Para que não cresça a impunidade, não se deve entender que policial sempre atuará em legítima defesa
Seja qual for o resultado da eleição, constará das análises finais que um ímã de atração de votos do candidato Jair Bolsonaro (PSL) tem sido ele saber conectar-se à modulação da onda conservadora que atinge o país e atender, com seu discurso, que não é de hoje, aos compreensíveis anseios da população por mais segurança.
O candidato parece corresponder ao que eleitores esperam dele neste campo, mas isso não significa que propostas duras que têm feito são as melhores.
Mesmo que seja indiscutível a necessidade de haver mudanças de legislação para preencher vazios legais que geram perigosa sensação de impunidade entre criminosos. E, como se sabe, a ausência de medo da lei e da repressão do poder público é forte incentivo ao crime continuado, na sociedade como um todo.
Um exemplo de proposta que escapa aos limites da sensatez é a do “excludente de ilicitude”, figura jurídica que Bolsonaro defende que seja aplicada a atos de violência praticados por policiais. Em caso de morte, em vez de o policial responder a processos que averiguarão se ele cometeu homicídio sem justificativa plausível, estará sempre pré-estabelecido que agiu em legítima defesa. Não haverá qualquer investigação. Existe projeto com este objetivo, de autoria do próprio Bolsonaro, em tramitação na Câmara.
Não se desconhecem os riscos que policiais correm ao enfrentar bandidos em terreno perigoso, e muitas vezes usando armas melhores e mais poderosas que as suas. É certo que não se pode considerar normal esta situação. Deve-se enfrentá-la.
A questão é saber como, de forma que se evite que uma lei mal formulada se transforme numa espécie de “licença para matar”. Qualquer passo nesta direção vai no caminho dos antigos “esquadrões da morte”, que jamais resolveram o problema da criminalidade. E permitiram que bandos de criminosos com distintivos e fardas passassem a agir disfarçados de policiais.
Na prática, aumenta a insegurança do cidadão que se pretende proteger. É ainda mais perigosa a proposta porque, tem dito o candidato, o “excludente de ilicitude” também valeria para qualquer pessoa “de bem”. Institui-se de vez, assim, o faroeste, num país em que já são assassinadas mais de 62 mil pessoas por ano, um índice de 30,3 por 100 mil habitantes, dos mais elevados do mundo. Aumentará a carnificina, ainda mais se o “excludente” for somado à ideia, também de Bolsonaro, de liberalizar a posse e o porte de armas, de maneira indiscriminada.
Os policiais merecem maior proteção. Mas não por meio de mecanismos legais que, na prática, aumentam a insegurança geral e a violência. E, por suposto, criar esta prerrogativa para policiais, ou quem seja, significa ampliar a impunidade no país, indo em sentido contrário ao que deseja a população. Inclusive eleitores de Bolsonaro.
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