Por Leonardo Cazes – Prosa & Verso
Leonardo Padura é um observador privilegiado da vida em Cuba. Mora até hoje na mesma casa em que nasceu e onde viveram seu pai e seu avô, nos arredores de Havana. Em seus livros, não cai no ufanismo do discurso oficial nem no ressentimento de muitos que deixaram o país. No entanto, o escritor está o tempo todo testando os limites da liberdade em Cuba. “O homem que amava os cachorros” (Boitempo Editorial), que já vendeu 12 mil exemplares no Brasil desde o fim do ano passado e foi traduzido para diversos idiomas, é um dos principais exemplos desse exercício. A extensa obra, de 592 páginas, entrelaça as histórias de Leon Trotski; de seu assassino, Ramón Mercader; e de Iván, um aspirante a escritor que trabalha como veterinário.
O romance histórico faz uma crítica contundente do stalinismo, suas manipulações, farsas e crimes. Um tema delicado para um dos últimos regimes socialistas do planeta. Na ilha, o livro foi publicado, mas em duas pequenas edições. Contudo, recebeu o Prêmio da Crítica em 2011, dado pelo governo cubano aos melhores livros do ano lançados por editoras nacionais, e o Prêmio Nacional de Literatura em 2012, o mais importante do país, dado pelo conjunto da obra. Na próxima quarta-feira, Leonardo Padura participará, junto com o escritor Frei Betto — colunista de religião do jornal — do projeto Encontros O GLOBO, às 20h, na Casa do Saber O GLOBO (Avenida Epitácio Pessoa 1164, Lagoa). As inscrições devem ser feitas pelo e-mail encontros_oglobo@oglobo.com.br.
Afinidade com o Brasil
Em entrevista por e-mail, durante uma turnê pela Europa, o escritor, que fala hoje, às 18h30m, na II Bienal Brasil do Livro e da Leitura, em Brasília, lembra que há mais de dez anos recebe convites para vir ao Brasil, mas, por vários motivos, nunca pôde aceitá-los. Agora, está ansioso.
— Minhas expectativas para conhecer o país cresceram nesses dez anos, mas agora creio que vou no melhor momento, pois vou poder participar de eventos em várias cidades, encontrar pessoas interessantes e realizar o desejo de visitar um país com o qual Cuba tem uma relação histórica e cultural muito forte. Eu também tenho grande afinidade com o Brasil. Seu cinema, sua música e sua literatura sempre estiveram entre os meus favoritos.
Frei Betto, que há décadas frequenta a ilha e é autor do livro “Fidel e a religião” (1985), fruto de uma longa entrevista em que o líder da revolução cubana fala sobre sua formação pessoal e sua relação com a religião, destaca que Padura escreve a partir “do único país socialista da história do Ocidente”, e fugiu do maniqueísmo fácil.
— Ele foi muito feliz em “O homem que amava os cachorros”, expôs criticamente toda a história da esquerda e do socialismo no século XX, sem apontar anjos e demônios — diz Frei Betto, que aponta a capacidade do escritor de narrar as mudanças pelas quais Cuba passou. — Em Padura transparece as dores de parto da sociedade cubana em transformação, na ânsia de encontrar pontes adequadas a seu quádruplo ilhamento: por ser uma ilha; por ser socialista; por sofrer o bloqueio injusto dos EUA; e por ter ficado órfã da União Soviética.
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