- Folha de S. Paulo
É preciso admitir que o autor é corajoso. Ele começa a obra afirmando que a vasta maioria dos políticos trabalha muito e ganha pouco e que eles geralmente fazem um trabalho fantástico, diante das pressões contraditórias a que estão submetidos. Antes que você tenha a ideia de organizar uma petição online exigindo a interdição de Matthew Flinders, é bom esclarecer que ele não estava pensando no Brasil da Lava Jato quando cravou essas palavras em seu "Defending Politics" (defendendo a política), de 2012.
Flinders, da Universidade de Sheffield, tinha como horizonte a política do Reino Unido e das nações desenvolvidas, países onde suas observações, embora tenham algo de chocante, não soam como desvario. A diferença entre o Brasil e as democracias maduras, porém, é mais de grau que de natureza, de modo que muito do que Flinders afirma vale para cá.
A tese central do autor é que somos essencialmente injustos com a democracia e os políticos. Exigimos que eles nos proporcionem todo gênero de direito e até a felicidade, mas não estamos dispostos a pagar mais impostos nem a abrir mão de nada. O resultado disso é que políticos, para não nos contrariar, se dirigem a nós de forma cada vez mais ambígua, erodindo a confiança no sistema.
Ao fim e ao cabo, destaca Flinders, a democracia entrega muito mais do que aparenta. Ao proporcionar a alternância pacífica de poder, ela permitiu que os países desenvolvidos chegassem a um grau nunca antes experimentado pela humanidade de bonança material e segurança.
As reflexões de Flinders são um bom contraponto neste momento em que estamos, não sem motivo, irritados com políticos. Concordo com a tese de que não dá para jogar a política fora. Receio, porém, que Flinders, no intuito de resgatar a confiança, exagere ao rejeitar remédios como o papel crescente das agências e do Judiciário, que são corpos de especialistas no lugar de políticos.
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