Até membros do governo admitem: causa indígena vinha sendo tratada com lentidão
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff defendeu ontem uma solução negociada para os conflitos envolvendo a demarcação de terras indígenas, mas afirmou que o governo cumprirá a lei e as decisões judiciais. Ela teve de se explicar um dia depois de o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, ter contado a um grupo de indígenas que a presidente considerou um erro da polícia cumprir a ordem judicial de reintegração de posse da fazenda Buriti, em Sidrolândia (MS).
Dilma disse que não só os direitos dos índios têm de ser garantidos, mas os de todas as populações:
- Nós temos uma população indígena e não podemos negar essa existência, até porque ela é a população originária do país. Isso não significa que outras populações que se estabeleceram no Brasil também não têm direito. Acho que é uma questão que tem de ser feita com base no diálogo - disse. - Agora, o governo brasileiro cumpre a lei rigorosamente. O que a Justiça dispõe para nós fazermos, nós cumprimos. Mas sempre vamos preferir o processo negocial para evitar choques, mortes, ferimentos. Isso é algo característico da sociedade brasileira. O Brasil sempre prefere uma solução negociada, uma solução sem atrito.
A operação da PF, semana passada, foi desencadeada após liminar da Justiça de Mato Grosso do Sul, e resultou na morte do terena Oziel Gabriel. Em reunião com índios contrários à construção da hidrelétrica de Belo Monte, Carvalho disse que Dilma reclamou com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que a ordem judicial deveria ter sido desobedecida.
Ontem, a Secretaria Geral divulgou nota afirmando que Carvalho "cometeu um equívoco" ao dizer que Dilma havia reclamado do cumprimento da ordem judicial: "O ministro afirma que tentava demonstrar a dor da presidente Dilma com a morte de um indígena ocorrida naquela ocasião e a insistência dela na utilização do método da negociação e do diálogo na resolução de conflitos", diz a nota.
Carvalho ainda diz que "em nenhum momento a presidente fez críticas ao ministro Cardozo pelo fato de a Polícia Federal estar cumprindo ordem judicial".
Vaias e falta de atenção à crise
Os próprios integrantes do Executivo admitem que a questão indígena vinha sendo tratada com muita lentidão pelo governo Dilma. O alto escalão só atentou para a existência de uma crise grave envolvendo agricultores e indígenas em Mato Grosso do Sul há pouco mais de um mês, quando Dilma foi vaiada por produtores rurais enquanto entregava ônibus escolares em Campo Grande.
Dez dias após o protesto, a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, informou na Câmara que seriam alterados os procedimentos para demarcação das terras indígenas, reduzindo a influência da Funai. Se a decisão agradou aos produtores rurais, teve efeito inverso entre os indígenas.
Interlocutores de Dilma asseguram que a decisão anunciada por Gleisi teve participação direta da presidente, que defendeu a inclusão do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Embrapa no processo de demarcação. Parte das áreas em litígio é usada para agricultura.
No governo, a Funai é criticada por defesa excessiva dos indígenas, sem levar em conta a situação de cada região. A expectativa é que até o fim do mês o Ministério da Justiça conclua o decreto definindo como serão feitas as demarcações.
Após participar da abertura do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Dilma reafirmou que não cabe ao governo discutir uma decisão judicial:
- Nós cumprimos a lei e achamos que a lei não é algo que as pessoas podem falar "não gosto desta, gosto daquela". Todo mundo neste país cumpre lei, do presidente da República ao bebê que acaba de nascer. Ele nasce sob um arcabouço legal que garante que vivamos em paz e harmonia. Preferiremos processos negociais, mas cumpriremos as decisões judiciais.
Fonte: O Globo
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