O Globo
Lula alerta que uma intervenção armada dos
EUA na Venezuela seria “uma catástrofe humanitária” e um “precedente perigoso
para o mundo”.
Quando as ameaças dos Estados Unidos cada vez mais se transformam em possibilidade real de uma intervenção armada na Venezuela, o presidente Lula alerta que ela seria “uma catástrofe humanitária” e um “precedente perigoso para o mundo”. Mesmo com o Brasil se afastando da ditadura de Nicolas Maduro depois da eleição fraudada que o manteve no poder, não nos é possível, como principal líder da América do Sul, aceitar uma invasão militar num país vizinho. A questão em jogo tem duas faces, a política e a militar.
Os diplomatas começam a se movimentar em
torno do tema. Diante de tal quadro, o embaixador Sergio Moreira Lima,
presidente do Conselho da Sociedade Brasileira de Direito Internacional, lembra
em texto enviado à coluna que “a América do Sul foi historicamente construída
com base no direito internacional, na igualdade dos Estados, na solução
pacífica de controvérsias e na rejeição à lógica das esferas de influência –
princípios que o Brasil ajudou a formular e a consolidar”.
A região, hoje palco de interesses
estratégicos dos Estados Unidos e da China, “não se estruturou a partir de
pactos militares, nem da dissuasão armada, mas do reconhecimento jurídico de
fronteiras, do respeito à soberania e da prevalência do diálogo”. O embaixador
vê um risco duplo para a América do Sul e para o Brasil. “Externamente, a
região pode ser empurrada para a dinâmica de rivalidade, que lhe é alheia
internamente, e erode uma cultura diplomática fundada na autonomia, na
moderação e na defesa da legalidade”.
Ele reforça que nossa tradição diplomática –
do barão do Rio Branco à Constituição de 1988 – sempre associou segurança à
previsibilidade jurídica, ao respeito aos tratados e à cooperação entre estados
soberanos. “Reafirmar essa identidade não é neutralidade passiva, mas afirmação
ativa de uma visão de ordem internacional baseada em regras e não na lei do
mais forte”.
Outros dois embaixadores, Jorio Dauster e
Rubem Barbosa, escrevem na próxima edição da Revista Insight Inteligência um
ensaio em que o título diz tudo: “Brasil país indefeso”. Sem vírgula depois de
Brasil, por uma questão estética de impacto. Para eles, o Brasil necessita com
urgência de um planejamento estratégico para deixar de ser um país inerme. Um
país com mais de 210 milhões de habitantes e de dimensões continentais não pode
se dar ao luxo de ignorar vulnerabilidades em áreas estratégicas, que poderão
afetar seus interesses concretos e prejudicar seu desenvolvimento.
“Essas vulnerabilidades ficam evidentes
quando se pensa na inexistência de meios adequados para assegurar a soberania
nacional na defesa das fronteiras, para proteger as plataformas de petróleo no
pré-sal do mar territorial, para derrotar eventuais ambições externas sobre os
grandes recursos biológicos, minerais e hídricos na Amazônia, para defender o
país de ataques cibernéticos e para preservar as comunicações privadas e
governamentais (inclusive militares) dependentes de satélites operados por
companhias estrangeiras”.
Eles ressaltam uma série de novas ameaças que
não podemos deixar também de enfrentar, como o tráfico de armas e de drogas, o
terrorismo e a guerra cibernética. E a esses velhos e novos desafios vem se
somar agora o impacto da Inteligência Artificial, capaz de substituir os
recursos humanos em numerosas funções militares, desde armas operacionais,
recursos para a coleta e análise de inteligência, sistemas de alerta antecipado
e mecanismos de comando e controle. E, como é praticamente impossível alterar
substancialmente o perfil dos gastos orçamentários das Forças Armadas
brasileiras nas próximas décadas, a prioridade um consiste em desenvolver novos
modos de financiar os investimentos no setor.
Eles sugerem que a indústria brasileira de
defesa, em especial nos setores de cunho estratégico, terá de formar joint
ventures com empresas nacionais e estrangeiras para ter acesso a novas
tecnologias e financiamento enquanto não houver avanço autóctone significativo
em inovação e financiamento.

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