Em
outubro de 2019, alguns meses antes de o mundo virar de cabeça para baixo com a
pandemia da Covid-19, um grupo de economistas acadêmicos se reuniu numa
conferência em Washington D.C. para discutir políticas de combate à
desigualdade em economias avançadas.
O
objetivo da conferência era fazer um balanço sobre as políticas públicas que
podem ser utilizadas para a redução da desigualdade. Foram tratados os temas
mais diversos, desde educação e qualificação da mão de obra, passando por
comércio internacional, inovação e mudanças tecnológicas, até o fortalecimento
de redes de proteção social e a introdução de taxação mais progressiva.
O
que tornou esta conferência única não foi o tema, mas seus participantes e o
fato de que praticamente todos concordaram que a desigualdade é um problema de
primeira ordem, algo difícil de imaginar há 10 ou 15 anos atrás.
Os participantes não eram somente economistas considerados de esquerda e especialistas em desigualdade como Emmanuel Saez e Gabriel Zucman. A elite da academia americana estava presente em peso com nomes como Daron Acemoglu, David Autor, Greg Mankiw, Hilary Hoynes, Larry Katz, Marianne Bertrand, e Philippe Aghion.
Os
trabalhos encomendados para a conferência estão no novo livro “Combating
Inequality: Rethinking Government’s Role”, editado pelos economistas Olivier
Blanchard e Dani Rodrik, organizadores do encontro. Apesar do foco em países
desenvolvidos, muitos dos questionamentos e discussões de políticas públicas
presentes no livro servem para o Brasil.
Blanchard
e Rodrik resumem na introdução do livro alguns dos achados surpreendentes da
conferência. Primeiro, a ausência de uma discussão comum entre economistas de
que existe um trade-off entre equidade e eficiência. A desigualdade é hoje
considerada pela maioria dos economistas como um fator que gera má alocação de
talentos e restringe o crescimento econômico.
Segundo,
houve uma ausência da promoção de desregulamentação de mercados ou redução de
programas sociais como formas de aumentar emprego e reduzir a desigualdade.
Finalmente a percepção foi generalizada de que programas sociais são
importantes e que devem ser pagos com um aumento na progressividade dos
impostos.
Mas
que políticas públicas podem ser usadas para combater a desigualdade? O livro
faz uma categorização interessante ao separar as políticas públicas entre
aquelas que atingem diferentes estágios da economia (pré-produção, produção ou
pós-produção) e o tipo de desigualdade que queremos reduzir (baixa renda, renda
média ou no topo da distribuição).
A
comparação se dá entre políticas educacionais ou de renda mínima, que afetam a
igualdade de oportunidades antes do processo produtivo, e políticas de fomento
à inovação, que afetam as decisões das empresas. Uma das principais conclusões
do livro é que as políticas públicas terão que ir além da educação,
qualificação e redistribuição.
O
foco na criação de “bons empregos”, como já argumentou diversas vezes Daron
Acemoglu, é fundamental. Políticas para combater a desigualdade devem fomentar
a inovação tecnológica, mas de forma que os benefícios possam ser apropriados
por trabalhadores e não somente pelos donos das empresas.
Elas
devem também ajudar os trabalhadores a se organizarem face às novas tecnologias
como a internet e mídias sociais. E finalmente, políticas redistributivas devem
ser pagas com uma maior progressividade dos impostos.
As
causas da desigualdade brasileira podem ser diferentes da americana, inclusive
pela presença de um grande setor informal. Mas a necessidade de reduzirmos a má
alocação de talentos e gerar oportunidades mais amplas é a mesma.
Investimentos em educação são fundamentais, assim como programas de transferência de renda, mas não resolvem o problema. É hora de o Brasil pensar não só na criação de empregos, mas em políticas que busquem criar “bons empregos”. Para isso será necessário inovar, experimentar com novas ideias e avaliar seus efeitos. E nesse processo uma coisa é certa, o papel do governo será cada vez mais importante.
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