• A política busca o abrigo de velhos operadores
- Valor Econômico
O PP, o PR e o DEM foram os três partidos mais beneficiados pelas migrações da janela partidária. Os operadores das novas filiações são seus respectivos presidentes, o senador Ciro Nogueira (PI), o ex-deputado do PR, Valdemar Costa Neto (SP) e o senador José Agripino Maia (RN).
Nogueira foi arrolado em inquérito da Lava-Jato depois que o doleiro Alberto Youssef contou à Polícia Federal ter sido escanteado pelo senador na operação das propinas do esquema da Petrobras para seus correligionários. Encabeça a lista de 32 parlamentares do seu partido, a maior bancada da Lava-Jato, denunciados na operação.
A expertise de Ciro Nogueira como operador pode ser medida pelo excepcional desempenho de sua bancada na Câmara. O PP elegeu 38 parlamentares e hoje registra 49. Superou o PSDB (47) e hoje é o terceiro maior partido da Câmara dos Deputados.
Costa Neto foi condenado no mensalão a 7 anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Como a pena foi inferior a 8 anos, cumpriu-a em regime semiaberto, o que lhe possibilitava sair da prisão para trabalhar.
Em novembro de 2014, em função do que o Judiciário entende por bom comportamento, o deputado foi autorizado pelo ministro Luís Roberto Barroso a progredir para prisão domiciliar. Com residência fixada em um hotel de Brasília, Costa Neto, deu duro no cumprimento de sua pena. Depois de eleger uma bancada de 34, o PR hoje amealha 40 parlamentares e passou a integrar, junto com o PP, o time dos cinco maiores partidos da Câmara.
Agripino Maia é réu em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal, um, em mãos da ministra Cármen Lúcia, pela acusação de corrupção passiva em licitação de inspeção veicular no seu Estado e o outro, aos cuidados de Luís Roberto Barroso, no âmbito da Lava-Jato. Neste processo, segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República, o senador teria recebido propina para operar liberação de recursos do BNDES para a OAS durante construção de estádio de futebol em Natal.
A tramitação desses processos não afetou a capacidade de arregimentação do senador. Seu partido renasceu das cinzas. Depois de eleger 21 parlamentares, hoje o DEM conta com 28, graças, em grande parte, à migração da bancada comandada pelo pastor Silas Malafaia.
Somados, PP, PR e DEM têm mais deputados (107) que PT e PSDB (95), os dois partidos que lideraram as mudanças do Brasil nas últimas duas décadas. A capacidade de atrair parlamentares pode ser um indicativo de sua força para rever essas mudanças.
A janela, votada pelo Congresso, acabou no dia 17, mas, como os partidos não têm data limite para formalizar as movimentações, a Câmara ainda não dispõe do balanço final das bancadas. Já é possível saber, no entanto, que PT e PSDB contam, respectivamente, com dez e sete parlamentares a menos do que elegeram em outubro de 2014. Nem todos saíram do partido, alguns assumiram cargos em governos estaduais e prefeituras, num movimento que, além de desfalcar as bancadas, demonstra opções parlamentares mais vantajosas na política local.
O DEM é oposição, mas PP e PR estão na base do governo. O terceiro até ministério (Transportes) tem, mas nenhuma das duas legendas governistas ruma para fechar questão em relação ao impeachment. Antonio Augusto Queiroz, diretor do Diap e exímio mapeador do Congresso, e Andrea Freitas, professora da Unicamp e autora da mais completa tese sobre migrações partidárias, coincidem na avaliação de que esta é uma das razões por que as duas legendas atraem parlamentares numa conjuntura sujeita a imprevisíveis trepidações.
As mudanças na lei eleitoral também são parte da explicação. Candidatos sempre buscaram coligações com um grande número de partidos para conseguir mais tempo de televisão. Agora o cálculo só leva em consideração o tempo destinado aos seis maiores partidos da coligação. A nota de corte, obrigatoriamente, incluirá PP e PR e facilmente abrangerá o DEM, oitava maior bancada da Câmara.
A mudança na lei eleitoral traz outro incentivo para legendas como o PP e o PR, que já tiveram sua capacidade de distribuir recursos públicos entre correligionários atestada por investigações policiais. Como a verba do fundo partidário foi triplicada, os dirigentes têm a oportunidade de operar 'por dentro' a repartição das prebendas legais.
Ninguém no Congresso espera que a fermentada verba oficial dê para o gasto. A delação premiada do senador Delcídio do Amaral deu a deixa: com os holofotes sobre as empreiteiras, uma nova fronteira se abriria nos contratos dos planos de saúde e da indústria farmacêutica. A inconfidência não impediu que esta semana a Câmara aprovasse proposta de emenda constitucional que aumenta de 13% para 14,8% os gastos obrigatórios com saúde, um refresco de R$ 12 bilhões na aridez pátria de 2017.
Além dos novos negócios da saúde, a conjuntura também fez coincidir o início da campanha eleitoral com a repatriação de divisas, aprovada depois de escrutinada tramitação parlamentar. Para incorporar negócios e divisas numa campanha sem doação empresarial, cresce a consulta por contadores capazes de incluir, na declaração do Imposto de Renda deste ano, atualizações patrimoniais que possam demonstrar que os parlamentares, para todos os efeitos, têm recursos para bancar suas próprias campanhas.
A planilha da Odebrecht sugere grande alvoroço de parlamentares que temem cair na malha fina da doadora universal. Os repasses, se dissonantes em relação às doações oficiais, serviriam para dar à Lava-Jato o verniz de apartidarismo cobrado pela maioria dos juristas e pela minoria da opinião pública.
Os grandes vencedores das trocas partidárias mostram, no entanto, que a política, antes mesmo que um novo governo venha a se formar, já busca espaços de reacomodação. Constatá-la é tão mais surpreendente quanto mais inebriado se estiver pela perspectiva de uma refundação da república.
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