O Estado de S. Paulo
Quanto mais se conhecem os fatos, menos chance há de repeti-los. E para aqueles - de todos os matizes ideológicos - que de alguma maneira flertam com o autoritarismo, o trabalho da Comissão Nacional da Verdade é uma fonte imprescindível de conhecimento.
Penso nisso quando vejo uma gente enfurecida sair às ruas ou frequentar as redes de internet pedindo a volta dos militares ao poder, acreditando piamente que é por aí, pelo comando da mão forte e do braço firme, da interdição do debate político, que se enquadra o Brasil aos bons costumes.
Mas penso também quando ouço outro tipo de gente enraivecida a defender um cala boca geral na imprensa independente, acreditando piamente que é das notícias que decorrem os problemas sem notar que com isso chocam o ovo da serpente.
A CNV lista uma série de providências, sendo a de maior impacto a recomendação para que as Forças Armadas se responsabilizem, juridicamente inclusive, pelos crimes contra a vida cometidos nos governos militares. Dificilmente ocorrerá, como é remota a hipótese de revisão da Lei de Anistia, embora nesse passo venham se abrindo caminhos para reparações na Justiça.
Aqui e agora, depois desses dois anos e sete meses de levantamento de dados, tomada de depoimentos e construção de um documento histórico o legado primordial para o País é a divulgação das informações. Se os militares assumem ou não a responsabilidade, isso não apaga os fatos. A vigência da Lei da Anistia não inclui cláusula pétrea de condenação na Nação à perda de sua memória. Perdoar não é sinônimo de esquecer.
O que virá daqui em diante, as consequências, as reações, impossível prever. Vale o que está feito: o registro da identificação de 377 militares, policiais e agentes públicos responsáveis por torturas, a revelação de centros onde eram cometidas as barbáries, a listagem de 435 casos de mortes de desaparecimentos, o relato pormenorizado de episódios que derrubam versões inventadas pela ditadura e repõem a verdade sobre um período em que o Estado capturou para si o poder de vida ou morte de cada um dos brasileiros.
O resultado do trabalho não agradou aos que esperavam algo mais contundente. Reclamou-se de "termos amenos" de "superficialidade", falou-se até em frustração. Já do outro lado manifestações de um ou outro personagem da época carregavam conteúdo oposto, enxergando revanchismo no relatório.
Se os mais diretamente envolvidos ficaram insatisfeitos, os demais cidadãos - principalmente os que não viveram aqueles tempos - ganharam acesso a um pedaço da História.
De berço. O deputado Jair Bolsonaro impressiona pela rudeza de modos. E o mais impressionante é que exatamente por isso tem imenso eleitorado.
Poderia defender suas posições sem recorrer a expressões violentas, mesmo sendo em reação a exageros verbais de adversários. Mas talvez não obtivesse tanto sucesso.
Em seus vários mandatos tantas o parlamentar já fez equivalentes em grosseria a essa última em que usou a tribuna para dizer que só não estupraria uma colega porque ela "não merecia", que a falta de decoro já está contabilizada no voto de quem se sente por ele representado.
Cerimonial. "Playboyzinho" de fato não é a maneira mais adequada de um ministro de Estado se referir a um senador da República, como fez Gilberto Carvalho em cerimônia no Palácio do Planalto para (des) qualificar o adversário Aécio Neves.
Mas, mais impróprio ao cargo e ao ambiente é o uso de termos chulos, conforme este trecho do discurso feito na ocasião: "...todo tipo de acusação de bolivarianismo, de chavismo, de mais um monte de m.... que os caras falam".
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