Todos acompanham a agonia de Marina Silva na corrida contra o tempo para registrar seu partido, uma corrida que pode afetar todo o curso da sucessão presidencial
A corrida da ex-senadora Marina Silva contra o tempo para registrar seu novo partido teve ontem uma espécie de largada oficial. O fracasso ou sucesso da empreitada afetará não apenas o destino político dela e de seus companheiros, mas todo o curso da sucessão presidencial. Se até 5 de outubro forem vencidos todos os obstáculos para a criação da Rede Sustentabilidade, Marina — hoje a segunda colocada nas pesquisas — será uma forte candidata, com chances (não garantias) de disputar o segundo turno com a presidente Dilma Rousseff. Se o esforço fracassar, o jogo ficará novamente embolado, ainda que a dona de 26% de intenções de votos decida concorrer por outra sigla.
Ontem, Marina e acompanhantes, entre eles o senador Pedro Simon (PMDB), em sinal de solidariedade, entregaram ao TSE cinco sacolas com a certificação de 304.099 assinaturas. Como são necessárias 491 mil, estão faltando quase 200 mil assinaturas certificadas. Ela resolveu atropelar o rito para tentar acelerar o trabalho dos cartórios na análise das assinaturas, que teriam sido entregues antes de 1º de agosto, em número até maior que o exigido. Essas queixas ela já fez à própria presidente do tribunal, ministra Carmem Lucia. E dizem por lá que, quanto mais ela critica, mais aumenta a má vontade da burocracia eleitoral. Agora lhe resta esperar que a jogada dê resultados e acelere o processo.
Marina, com as intenções de votos ampliadas pelas manifestações de junho, que só a ela beneficiaram, é, hoje, a garantia de que haverá segundo turno. Se ela eventualmente ficar fora do pleito, ninguém pode apontar, com certeza, para onde iriam seus votos, que passariam a ser disputados por Dilma, Aécio Neves e Eduardo Campos.
Com o partido legalizado e a candidatura garantida, Marina passaria a enfrentar outros problemas, como o do financiamento de campanhas, o de palanques nos estados e, principalmente, a construção de um discurso que afaste os receios de ingovernabilidade em caso de sua vitória. Ela já começou a fazer isso ao dizer, como na entrevista a Paulo de Tarso Lyra, aqui no Correio, que fortalecerá o agronegócio, mas com produtividade e não com avanços sobre o verde. Pela primeira vez, defendeu a manutenção dos pilares da política econômica em curso.
Se a Rede fracassar, ela poderá optar por um pequeno partido, com o PEN, com o qual já dialoga. Mas há quem diga que isso não seria a mesma coisa que concorrer por um partido que nasceu da livre adesão dos insatisfeitos com o status quo da política nacional. Pode não ser a mesma coisa mas, dos 26% de intenção de voto, ela tem uma parcela cristalizada, que levará para onde for. E, ainda assim, isso representará mudança nos ventos da sucessão. Mudanças que seriam mais radicais se ela simplesmente decidisse não concorrer por outra sigla. Os ponteiros estão girando e todos acompanham a agonia de Marina, que não é só dela.
A queda do chanceler e o decoro do senador
O ex-ministro Antonio Patriota foi derrubado por uma ação diplomática bizarra, que desonra a tradição fundada pelo barão do Rio Branco, executada por um diplomata autonomista e transgressor da hierarquia, com objetivos ainda nebulosos. Tornou-se inevitável porque explicitou falha nas linhas de comando e controle da política externa, afetando sua credibilidade e conceito junto à comunidade internacional. No que pese a delonga do Itamaraty em resolver a questão do prolongado asilo do senador Roger Molina na Embaixada Brasileira, nada justifica o que fez o encarregado de negócios, Eduardo Saboia, estranheza explicitada pela ministra das Comunicações da Bolívia, Amanda Dávila, com sua declaração de que “setores ultraconservadores, nos dois países, tentam criar uma crise diplomática entre Brasil e Bolívia”. A substituição do chanceler foi a resposta que restou à presidente Dilma, que teria tido uma de suas crises de ira ao saber do ocorrido.
Ela e Patriota nunca tiveram uma relação afinada como a que tinham o ex-presidente Lula e seu chanceler, Celso Amorim, que ficou oito anos no cargo. Entretanto, sempre acabavam se recompondo depois dos atritos, que foram vários. Com certeza, não era este o desfecho que ela desejava na relação com um ministro que lhe serviu com extrema dedicação, contemporizando inclusive com sua aversão aos cuidados e delicadezas da vida diplomática. Dilma não tolera o ritmo do Itamaraty, que considera lento demais para sua pressa.
Mas, se todos devem pagar — e não está claro ainda o que acontecerá com o desastrado Saboia — falta uma resposta do Senado para a conduta do senador Teodorico Ferraço, presidente da Comissão de Relações Exteriores, que numa ação tão unilateral como a do ministro Saboia, sem consultar o presidente Renan Calheiros e ninguém mais, pediu um avião emprestado e foi a Corumbá receber o senador boliviano para traze-lo a Brasília como um troféu . Foi aplaudido por senadores de oposição, mas deve ter violado também os limites de sua competência e do próprio decoro, especialmente com o uso de um avião de particular para uma ação política de tão alta repercussão para o Brasil.
Esse assunto ainda vai longe. Para o advogado de Molina, asilados não podem ser extraditados. Para o governo brasileiro, Molina entrou no Brasil ilegalmente, não como asilado, portando salvo-conduto. A extradição, entretanto, será um deus nos acuda.
Fonte: Correio Braziliense
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