 As duas principais reivindicações dos governadores reunidos com a presidente Dilma Rousseff têm características distintas. A recriação da CPMF, supostamente para que haja verba para investir no sistema de saúde, é uma mera tentativa de reverter uma derrota política, aliada a uma busca desesperada de mais recursos para financiar gastos correntes do governo que não podem ser cortados, seja por questões legais, seja por interesses políticos.
As duas principais reivindicações dos governadores reunidos com a presidente Dilma Rousseff têm características distintas. A recriação da CPMF, supostamente para que haja verba para investir no sistema de saúde, é uma mera tentativa de reverter uma derrota política, aliada a uma busca desesperada de mais recursos para financiar gastos correntes do governo que não podem ser cortados, seja por questões legais, seja por interesses políticos.A mudança de critério para a avaliação da dívida de estados e municípios, dentro da Lei de Responsabilidade Fiscal, é uma reivindicação justa e que não fere os princípios do equilíbrio fiscal.
A chamada “flexibilização” da Lei de Responsabilidade Fiscal nada mais é do que a mudança do indexador que mede as dívidas dos estados e municípios, coisa que é preciso fazer para adequar a LRF à situação atual da economia do país, muito diferente de há dez anos, quando foi editada.
Quem, aliás, começou a defender essa alteração foi o governador de São Paulo Geraldo Alckmin, logo depois de eleito, mas o governo alegou na ocasião, erroneamente, que para alterar o indexador seria preciso mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que não é verdade.
A reivindicação de Alckmin tem fundamento técnico, porque a dívida dos estados e municípios ainda é indexada pelo IGPM, pois naquela época havia o câmbio fixo.
Quando o câmbio flutuante passou a ser usado, praticamente tudo que ainda é indexado tem como referência o IPCA, e só contrato de aluguel e tarifas é que ficaram em IGP, além da dívida dos estados e municípios.
Isso gera distorções importantes, por mais que os estados e municípios paguem a dívida só faz aumentar.
Os governadores deviam 12% do PIB em 2000 e hoje devem 11%, mas pagaram muito mais do que esse ponto percentual de redução.
A movimentação de governadores eleitos para recriar o chamado imposto do cheque, extinto em 2007 pelo Congresso na grande derrota de Lula em seus oito anos de mandato, aconteceu logo no início da nova administração, o que sugeriu à oposição um jogo de cartas marcadas para fazer com que a volta da CPMF parecesse um movimento das bases políticas, a que o novo governo acederia.
A reação da opinião pública foi tão negativa que o assunto foi deixado de lado, para ressuscitar agora na reunião dos governadores do Nordeste, a maior parte deles governistas.
Na verdade, não há nenhuma razão para a criação de mais impostos, já que o governo aumentou o IOF logo depois da derrota no Senado e, de lá para cá, a arrecadação só tem feito crescer, levando a carga tributária brasileira para cerca de 36% do PIB.
Mas o governo tem imensas dificuldades para fazer cortes em seu orçamento, e já tem, mais à frente, algumas armadilhas preparadas por ele mesmo, como a política de reajuste do salário mínimo , q u e e s t á s e n d o aprovada no Congresso, que já contratou um aumento para o próximo ano de 14%.
Um estudo feito por Marcos Mendes, consultor legislativo do Senado Federal, doutor em Economia (IPE/USP), demonstra que, devido à forte rigidez da despesa, decorrente de legislação que obriga a realização de gasto mínimo em determinados setores (como pessoal e saúde), o espaço para corte de despesas é mínimo.
Um corte profundo das despesas não rígidas levaria a uma economia de, no máximo, R$ 19 bilhões, longe do ajuste de R$ 50 bilhões anunciado pelo governo.
O estudo demonstra também que há significativo espaço para ajuste nas despesas com inversões financeiras, mas isso requereria mudanças significativas nas políticas industrial e de desenvolvimento regional.
Duas grandes e polêmicas políticas públicas consomem R$ 27,6 bilhões: a política industrial (basicamente, repasses ao BNDES e financiamentos à indústria naval) e a política de desenvolvimento regional (repasses aos Fundos Constitucionais de Desenvolvimento).
As despesas com pessoal e encargos sociais, por sua vez, são rígidas, em função de uma legislação que privilegia a estabilidade no emprego do servidor, a irredutibilidade de remuneração, promoções por tempo de serviço etc.
O candidato derrotado à Presidência, o tucano José Serra, apontou os cargos comissionados — cerca de 20 mil — como passíveis de cortes, mas esses não estão na mira do governo por questões políticas: é neles que estão abrigados os petistas e aliados partidários.
O estudo conclui pela necessidade de se promover um ajuste fiscal com elementos voltados para o longo prazo, como racionalização da política de pessoal, voltada para a qualidade na contratação, o estímulo ao bom desempenho e o controle da folha de pagamento; forte esforço de avaliação dos investimentos públicos prioritários, com o cancelamento de investimentos desnecessários ou questionáveis.
Seria necessária, ainda segundo o estudo, uma revisão da política de reajuste do salário mínimo, para reduzir a velocidade de crescimento das despesas a ele indexadas; a complementação da reforma da Previdência Social; revisão da regra de despesa mínima em saúde, vinculando-se a expansão da verba a melhorias na gestão e a indicadores de qualidade.
FONTE: O GLOBO
 
 
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