Opinião & Noticia
O pessoal graúdo da social-democracia continua a bater em porta errada quando cata divergências ociosas entre petismo e lulismo, que são as duas faces da mesma moeda corrente na sucessão presidencial, embora disponha de material mais valioso para explorar. Os dois mandatos não são o que pensam governo e petistas. Uma andorinha não fará verão enquanto apenas um candidato simular a sucessão sem a democracia estrilar. O pretendente da oposição continua no meio de nuvens sem maior significado (as nuvens, claro). A candidata da dupla PT/Lula ainda está longe de contar com a parceria de um vice à altura das necessidades, porque por aí é que a dificuldade espreita. Lula defende o direito de escolha por parte do PT, melhor, por ele mesmo, entre três nomes para disfarçar o truque. Escolheu a candidata e se sente com direito ao vice. Serviço completo. Condenado á suplência eterna, o PMDB entende que a exigência é uma capitis diminutio, porque em português seria uma afronta. Em latim se torna mais palatável ao presidente do partido maior que vai entrar de sócio menor na empreitada. Em suma, melhor estar preparado do que entrar de gaiato.
A questão do vice vai trazer de volta as divergências de relacionamento entre o PMDB e o PT, situados em planos diferentes mas tendo como denominador comum o pragmatismo, o ancestral que apenas troca de roupa quando se torna árbitro de confusões de princípios. A moeda em circulação à esquerda alcançou, no trigésimo aniversário do PT, a mais alta cotação desde a crise do mensalão, que continua tratado pelo petismo como se não tivesse existido. Melhor, como se não passasse de invencionice dos social-democratas incompatíveis com o jeito petista de ser estabanado. Por enquanto, a rigor nem a candidatura em manobra está garantida, dado o número de incógnitas no problema em que poderá se tornar a própria sucessão. A começar pelo eterno problema do vice, que deverá acompanhá-la como uma sombra suspeita por aí afora. E a acabar de jeito que ninguém tem condições de prever, sem aquele cego de tragédia grega que, vendo apenas o futuro, saca contra o que vai acontecer. De onde menos se espera, portanto, é que pode advir surpresa. Olho no vice que vem por aí, em missão sigilosa. Existem nós que precisam ser cortados, e não desatados. Este que enlaça PMDB e PT na escolha do melhor vice é um deles. Lula já opinou e o PMDB apenas bufou.
A moeda Lula/PT continua a ter o mesmo valor de face com que já circulava, e vai valer o que o eleitor quiser pagar na campanha eleitoral. Ou seja, o equivalente à diferença entre o que dizem e o que fazem os governos. Já no caso da oposição a diferença não se apresenta como emissão sem lastro e sim como lastro sem emissão. A moeda com apenas uma face passa adiante a idéia de que a social-democracia não estará fora de alcance de moedeiros falsos. Os social-democratas vivem de história, de preferência no plural, desde que ficaram na orfandade. Nos oito meses de que dispõe para se despedir, deixando e levando saudade, o presidente Lula vai em direção ao ponto culminante de uma ascensão que, em matéria de opinião pública, alcançou o zênite no céu da república que nos coube. Ressalve-se que já não se localiza no ponto de onde a visão do futuro se embaça com versões contadas de maneiras diferentes, mas atenuadas pela mão do tempo. Pelo menos, até que a História dê a última palavra. Por enquanto, está bem no papel de grande muda.
Como nunca antes no currículo deste país, o presidente sustenta a conveniência de uma eleição que não exceda os limites do confronto entre o petismo e a social-democracia, com os saldos e insucessos dos respectivos governos, para passar a limpo o que faria melhor em ficar como está, por ser questão controvertida a ser resolvida quando todos não estiverem mais por aqui. A História não é um texto pronto e acabado, redigido à maneira oficial de apresentá-lo. E muito menos cabe numa versão em que se reúna objetivamente o que o governo pensa que fez e a oposição diz que não fez.
