O Estado de S. Paulo
A alta aversão a Jair Bolsonaro tem turbinado a candidatura de Lula
No momento atual da corrida presidencial, o
melhor panorama para que um(a) candidato(a) da terceira via alcance viabilidade
eleitoral é a disparada de Lula nas pesquisas e a sinalização de que ele já
venceria no primeiro turno.
Esse cenário produziria a percepção cada
vez mais nítida de que Bolsonaro seria incapaz de derrotá-lo, o que levaria a
uma desagregação ainda maior da base de eleitores do presidente e a uma progressiva
desidratação de sua candidatura à reeleição.
A maioria dos eleitores que votaram em Bolsonaro em 2018 não nutre conexões com o perfil conservador do presidente. Na realidade, eles são essencialmente pragmáticos. Apoiaram Bolsonaro na expectativa de que seu governo ofertasse o que de fato lhes interessava: políticas econômicas liberais, combate à corrupção e, principalmente, contenção do petismo. O governo Bolsonaro, especialmente na gestão da pandemia e da economia, frustrou profundamente tais expectativas, o que tende a levar esses eleitores antilulistas a considerar alternativas.
A perda de competitividade eleitoral de
Bolsonaro também arrefeceria a percepção de que Lula seria o único candidato
capaz de derrotá-lo. Vários desses eleitores têm reservas ao ex-presidente em
função dos diversos escândalos de corrupção e/ou do fracasso econômico de
gestões petistas. Mas também desenvolveram um desafeto extremo a Bolsonaro
diante da ameaça que representaria à democracia liberal brasileira. Por que votar
em Lula no primeiro turno se Bolsonaro deixou de ser competitivo
eleitoralmente? É esperado, portanto, que esses eleitores venham igualmente a
considerar alternativas à Presidência da República.
Mesmo os eleitores que consideram votar em
Lula na expectativa de que seu eventual governo volte a proporcionar maior
inclusão social, quando expostos às várias contradições e inconsistências dos
governos petistas e do próprio ex-presidente durante a campanha, teriam suas
memórias negativas em relação a Lula reativadas.
DERRETIMENTO. Não é improvável, portanto,
que a candidatura de Bolsonaro derreta e fique reduzida ao tamanho de seu “core
voters” (atualmente em torno de 11%, segundo o Datafolha) e que a candidatura
de Lula perca musculatura, alcançando no máximo 40% das intenções de voto,
desempenho histórico do PT em disputas à Presidência em primeiros turnos.
Esta hipótese, entretanto, se baseia na
premissa de que os eleitores pragmáticos de Bolsonaro em 2018 sejam racionais
e, portanto, consigam hierarquizar suas preferências em 2022. De acordo com o
Ipec, 55% dos eleitores de Bolsonaro em 2018 não desejam mais votar no capitão.
Mas 20% deles dizem que pretendem votar em Lula, o que parece não ser tão
racional.
Paradoxalmente, a rejeição extrema a
Bolsonaro tem sido o “anabolizante” de Lula.
*Carlos Pereira Professor titular FGV
EBAPE, Rio de Janeiro
Nenhum comentário:
Postar um comentário