A história do Partido dos Trabalhadores é bifronte: uma face afronta, a outra concilia. Em seus primeiros dez anos, o discurso radical se fazia acompanhar de ações radicais. Essa fase deu lugar ao "aggiornamento" dos anos 1990.
O radicalismo dos anos primaveris quase levou Luiz Inácio Lula da Silva ao poder, mas foi a moderação dos anos outonais que efetivamente deu ao PT o governo do país. Desde então, o PT teve a difícil tarefa de sustentar as alianças de Lula e se manter como partido de esquerda.
Isso é demonstrado pelo fato de que cada vez que ele se considera atacado, recorre às suas velhas bandeiras. A convocatória do 5º Congresso resgata termos como "consciência de classe" e "socialismo".
E traz uma novidade: além de atacar os "meios de comunicação", faz referência a "grupos incrustados em setores do aparelho de Estado" que promovem a "criminalização da política".
Seria uma alusão ao STF e à Polícia Federal? O que explica essa moderação continuada com curtos interregnos de radicalismo verbal?
O PT diz na convocatória que suas políticas sociais levaram a uma forte polarização ideológica. Mas, na verdade, a radicalização não foi promovida pelo PT, que se mantém no canto do ringue, à espera de que soe o gongo.
Foi promovida pela oposição, que se mantém no ataque, mas sem nunca dar o golpe decisivo. E, por isso mesmo, esse round não terá fim. É um jogo de cena no teatro da política.
Provavelmente o partido não tomará nenhuma decisão de confronto; não dirá que foi ele mesmo quem nomeou os "grupos incrustados" no aparelho de Estado; e que ele próprio não alterou a relação do governo com os meios de comunicação.
Em sua defesa, dirá que a "correlação de forças" não o permitiu, e que o partido é "republicano", seja lá o que isso signifique.
O cerne da questão não está num partido que cautelosamente recusa a radicalização social, mas num governo que continuará muito bem porque a oposição não tem programa alternativo.
Exceto se as inegáveis melhorias sociais introduzidas pelo governo Lula esbarrarem um dia nos interesses do grande capital.
Nesse caso, um sexto ou um enésimo congresso petista poderia revelar se sua face radical ainda existe.
Lincoln Secco é professor de história contemporânea na USP e autor de "A História do PT" (Ateliê).
Fonte: Folha de S. Paulo
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