A porta pela qual a oposição tenta entrar em cena é a dos fundos, por onde os petistas estão voltando para casa, tanto quanto possível sem chamar a atenção e sem assumir arrependimento (por terem prestado à legenda e ao governo desserviços de que não podem se orgulhar). Afinal, caixa dois não tem filtro de sujeiras. E, por mais discretas e disfarçadas que sejam as operações, qualquer que seja o número de vezes, o uso da caixa não se torna legal por servir à política, nem pode ser considerada atenuante para ninguém.Dinheiro de fonte oculta não se legitima pelo anonimato.
Os dizeres da carta aos brasileiros, com a assinatura da mão direita de Lula, já indicavam uma procedência de esquerda cada vez mais distante do PT. Com três invejáveis insucessos eleitorais na biografia, Lula ainda era a pedra preciosa, de lapidação sindical inédita no Brasil brasileiro e na coroa com que a república iria, enfim, ter o toque de esquerda com a benção da direita. Uma variante da social-democracia que ainda não pegou para valer no solo brasileiro (e que rejeita o dogmatismo, que vem a ser o avô de todos os desvios políticos possíveis).
Da oposição não se pode dizer nem mesmo que errou, por não abdicar da ilusão de que a história se faz sozinha (tanto à esquerda quanto à direita). O PT se organizou à maneira tradicional, para esperar que a carta subscrita com a mão direita do candidato não excedesse a duração da campanha. Só faltou pedir discrição, mas nem precisou. O silêncio baixou sobre a carta e Lula, com alguns episódios, resolveu a questão. Deve ter recomendado que, quando inevitável, fosse lida com entonação de esquerda no decurso dos primeiros meses do governo, antes de se recolher aos arquivos. A carta vazia de conteúdo condizente com o petismo foi arquivada para evitar discussões e fomentar divisionismo ao chegar ao poder. Foi aí que a burguesia errou no que viu e acertou no que intuiu. Era para valer e não para iludir. O governo Lula, antes da tentação do segundo mandato, deu conta do programa de medidas consideradas, sem exageros nem indiretas, genuinamente social-democratas. Pode ter sido a contradição mais destoante dos dois governos Lula e, no entanto, foi a consagração. Mais mandatos houvesse, e mais perto chegaria Lula do que se chama de neoliberalismo, do que da social-democracia.
Wilson Figueiredo é jornalista
O pessoal graúdo da social-democracia continua a bater em porta errada quando cata divergências ociosas entre petismo e lulismo, que são as duas faces da mesma moeda corrente na sucessão presidencial, embora disponha de material mais valioso para explorar. Os dois mandatos não são o que pensam governo e petistas. Uma andorinha não fará verão enquanto apenas um candidato simular a sucessão sem a democracia estrilar. O pretendente da oposição continua no meio de nuvens sem maior significado (as nuvens, claro). A candidata da dupla PT/Lula ainda está longe de contar com a parceria de um vice à altura das necessidades, porque por aí é que a dificuldade espreita. Lula defende o direito de escolha por parte do PT, melhor, por ele mesmo, entre três nomes para disfarçar o truque. Escolheu a candidata e se sente com direito ao vice. Serviço completo. Condenado á suplência eterna, o PMDB entende que a exigência é uma capitis diminutio, porque em português seria uma afronta. Em latim se torna mais palatável ao presidente do partido maior que vai entrar de sócio menor na empreitada. Em suma, melhor estar preparado do que entrar de gaiato.
A questão do vice vai trazer de volta as divergências de relacionamento entre o PMDB e o PT, situados em planos diferentes mas tendo como denominador comum o pragmatismo, o ancestral que apenas troca de roupa quando se torna árbitro de confusões de princípios. A moeda em circulação à esquerda alcançou, no trigésimo aniversário do PT, a mais alta cotação desde a crise do mensalão, que continua tratado pelo petismo como se não tivesse existido. Melhor, como se não passasse de invencionice dos social-democratas incompatíveis com o jeito petista de ser estabanado. Por enquanto, a rigor nem a candidatura em manobra está garantida, dado o número de incógnitas no problema em que poderá se tornar a própria sucessão. A começar pelo eterno problema do vice, que deverá acompanhá-la como uma sombra suspeita por aí afora. E a acabar de jeito que ninguém tem condições de prever, sem aquele cego de tragédia grega que, vendo apenas o futuro, saca contra o que vai acontecer. De onde menos se espera, portanto, é que pode advir surpresa. Olho no vice que vem por aí, em missão sigilosa. Existem nós que precisam ser cortados, e não desatados. Este que enlaça PMDB e PT na escolha do melhor vice é um deles. Lula já opinou e o PMDB apenas bufou.
