Bolsonaro amplia direito ao porte de armas de modo temerário para agradar nichos
Em decisão nefasta, que fomenta a violência e atropela o debate, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) mudou de maneira drástica, por decreto, regras decorrentes do Estatuto do Desarmamento.
O édito do Executivo estende o direito ao porte de armas a pessoas ligadas a 20 segmentos profissionais ou sociais —como políticos com mandato, advogados, caminhoneiros, caçadores, oficiais de Justiça, jornalistas da área policial, habitantes de zonas rurais, conselheiros tutelares e colecionadores.
Também se alargam os limites para a aquisição de armamentos até aqui de uso exclusivo das forças de segurança, bem como para a comercialização de cartuchos —que passa das 50 unidades por ano para 5.000. Segundo outra decisão insólita, adolescentes ficam dispensados de autorização judicial para praticar tiro.
As normas somam-se às de decreto de janeiro, que já haviam tornado a posse de armas mais flexível.
Na prática, o Palácio do Planalto instaura um regime de complacência com a circulação desses artefatos, cujos maiores beneficiários deverão ser, além do mercado clandestino, os fabricantes.
Recorde-se que o presidente mantém relações das mais amistosas com o setor. Antes da eleição de 2018, em visita a uma feira de armamentos, Bolsonaro fez propaganda voluntária de modelos de uma empresa cotada em Bolsa de Valores —cujas ações, aliás, subiram depois das novas regras.
É reveladora, ainda, a imagem resultante da assinatura do decreto: parlamentares ligados à causa armamentista —membros do que se conhece jocosamente como bancada da bala— a aplaudir o mandatário, enquanto alguns disparam projéteis imaginários com as mãos, numa repetição do gesto belicista consagrado na corrida eleitoral.
Condenado pela larga maioria dos estudiosos da segurança pública, em razão dos riscos de episódios violentos que acarreta, o texto de Bolsonaro já é também contestado por se chocar com disposições de lei aprovada pelo Congresso, como o limite de categorias beneficiadas pelo porte.
Nesse quesito, em iniciativas bem-vindas, a Câmara dos Deputados decidiu providenciar estudo sobre a constitucionalidade da medida, enquanto o partido Rede Sustentabilidade anunciou ação no Supremo Tribunal Federal para questionar a validade do instrumento usado pelo Executivo.
Não há dúvida que decisão de tal magnitude e grau de controvérsia deveria ao menos passar por um amplo debate legislativo. O governo, contudo, parece ter pressa demasiada em contentar nichos minoritários do eleitorado.
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