Enquanto o primeiro ministro da Educação de Jair Bolsonaro, o breve Ricardo Vélez Rodríguez, provocou apenas estupefação pelo despreparo e sua preocupação com irrelevâncias, seu substituto, Abraham Weintraub, foi mais longe - provocou as primeiras manifestações nacionais de protesto contra o governo, que reuniu dezenas de milhares de pessoas em todas as capitais do país. A inabilidade e prepotência de Weintraub contribuiu também para arregimentar uma plateia significativa aos partidos de oposição, que há bom tempo perderam a capacidade de mobilização de massas. O presidente da República colaborou como pode para engrossar os protestos, ao chamar os manifestantes de "idiotas úteis".
Em um ambiente já carregado por crises e conflitos criados pelo próprio governo, a maneira enviesada pela qual o ministro da Educação explicou o contingenciamento de verbas na sua pasta foi a faísca que detonou o descontentamento. Weintraub disse que estava cortando verbas de três universidades federais por "balbúrdia" e "reuniões ridículas". Com isso, transformou um ato corriqueiro, repetido por todos os governos em início de mandato, de reservar um montante de recursos que não poderá ser utilizado até que se tenha garantia de que a meta fiscal será atingida, em instrumento punitivo guiado por preferências pessoais. Não se trata ainda de corte de verbas. Todos os ministérios, com exceção da Saúde, "perderam" recursos - R$ 29,79 bilhões.
Ao vincular uma proibição geral e necessária de gastos a uma perseguição voluntarista a universidades supostamente dadas a algazarras, Weintraub trouxe o conjunto de sua ainda pequena obra à memória de pais, professores e estudantes preocupados. Logo em sua estreia, com apoio do presidente da República, ele expôs um programa de gestão no qual os recursos para cursos de filosofia, sociologia e demais ciências do homem seriam "descentralizados", isto é, receberiam menos verbas diante de outros que dão mais "retorno", como veterinária, engenharia e medicina. As declarações causaram assombro entre os especialistas e estranheza entre os leigos.
Ao se comportar como um bedel raivoso, disposto a menosprezar por idiossincrasias a área de ciências humanas, essencial entre outras para a formação de professores, o ministro galvanizou um mal-estar difuso com a inépcia governista, e atraiu nas ruas a repulsa a uma ameaça concreta à área mais vital para o desenvolvimento do país e para a formação dos cidadãos, a educação.
O governo não teria porque jogar na defesa no caso do contingenciamento - o desastre fiscal foi herdado do governo Dilma -, se não fosse ele usado como arma de ataque de Weintraub. A medida levou R$ 5,83 bilhões da pasta, com orçamento de R$ 149 bilhões. O bolo das universidades federais nesta poupança forçada foi de R$ 1,7 bilhão, mas o ajuste que será feito preserva as despesas de pessoal, que deram um salto de 79% entre o orçamento de 2014 e o de agora.
Da mesma forma, há como iniciar uma discussão ampla sobre a proporção dos gastos existentes, mais favorável ao ensino superior que à educação básica, e sobre as maneiras de se atingir melhores resultados em ambos. Há consenso de que o Brasil não gasta pouco em educação, na comparação com países da OCDE (embora precise gastar mais), e que precisa ser mais racional e produtivo em seu uso. O aproveitamento escolar no ensino fundamental é péssimo e melhorá-lo é uma tarefa complexa demais para ser tratada segundo ideias passageiras de um ministro que nunca foi especialista na matéria. Entre as virtudes dos bolsonaristas, porém, não se encontra a necessária humildade diante da própria ignorância e a prudência e paciência diante de problemas que não se conhecem em profundidade.
O estilo belicoso do governo, cujo tom é dado pelo presidente e sua família, afasta progressivamente o Congresso do Executivo e agora começa a ressuscitar uma oposição que havia perdido as eleições e o eixo. Diante do amadorismo orgulhoso dos governistas, a insatisfação pela maneira como vem sendo tratada a educação dá a oportunidade de que a ela se aglutinem todas as críticas, mesmo ao que o governo precisa fazer e está fazendo, como a reforma da previdência. A ala política do governo catalisa oposição também à sua correta agenda econômica, que pode naufragar ou se ver desmontada se prevalecer a atual insensatez no Planalto. Há tempo para o governo mudar de atitude, mas não se veem sinais de que ele sequer reconheça a necessidade de fazê-lo.
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