quinta-feira, 6 de agosto de 2009

PMDB perde espaço à direita e à esquerda

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Nas eleições de 2006, o PMDB reverteu uma tendência lenta e constante de queda de sua representação na Câmara dos Deputados, conseguiu manter-se como a terceira força no Senado, fez o maior número de deputados estaduais e conquistou o maior número de governadores do pleito - sete entre o primeiro e o segundo turno das eleições. Junto com o PT, foi o que apresentou organização em todo o território nacional. É, sem dúvida, o maior partido do país e um aliado conveniente para 2010, disputado pelos candidatos à Presidência da República. Os números das eleições passadas, todavia, não revelam apenas isso. Podem indicar também que a legenda, que consegue se manter forte no quadro partidário desde o fim da ditadura militar, movimenta-se num espaço político regional cada vez mais restrito. Uma grande representação parlamentar ainda dá ao PMDB enorme poder de chantagem sobre governos que se sucedem, mas o partido apenas a mantém porque exerce com rigor a filosofia de dar os anéis para não perder os dedos. Ainda assim, não consegue evitar que a redução de seu espaço regional resulte, em algum momento, em menor representação proporcional na Câmara dos Deputados.

É natural que o PMDB, que agregou a oposição institucional ao regime militar, tenha capitalizado enorme apoio popular. Tomando as eleições para a Câmara, em 1982, primeiro pleito depois do fim do bipartidarismo da ditadura, obteve 39,3% das cadeiras; em 1986, logo após a posse de José Sarney na Presidência e na vigência do popular Plano Cruzado, chegou a ter 44,7% dos deputados. A partir de 1990, no entanto, já sob o choque da impopularidade do governo Sarney - que o partido renegou - e o racha do PSDB, que nasceu de sua costela, sua representação caiu para 21,7% da Câmara. Em 1998, caiu para 16,2%, e nas eleições de 2002, para 14,4%.
Recuperou o fôlego em 2006, quando elegeu 17,3% da Câmara. Mesmo garantindo no Senado uma terceira bancada e o poder de atrapalhar a vida de qualquer governo lá dentro, o partido acusou, ao longo de sete eleições, uma tendência de queda que se mantém - em 1982 elegeu 36% dos senadores; em 1986, na esteira da redemocratização, chegou à absurda porcentagem de 77,6% dos senadores eleitos; em 1990, esse índice caiu para 25,8%; em 1998, para 22%; em 2002, para 17%; e em 2006, para 15%. O número de governadores mantém-se praticamente constante desde 1998: 6 naquelas eleições, 5 em 2002 e 7 em 2006.

Era previsível que o PMDB não conseguisse manter-se amplamente majoritário no Congresso e nos Estados. Em 1982 ele era, mas o país recém saía de um bipartidarismo de 15 anos, onde o PMDB figurava como o único partido de oposição institucional ao regime militar. O fim de sua hegemonia, no entanto, obedeceu algumas lógicas.

A distribuição regional dos votos do PMDB indica que a tendência do partido é ilhar-se em lideranças locais e perder eleitores para agremiações à sua direita ou à sua esquerda: não consegue sobreviver como força hegemônica quando a política estadual é submetida a disputas ideológicas, ou quando não figura como o mediador mais importante entre o governo federal e a população estadual. Craque em sobrevivência, repete a história em todas as regiões: ao perder espaço como força hegemônica, alia-se a um partido mais forte e abre mão de governos estaduais, mas mantém posições eleitorais que lhe permitam obter representações parlamentares expressivas, capazes de forçar negociações com o poder estadual e nacional aos quais não consegue chegar pelo voto. Assim consegue sobreviver em redutos, que por sua vez o abastecem de representação parlamentar. A dinâmica é essa, embora os números indiquem que é inevitável a perda de representação onde é radicalmente substituído nas preferência dos eleitores.

Na Região Sudeste, o processo de esvaziamento estadual iniciou-se com o "racha" do PSDB, em 1986, e ao longo do tempo atingiu também sua representação parlamentar. Em São Paulo, a partir da primeira eleição de Mário Covas, o PMDB vem perdendo espaço para o PSDB. Mantém ainda uma forte representação no Congresso e na Assembleia (embora proporcionalmente menor à que já teve) porque uma divisão interna garante a ele ganhar votos como oposição e governo. Em Minas, as lideranças do PMDB foram absorvidas pelo PSDB de Aécio Neves ou atraídas para o governo Lula. No Espírito Santo, o governador Paulo Hartung é um peemedebista acidental, com passagem pelo PSDB e pelo PSB e liderança própria. O partido tem na região, hoje, a menor representação parlamentar federal em relação às outras legendas: era a terceira bancada federal em 2006, atrás do PT e do PSDB (segundo levantamento de Maria do Socorro Sousa Braga, da USP, no artigo "O processo político-partidário brasileiro e as eleições de 2006").

Nas eleições de 2006, o PMDB viveu um processo de esvaziamento no Nordeste que atingiu também sua representação na Câmara em relação à dos demais partidos. O PMDB - como o ex-PFL - perdeu eleitores para o PT e para candidatos mais identificados com o governo Lula, que obteve 77,1% dos votos na região no segundo turno das eleições presidenciais. O PMDB teve candidato próprio em quatro dos nove Estados, foi para o segundo turno e perdeu em todos eles. O PFL também não elegeu governador nessa região, mas manteve a sua posição de maior bancada federal. O PT assumiu o segundo lugar e o PMDB, o terceiro.

A Região Norte foi a única em que o crescimento do PT, em 2006, não resultou no esvaziamento automático do PMDB. Lá, o partido elegeu 3 dos 9 governadores e o PT, dois. O PMDB manteve na região a posição de primeira bancada federal (23,1% dos eleitos) e o PT conquistou a segunda posição, com 15,4% dos eleitos.

Contraria a lógica das demais a Região Sul porque nela o PMDB mantém um patrimônio ideológico que perdeu nas demais. No Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e no Paraná o PMDB tem polarizado disputas com o PT ou com o PSDB. Conseguiu a primeira bancada federal na região em 2006 (23,4%) No Centro-Oeste o PMDB mantém a primeira representação proporcional (24,4%), embora tenha eleito apenas um governador, em Estados onde prevalece a política tradicional.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

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