quarta-feira, 11 de abril de 2012

Novo patamar:: Míriam Leitão

A relação com os Estados Unidos está subdesenvolvida, e essa visita mostrou que o Brasil precisa intensificar e modificar a natureza dessa relação. A presidente Dilma não foi recebida como foram os governantes da Índia e da Coreia do Sul, com jantar de gala na Casa Branca. Os Estados Unidos não entenderam ainda o nosso tamanho e importância, e nós continuamos achando que temos que provar independência.

Quem é realmente independente não precisa provar que é. A política externa independente do Brasil vem de muito tempo, não é preciso procurar cada encontro para reafirmar as diferenças. Vem de longe a decisão brasileira de pensar com sua própria cabeça no cenário internacional e não tentar acertar seu passo com o passo de Joãozinho algum.

Na diplomacia, é preciso ler os sinais. O fato de o governante do Brasil ter sido recebido com menos pompa e circunstância do que os da Índia e Coreia do Sul tem significado. Isso sem falar obviamente do presidente chinês, que foi recebido com fanfarra dado o tamanho do país. Os Estados Unidos continuam sem perceber que o Brasil mais do que uma potência regional caminha para um lugar de ainda mais destaque internacional. É por isso que tem feito eloquente silêncio sobre a ambição brasileira em relação ao Conselho de Segurança da ONU e já demonstrou apoio à pretensão da Índia ao mesmo posto.

Do ponto de vista estritamente comercial o Brasil tem muita munição. Tem o argumento de que triplicou as compras no mercado americano nos últimos oito anos, exatamente quando eles mais precisaram. Aqui fica um mercado importante para produtos de alta tecnologia e alto valor agregado na exploração de áreas relevantes, como o pré-sal. Com tudo isso, é possível brigar contra suspensão sem maiores explicações das nossas vendas de aviões da Embraer.

Há pontos externos em que nossa divergência não precisa ser reenfatizada. É o caso do Irã, por exemplo. O governo brasileiro insiste em defender o direito de o Irã desenvolver seu projeto nuclear, mas passa um recibo de ingenuidade quando dá como certo que é um programa com fins pacíficos. Sobre isso, há controvérsias.

Já a briga pelo fim do embargo a Cuba tem a ver diretamente conosco. Essa é uma antiga posição do Brasil e está correta. O embargo não faz sentido algum, e é provinciano. Se os americanos tivessem mais visão estratégica entenderiam que com mais abertura econômica eles empurrariam a ilha para uma economia de mercado mais rapidamente, o que tornaria mais fácil a caminhada para a democracia.

E justamente quando o governo dos irmãos Castro está dando sinais de senilidade é que é momento de estreitar a relação. Em vez disso, o lobby anticastrista está escalando. O que é uma burrice perigosa. Veja a reportagem de capa do "Valor Econômico" de ontem: uma lei que está aprovada na Flórida vai limitar investimentos locais com empresas que tenham negócios com Cuba. Isso bate direto nos projetos da maior construtora brasileira na Flórida, que é a Odebrecht. Nesse caso, é preciso mais do que nunca insistir na posição brasileira porque o embargo à Cuba afeta diretamente nossos interesses. A política imposta na Guerra Fria já caducou mas continua fazendo vítimas.

A Odebrecht tem um histórico de grandes obras na Flórida, como uma parte do aeroporto, e está entrando em outras concorrências, como a ampliação do Porto de Miami, e está também em Cuba ampliando o Porto de Mariel.

A conversa entre Obama e Dilma foi ampliada para além do horário marcado e isso é um sinal de deferência, mas já houve essa hora extra em outros encontros entre governantes do Brasil e Estados Unidos. Mas o Brasil pode e deve querer mais que isso, sabendo, no entanto, que a atitude reivindicatória não faz mais sentido dada a importância e o tamanho do país.

O Brasil vai crescer e se expandir em diversas áreas em que os Estados Unidos terão interesse em fornecer equipamentos e produtos de alto valor agregado, como, por exemplo, na exploração do pré-sal. Por isso é que o presidente Barack Obama, de olho nos negócios, falou em redução da exigência do conteúdo nacional. O Brasil tem enorme déficit comercial com os EUA, aumentou as compras, tem mercado para novos produtos e empresas americanas. Pode usar esse poder de barganha para fazer propostas concretas que ampliem espaço para nossas empresas e produtos.

É preciso, no entanto, estar pronto para aproveitar as oportunidades. O caso do etanol mostrou despreparo. Brigamos tanto pela derrubada da barreira ao etanol e quando conseguimos o Brasil estava com escassez do produto e passou a importar.

O programa cumprido pela presidente Dilma Rousseff ontem foi da maior relevância: estreitar relações nas áreas de educação, ciência, pesquisa. Apoiar estudantes brasileiros na sua ambição de passar por universidades americanas. Tudo isso que a presidente Dilma deu ênfase será fundamental para o projeto que o Brasil quer.

A abertura das fronteiras aos turistas e viajantes é importante para os dois lados. Apesar de a embaixada americana no Brasil estar apresentando estatísticas de avanços, fatos absurdos continuam acontecendo com brasileiros que vão aos Estados Unidos. Alguns sentiram melhoras, outros vivem ainda situações desrespeitosas.

FONTE: O GLOBO

Nenhum comentário: