O Estado de S. Paulo
Se estivesse comprometido com uma ampla
renovação econômica, o presidente poderia iniciar uma reforma ambiciosa do
setor governamental
O emprego aumenta, os ganhos crescem, a inflação recua e o consumo avança, mas as projeções do mercado apontam crescimento medíocre, mais pressões inflacionárias e juros ainda elevados no fim deste ano e nos três seguintes. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está condenado a terminar seu mandato, em 2026, com inflação acima do centro da meta e economia emperrada, se as profecias do setor financeiro estiverem corretas. O aumento de preços continuará na faixa de 3,5% a 4%, ainda acima do centro da meta, 3%, e a expansão econômica ficará na vizinhança de 2%, confirmando a aparente maldição lançada há alguns anos sobre o País. O presidente Lula continuará praguejando contra os juros altos se o Banco Central (BC), mesmo com nova diretoria, seguir atuando, na visão lulista, a favor da especulação financeira e contra o povo.
Berreiro presidencial e discursos furiosos
são insuficientes, no entanto, para deixar o mercado arrumadinho, difundir o
otimismo e promover o crescimento seguro. Além de poupar a garganta, o
presidente Lula poderia trabalhar mais tranquilamente se tentasse entender a
inquietação da turma do mercado. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem
procurado, aparentemente, explicar o assunto a seu chefe. O presidente parece
ouvi-lo, de vez em quando, mas o efeito da conversa tem sido limitado.
Não há sinal, até agora, de um compromisso
presidencial com o equilíbrio duradouro das contas públicas. Equilíbrio fiscal
sustentável é o nome do problema. As boas notícias deste momento podem
tornar-se irrelevantes, em pouco tempo, se o governo for incapaz de manter as
condições da economia. O desemprego de 7,1% foi o menor, em dez anos, para um
trimestre móvel encerrado em maio. O presidente pode faturar politicamente essa
boa notícia, mas o ganho será efêmero, se faltar segurança e o crescimento econômico
for muito lento. Segurança depende, em grande parte, de uma clara definição de
rumo pelo governo.
Só há segurança e rumo bem definido quando o
poder público segue objetivos claros, fixados em algum tipo de plano
identificável pelos agentes privados. Nada parecido com isso existe nas ações
presidenciais, neste momento.
O ministro da Fazenda está comprometido com a
arrumação das finanças públicas. O vice-presidente promete trabalhar pela
reindustrialização. O presidente da República tenta apoiar os grupos mais
carentes e atenuar as desigualdades. O ministro da Agricultura tenta manter em
boas condições o agronegócio, o setor econômico mais produtivo e mais dinâmico.
Mas ninguém articula essas funções nem comanda, de fato, um esforço para
aumentar a eficiência do próprio governo. Deve-se reconhecer o empenho da
ministra do Planejamento, mas seu sucesso será limitado, certamente, pelo
desinteresse do chefe do governo.
Se estivesse comprometido com uma ampla
renovação econômica, o presidente poderia iniciar, até como exemplo, uma
reforma ambiciosa do setor governamental. Começaria o trabalho pelo Executivo,
reorganizando sua estrutura, revendo e reduzindo despesas, buscando maior
produtividade e criando um exemplo de modernização. Mas teria de renegar
padrões e valores políticos e administrativos de seu partido, abandonando as
práticas, observadas em outros mandatos, de empreguismo e uso político de
cargos públicos.
Nenhuma iniciativa desse tipo foi observada
até agora. Ao contrário, tem sido mais fácil apostar na repetição das práticas
seguidas em outros mandatos, quando companheiros de partido, aliados e
protegidos foram facilmente alojados em vários escalões da administração
pública e nos quadros de empresas controladas pela União. Talvez a fiscalização
pela imprensa comece mais cedo e seja mais eficiente, desta vez, se as práticas
de outras administrações petistas forem lembradas.
Se realmente quiser, no entanto, vincular a
imagem do PT a um estilo respeitável e eficiente de administração federal, o
presidente deverá rejeitar a influência de antigos companheiros e de líderes
fiéis ao velho estilo de ocupação predatória do setor público. Até agora o
balanço do atual governo diverge, de modo geral, dos piores padrões petistas,
embora sinais de alarme estejam soando em alguns ministérios.
Confrontado com denúncias e indicações de
perigo, o presidente Lula tem reagido de forma contida. É uma forma de evitar
injustiças, ou, talvez, de evitar constrangimento a alguns ministros. A
experiência pessoal deve ser suficiente para levá-lo a evitar qualquer
precipitação. Mas nada poderá justificar a tolerância à corrupção e a quaisquer
lances prejudiciais aos bons padrões da administração federal. Cuidar desses
padrões é responsabilidade inegável do gestor público, especialmente daquele
instalado em qualquer dos postos mais altos.
Promover a prosperidade econômica, o
bem-estar e a proteção dos mais frágeis são algumas das tarefas mais
importantes de um chefe de governo. Mas cuidar do próprio governo também é
parte essencial de suas funções – uma obrigação incontornável, mesmo quando seu
cumprimento possa revelar-se doloroso.
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