A moeda Lula/PT continua a ter o mesmo valor de face com que já circulava, e vai valer o que o eleitor quiser pagar na campanha eleitoral. Ou seja, o equivalente à diferença entre o que dizem e o que fazem os governos. Já no caso da oposição a diferença não se apresenta como emissão sem lastro e sim como lastro sem emissão. A moeda com apenas uma face passa adiante a idéia de que a social-democracia não estará fora de alcance de moedeiros falsos. Os social-democratas vivem de história, de preferência no plural, desde que ficaram na orfandade. Nos oito meses de que dispõe para se despedir, deixando e levando saudade, o presidente Lula vai em direção ao ponto culminante de uma ascensão que, em matéria de opinião pública, alcançou o zênite no céu da república que nos coube. Ressalve-se que já não se localiza no ponto de onde a visão do futuro se embaça com versões contadas de maneiras diferentes, mas atenuadas pela mão do tempo. Pelo menos, até que a História dê a última palavra. Por enquanto, está bem no papel de grande muda.
Como nunca antes no currículo deste país, o presidente sustenta a conveniência de uma eleição que não exceda os limites do confronto entre o petismo e a social-democracia, com os saldos e insucessos dos respectivos governos, para passar a limpo o que faria melhor em ficar como está, por ser questão controvertida a ser resolvida quando todos não estiverem mais por aqui. A História não é um texto pronto e acabado, redigido à maneira oficial de apresentá-lo. E muito menos cabe numa versão em que se reúna objetivamente o que o governo pensa que fez e a oposição diz que não fez.
A porta pela qual a oposição tenta entrar em cena é a dos fundos, por onde os petistas estão voltando para casa, tanto quanto possível sem chamar a atenção e sem assumir arrependimento (por terem prestado à legenda e ao governo desserviços de que não podem se orgulhar). Afinal, caixa dois não tem filtro de sujeiras. E, por mais discretas e disfarçadas que sejam as operações, qualquer que seja o número de vezes, o uso da caixa não se torna legal por servir à política, nem pode ser considerada atenuante para ninguém.Dinheiro de fonte oculta não se legitima pelo anonimato.
Os dizeres da carta aos brasileiros, com a assinatura da mão direita de Lula, já indicavam uma procedência de esquerda cada vez mais distante do PT. Com três invejáveis insucessos eleitorais na biografia, Lula ainda era a pedra preciosa, de lapidação sindical inédita no Brasil brasileiro e na coroa com que a república iria, enfim, ter o toque de esquerda com a benção da direita. Uma variante da social-democracia que ainda não pegou para valer no solo brasileiro (e que rejeita o dogmatismo, que vem a ser o avô de todos os desvios políticos possíveis).
Da oposição não se pode dizer nem mesmo que errou, por não abdicar da ilusão de que a história se faz sozinha (tanto à esquerda quanto à direita). O PT se organizou à maneira tradicional, para esperar que a carta subscrita com a mão direita do candidato não excedesse a duração da campanha. Só faltou pedir discrição, mas nem precisou. O silêncio baixou sobre a carta e Lula, com alguns episódios, resolveu a questão. Deve ter recomendado que, quando inevitável, fosse lida com entonação de esquerda no decurso dos primeiros meses do governo, antes de se recolher aos arquivos. A carta vazia de conteúdo condizente com o petismo foi arquivada para evitar discussões e fomentar divisionismo ao chegar ao poder. Foi aí que a burguesia errou no que viu e acertou no que intuiu. Era para valer e não para iludir. O governo Lula, antes da tentação do segundo mandato, deu conta do programa de medidas consideradas, sem exageros nem indiretas, genuinamente social-democratas. Pode ter sido a contradição mais destoante dos dois governos Lula e, no entanto, foi a consagração. Mais mandatos houvesse, e mais perto chegaria Lula do que se chama de neoliberalismo, do que da social-democracia.
Wilson Figueiredo é jornalista
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