintura veio com um vídeo institucional sobre o túnel, produzido pela
Secretaria de Comunicação Social (Secom), do ministro-marqueteiro Sidônio
Palmeira, que simplesmente ignorou Tarcísio.
Claro que tudo isso não surpreende vindo do PT, tampouco o fato de que aliados de Lula da Silva tenham dito que o presidente poderia realizar a obra sozinho. Se poderia, é o caso de perguntar por que os petistas que presidiram o País por 16 anos até agora não o fizeram. E, a bem da verdade, os diversos governos tucanos em São Paulo também não foram capazes de construí-lo. Hoje, para os paulistas, o que importa é que um problema logístico da Baixada poderá ser, enfim, resolvido. Bom seria se os entes federados sempre trabalhassem em prol do interesse público, e não eleitoral. E, apesar do dinheiro federal, justiça seja feita: caso o túnel se torne uma realidade, terá sido por insistência de Tarcísio, gostem os petistas ou não.
A farsa da anistia aos réus golpistas
Correio Braziliense
O mais revelador do relatório apresentado
pela PF diz respeito a um aspecto que, a essa altura dos acontecimentos, tem
ficado em segundo plano: a anistia aos réus da trama golpista
As investigações da Polícia Federal acerca da
atuação de Jair Bolsonaro e de seu filho Eduardo para coagir o Supremo Tribunal
Federal e provocar um impasse diplomático entre o Brasil e os Estados Unidos
trouxeram à luz uma série de elementos, alguns constrangedores. Um deles são os
indícios de que o ex-presidente desrespeitou as medidas cautelares impostas
pelo ministro Alexandre de Moraes e manteve intensa comunicação por meios
eletrônicos. Outra descoberta, até curiosa, foi a maneira chula e desrespeitosa
como Eduardo Bolsonaro, aos palavrões, se dirige ao pai. Logo eles, que tanto
dizem prezar a família e os bons costumes.
O mais revelador do relatório apresentado
pela PF diz respeito a um aspecto que, a essa altura dos acontecimentos, tem
ficado em segundo plano: a anistia aos réus da trama golpista que culminou no 8
de Janeiro. A articulação dos Bolsonaro para induzir o governo norte-americano
a aplicar sanções contra a economia e as autoridades brasileiras atende a um
propósito específico: livrar o ex-presidente — e apenas ele — das contas da
Justiça. Em certo trecho, o filho 03 vai ao ponto: "Se a anistia light
passar, a última ajuda vinda dos EUA terá sido o post de Trump. Eles não irão
mais ajudar".
Nota-se, portanto, que o plano bolsonarista
de denunciar supostos abusos cometidos pelo STF exclui os "patriotas"
que passaram meses acampados em frente a quartéis e vilipendiaram os Poderes da
República. Ficou claro, mais uma vez, que os "cidadãos de bem" e as
"velhinhas com a Bíblia na mão" foram e continuam a ser massa de
manobra de um grupo político que não aceita o resultado das eleições e tenta a
todo custo se manter no poder.
O inquérito da Polícia Federal desmonta a
narrativa de que Jair Bolsonaro é o maior injustiçado da ditadura do Judiciário
e representa cidadãos que são perseguidos em razão de suas convicções
políticas. Nada mais falso. Bolsonaro e seus acólitos buscam tão somente se
reabilitar politicamente, de preferência com a chancela do eleitor. Para tanto,
vão às últimas consequências: desrespeitam ordens judiciais, disseminam
mentiras pelas redes sociais, tomam de assalto o comando do Congresso, buscam
desmoralizar o Supremo Tribunal Federal, tentam convencer a opinião pública de
que está em curso um movimento de caça às bruxas e de perseguição política no
país.
