O Globo
Na última terça-feira, Frances Haugen,
ex-funcionária da divisão de integridade cívica do Facebook, depôs no Senado
americano. Seu depoimento aconteceu depois da publicação de uma série de
reportagens no jornal The Wall Street Journal a partir de documentos internos
da empresa vazados por ela.
As reportagens mostraram que uma mudança no
Facebook passou a promover conteúdos politicamente divisivos e que a empresa
preferiu não reverter essa mudança, mesmo sabendo dos seus efeitos, para não
afetar a lucratividade do negócio. A denúncia foi comparada ao escândalo da
descoberta de que as empresas de tabaco tinham feito estudos atestando que os
cigarros eram viciantes e os esconderam do público para proteger a indústria.
Ela diz respeito às mudanças no algoritmo do Facebook que determina a ordem das postagens apresentadas ao usuário quando desce a barra de rolagem. Ao mudar o ordenamento, postagens e interações (curtidas, comentários e compartilhamentos) de pessoas mais próximas passaram a ser destacadas, em detrimento de conteúdos de amigos mais distantes ou páginas de instituições.
O Facebook disse que fez a mudança porque
acreditava que certos conteúdos “passivos”, como vídeos profissionais, estavam
ganhando muita audiência, e isso poderia trazer prejuízo para a saúde dos
usuários. Documentos internos mostram, porém, que a verdadeira causa da mudança
foi a necessidade de aumentar o engajamento dos usuários, expondo mais
postagens que estimulassem comentários — o que ampliaria o uso diário do
Facebook e, consequentemente, as oportunidades para apresentar publicidade.
Com a mudança do algoritmo, a interação das
postagens efetivamente disparou. Só que o tipo de postagem que gerava mais
engajamento era desinformativo ou politicamente divisivo. Um memorando interno
da empresa alertou que “desinformação e conteúdo tóxico e violento estão
extraordinariamente se destacando entre os compartilhamentos”.
Um estudo sobre os efeitos da mudança do
algoritmo na Espanha destacou que os partidos políticos aprenderam que “ataques
duros a oponentes geram maior engajamento” e que, embora digam que tentam
evitar o comportamento, no final terminam “fazendo o que funciona”.
Um diretor do site BuzzFeed alertou um
executivo do Facebook de que os piores conteúdos do site estavam viralizando na
plataforma, incentivando a criação de conteúdos ruins. Um grupo de partidos
políticos europeus escreveu ao Facebook pedindo para reverter a mudança no
algoritmo porque seus apoiadores estavam ficando muito radicalizados, o que os
obrigava a adotar posições políticas mais extremas.
Apesar dos alertas internos e externos, a
direção do Facebook optou por manter a medida, priorizando seus interesses
comerciais.
A denúncia de Haugen está servindo para
recolocar o debate sobre onde deve incidir a regulação estatal. Embora se fale
muito em regular a moderação de conteúdo, Haugen mostrou a urgência de regular
os algoritmos que ordenam as postagens nas mídias sociais.
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