Folha de S. Paulo
Um caubói caminhoneiro acaba de chamá-lo de
frouxo. Um dia, toda criatura se volta contra o criador
Faixas abertas por seguidores de Jair
Bolsonaro nas arruaças de 7 de setembro faziam ameaças aos seus inevitáveis
desafetos: STF, TSE, CPI, TV Globo, petistas, governadores, jornalistas,
intelectuais, artistas, cientistas, povos indígenas, ecologistas, feministas,
negros, gays, usuários de máscara e demais comunistas. Até aí nada demais, eles
odeiam o mundo. O surpreendente foi a aparição em algumas faixas de dois nomes
tachados de "cânceres": o deputado Arthur Lira e o senador Rodrigo
Pacheco, presidentes das casas do Congresso. Mas como? Por quê? É assim que os
bolsonaristas agradecem a quem tanto os ajuda —voltando-se contra eles?
Sim, assim como se voltaram contra Sergio Moro, que lhes deu numa bandeja a eleição de Bolsonaro, e contra todos os que por algum motivo desertaram da matilha. A diferença é que, até há pouco, esperavam pelo chefe para saber a quem odiar. Agora já escolhem por conta própria os inimigos a destruir. Era inevitável: de Adão aos robôs da ficção científica, a história está cheia de criaturas que se libertaram de seus criadores.
Nas manifestações em Brasília, eles
atacaram uma equipe da TV Record —que mandamento do bolsonarismo ela terá
desrespeitado? Augusto Aras, passador-de-pano-geral da República, ousou dizer
no dia seguinte que a Constituição nunca poderá ser afrontada —por acaso saberá
o que está fazendo? E o mocho ministro Kassio Marques que ouse votar com os liberais
numa sessão do STF para
ver o que lhe acontece.
Bolsonaro é destrambelhado e estúpido
demais, e os bolsonaristas logo precisarão de alguém melhor. Um indício de que
já começaram a se mover sozinhos é a classificação de "frouxo" dada
publicamente a ele por um patético caubói caminhoneiro, por Bolsonaro ter
ordenado a dissolução da greve da categoria.
Hoje sabemos que o bolsonarismo já existia
antes de Bolsonaro. O trágico é descobrir que talvez sobreviva a ele.
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