Como forma de dissimular seus reais
objetivos, os defensores da falsa anistia recorrem a uma cantilena que fala em
ataque à liberdade de expressão, ditadura da toga, risco de Brasil se tornar
Venezuela, ameaça do comunismo e outros absurdos. Trata-se de um castelo de
cartas, que não se sustenta ante a realidade dos fatos. Infelizmente, essas
aleivosias encontram ressonância fora do país, com prejuízos a todos -
bolsonaristas ou não.
Com a revelação do nefasto plano familiar dos Bolsonaro, que nada tem a ver com um eventual perdão a participantes de ato antidemocráticos, cumpre ao Legislativo impedir qualquer iniciativa em favor de anistia a golpistas. É falso como uma nota de três reais alegar que o perdão a quem cometeu delitos trará pacificação. O Brasil precisa preservar sua ordem constitucional e punir, nos termos da lei, aqueles que se aproveitam da democracia para imprimir um vale-tudo na política.
A Zona de Interesse Ambiental da Sabiaguaba
O Povo (CE)
Uma das discussões mais importantes para a
sociedade fortalezense hoje é a atualização do Plano Diretor, que já está
atrasada há seis anos. A lei municipal orienta e organiza o desenvolvimento da
Cidade por meio de diretrizes discutidas, de preferência, em reuniões públicas
e transparentes.
Apesar do atraso, o debate sobre o
dispositivo legal ganhou fôlego com a instituição da Comissão Especial do Plano
Diretor, no início do ano. A partir disso, os temas centrais que definirão qual
Fortaleza habitaremos nos próximos anos ganharam corpo. E, como costuma ocorrer
no Brasil, parte das discussões parece opor desenvolvimento econômico e
proteção ambiental.
Nesta semana, a Comissão aprovou projeto que
busca alterar a Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo da Zona de
Interesse Ambiental (ZIA) da Sabiaguaba. O objetivo da proposta é, em suma,
flexibilizar as permissões de construção nas quadras lindeiras à avenida Manoel
Mavignier, que liga Fortaleza a Aquiraz.
Atualmente, o Índice de Aproveitamento (IA)
básico e máximo da ZIA é de 1,0, enquanto a proposta pretende permitir até 1,5
— na prática, maior margem para construções e, potencialmente, para
desmatamento, segundo os críticos à lei. O vereador Marcel Colares (PDT), autor
do projeto, argumenta que o IA vigente na Sabiaguaba é mais restritivo do que o
de áreas como a Praia do Futuro (2,0) e o do Cocó (1,5). Ressalta, ainda, que a
proposta não reduz a área total da ZIA, o que seria um ponto central para a
preservação ambiental.
O projeto, porém, não deve ser aprovado a
toque de caixa, sob risco de repetir o modelo de transformação urbana
desordenada que precedeu a criação da legislação específica. É preciso
considerar a importância do desenvolvimento sustentável, diante da finitude dos
recursos naturais e da necessidade de preservar biomas sensíveis da região da
Sabiaguaba, que abriga dunas móveis e fixas, além de delicadas e biodiversas
áreas de mangue.
A proposta ainda não foi a votação em
plenário, em virtude de uma emenda apresentada pelo vereador Gabriel Biologia
(Psol), que busca um texto conciliador. O parlamentar e ativista ambiental
propõe que o aumento do Índice de Aproveitamento seja restrito a regiões com
empreendimentos já consolidados, resguardando as demais áreas dentro da ZIA.
Com a emenda, o projeto deve retornar à
Comissão do Plano Diretor. Essa é uma oportunidade de ouvir a sociedade civil,
os defensores do meio ambiente e o setor produtivo. A ideia é conciliar
interesses econômicos com o imperativo do desenvolvimento sustentável.
Ressalte-se, ainda, que a discussão não deve
se limitar à Zona de Interesse Ambiental da Sabiaguaba, mas abranger também
outros projetos que podem alterar dispositivos de proteção de áreas verdes em
Fortaleza. A articulação entre representantes eleitos e sociedade civil está no
DNA da Cidade e precisa estar no centro dos debates sobre o urgente novo Plano
Diretor da Capital.
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