Contraventor ordenou que dinheiro fosse levado ao palácio do governo
O bicheiro Carlinhos Cachoeira participou diretamente da venda da casa do governador Marconi Perillo, em condomínio de luxo, em Goiás, e chegou a ordenar ao ex-vereador Wladimir Garcez, outro intermediário da negociação, que o dinheiro fosse levado para Perillo no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás. Gravação da Polícia Federal obtida pelo GLOBO mostra que Cachoeira acertou detalhes da venda do imóvel no dia anterior ao registro da escritura. O bicheiro diz a Garcez: "Vende esse trem hoje, hein. Pega o dinheiro logo, urgente." E completa: "Fala: É pro governador. Vamos lá pagar ele logo no palácio." Marconi Perillo será ouvido amanhã na CPI do Cachoeira.
"Vende este trem", diz Cachoeira
Bicheiro participou da negociação da casa de Perillo e ordenou entrega do pagamento no Palácio
Chico de Gois
Uma gravação da Polícia Federal, obtida pelo GLOBO, entre Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e o ex-vereador de Goiânia Wladmir Garcez revela a participação do contraventor na venda da casa de Marconi Perillo (PSDB), governador de Goiás. Cachoeira chega a ordenar que o dinheiro da venda seja levado para o governador no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás. No diálogo, interceptado às 8h23m do dia 12 de julho do ano passado, Garcez diz que irá se encontrar com o presidente da Agência Goiana de Transportes e Obras (Agetop), Jayme Rincón. A escritura da venda do imóvel ocorreu um dia depois do telefonema.
Perillo, que depõe amanhã na CPI do Cachoeira, tem afirmado que a negociação se deu por intermédio de Garcez e que não recebeu dinheiro pela transação, mas três cheques, que foram depositados em sua conta. Os cheques foram assinados por um sobrinho de Cachoeira, mas o governador afirma que não sabia disso. Na semana passada, o professor Walter Paulo Santiago, que se intitula administrador da Mestra Participações, em nome da qual está a casa, disse que pagou pela imóvel em dinheiro vivo, em pacotinhos de notas de R$ 50 e R$ 100.
Gravação não identifica emissário
Na ligação, Garcez dá a entender que está esperando um emissário. Não fica claro se se trata de Lúcio Fiúza, assessor especial de Perillo que pediu exoneração na semana passada, ou do professor Walter Paulo. O ex-vereador diz a Cachoeira que irá se encontrar com Jayme Rincón em um shopping. Antes, o contraventor questiona se seria bom ele estar presente, mas Garcez o desestimula, porque não vê uma boa explicação para justificar a presença do chefe no encontro.
- Tá aí? - pergunta Cachoeira, sem se referir a uma pessoa específica.
- Não. Ele ligou agora (disse) que tá chegando. Atrasou um pouquinho - responde o auxiliar.
- Quer que eu vá ai? - pergunta o contraventor.
- Precisa não, você que sabe - sugere Garcez, para complementar - O que você está fazendo aqui?
- É verdade, então não vou aí, não - admite Cachoeira.
- O Jayme já está indo lá no Alpha Mall, marcou comigo, qualquer coisa vou encontrar com ele na Agetop - informa Garcez.
Cachoeira fala para o auxiliar ligar para Jayme Rincón e dizer que atrasou, mas que é para ele aguardar Garcez na própria Agetop. E demonstra pressa na conclusão da transação. Na ligação, Cachoeira manda Garcez fechar o negócio no mesmo dia.
- Você liga para o Jayme, fala para ele te esperar na Agetop, que atrasou. Tô indo lá, encontrar com o menino. Vende este trem hoje, hein. Pega o dinheiro logo, urgente - ordena o bicheiro.
- Aquilo que nós combinamos. Não vou perder. Dois mil (milhões) a gente já fechou. Se ele não fizer mais nada que dois, mete bronca. Mas vou tentar os R$ 2.250. Se não der... aí eu te dou uma ligada disfarçada, daquele jeito, viu - combina o ex-vereador.
Cachoeira pede para o auxiliar dizer que é para entregar o dinheiro para o governador, no Palácio.
- Fala: é pro governador. Vamos lá pagar ele logo no Palácio, chega lá pro Jayme. Já manda ele levar o dinheiro. Já entrega a chave pra ele, entendeu. Depois tira os trens que tem que tirar aqui - diz o contraventor.
A casa de Perillo foi vendida com todos os móveis. O valor da transação informado na escritura, no entanto, é de R$ 1,4 milhão.
- Eu já liguei pro Lúcio, inclusive, falando que qualquer coisa eu estou indo lá, falar com ele - declara Garcez, em referência a Lúcio Fiúza.
Na semana passada, o professor Walter Paulo apresentou um recibo, no valor de R$ 1,4 milhão, em nome de Garcez e de Fiúza. Depois do depoimento de Walter Paulo na CPI, Fiúza pediu exoneração. Ele também é apontado pelo jornalista Luiz Carlos Bordoni como o responsável pelo pagamento da prestação de serviço durante a campanha de Perillo. Bordoni fez um trabalho de locução e R$ 40 mil de uma empresa ligada ao esquema de Cachoeira foram depositados na conta da filha dele.
Walter Paulo seria vice de Demóstenes
O contraventor também manda Garcez argumentar com Walter Paulo que não seria bom ficar negociando muito desconto na transação imobiliária, porque o professor podia se tornar candidato a vice na hipotética chapa de Demóstenes Torres (sem partido) para a prefeitura de Goiânia.
- Já resolve isso logo. Vai baixando, de R$ 2,3 milhões para R$ 2,2 milhões. Vamos fechar isso aqui logo. O cara não pode ter má impressão sua não. Mexer com picuinha. Você vai ser o vice do Demóstenes.
Numa outra ligação, no mesmo dia 12, às 8h52m, Garcez informa que está ao lado do professor Walter Paulo e que está concluindo a negociação. E informa a Cachoeira que, antes, Jayme Rincón esteve com eles.
- Tô (sic) com o professor Walter, já estou terminando. Assim que terminar, encontro com você. Mas o menino esteve aqui, o Jayme, tudo ok. Pode se despreocupar, que ele esteve com o cara ontem à noite - informa Garcez.
- Tá com o professor aí? Fechou? - indaga Cachoeira.
- O professor está mandando um abração para você. Tá louquinho. Nunca vi um homem duro igual esse não, Carlinhos - diz o ex-vereador, que solta uma gargalhada.
- Manda fechar logo, rapaz. Quanto? - quer saber Cachoeira, mas o valor não é informado.
Na sequência, ele informa que irá se encontrar com os negociadores:
- Eu vou dar um pulo aí daqui a pouco.
- Vem cá, nós estamos aqui. Vem cá - conclui Garcez.
Procurado pelo GLOBO, o governador Perillo respondeu por meio de sua assessoria que "jamais recebeu dinheiro da venda da casa das mãos de Jayme Rincón ou de Lúcio Fiúza". Disse ainda que "Jayme Rincón não participou da venda do imóvel e (que) já reafirmou várias vezes que jamais se encontrou com Garcez no Alpha Mall". Segundo a nota, "as gravações citadas estão claramente editadas e confusas".
FONTE: O GLOBO
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