• O voto distrital aproxima o eleitor dos políticos e barateia campanhas. A boa noticia: avançou no Senado a proposta que institui nas eleições para vereador
Eduardo Gonçalves e Gabriel Castro - Época
Cada vez que os brasileiros saem às ruas para demonstrar sua insatisfação com a maneira como o país é conduzido, políticos sacam da manga o tema da reforma política como a panaceia para os problemas nacionais. Foi assim em 2013, quando o governo chegou a propor um desarrazoado plebiscito sobre a questão. E assim em 2015. Dada a complexidade do tema, o que é apresentado como remédio com frequência atende apenas aos interesses dos próprios políticos. O PT, por exemplo, prega o flm do financiamento privado de campanha e o voto em lista fechada: duas propostas que favoreceriam a sigla acima de tudo. Já o PMDB tenta substituir o sistema proporcional vigente por um que favorece lideranças tradicionais — o "distritão". As discussões nas ruas e na internet mostram que cresce o número de pessoas comuns atentas para o assunto, o que é positivo, uma vez que a reforma deve mesmo ocorrer em um futuro próximo. O primeiro passo foi dado nesta semana. E foi um passo alvissareiro: foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado um projeto de lei do senador José Serra (PSDB-SP) que institui o voto distrital nas eleições para vereador em cidades com mais de 200000 eleitores.
Há dois "sabores" de voto distrital, o puro e o misto. No primeiro, elegem-se apenas os candidatos mais votados em cada distrito. No segundo, metade das vagas é preenchida por políticos de uma lista preordenada por cada partido.
Nos dois casos, há um ganho de racionalidade: o voto distrital aproxima os políticos dos eleitores e barateia as campanhas. Mas os ganhos são maiores no sistema puro. "A lista, assim como o distritão, é uma forma de salvaguardar o poder dos caciques partidários", diz o cientista político Luiz Felipe D"Avila, um defensor ativo do voto distrital.
O projeto de José Serra institui o modelo puro na eleição de vereadores. Para entender seu efeito, tome-se como exemplo a capital paulista. As 55 cadeiras do Legislativo seriam atribuídas a 55 distritos eleitorais de tamanho semelhante. Em vez de analisar as propostas de mais de 1000 candidatos, o eleitor teria de decidir apenas entre aqueles que representam seu distrito. Diz o cientista político Paulo Kramer, professor da Universidade de Brasília (UnB): "A possibilidade de cobrança é muito maior.
Afinal, o deputado reside no distrito. Se não corresponder às expectativas, não terá onde buscar voto nas próximas eleições". Quanto aos políticos, eles não mais se digladiariam pela atenção dos 8,8 milhões de eleitores paulistanos. A campanha seria voltada para grupos de cerca de 160 000 pessoas, o que derruba os seus custos.
O projeto de lei 25/2015 levou menos de três meses para ser submetido a votação na CCJ. Foi aprovado por 15 votos a 3 na última quarta-feira, em caráter terminativo — ou seja, será encaminhado diretamente à Câmara, sem a necessidade de passar pelo crivo do plenário se não houver recurso contra o texto até esta semana (o recurso que obriga a apreciação pelo plenário tem de ser apresentado por ao menos nove senadores). Foram contrários à proposta apenas os petistas José Pimentel (CE) e Humberto Costa (PE), além de Marcelo Crivella (PRB-RJ). A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) não seguiu a orientação do partido e votou pela aprovação. O apoio mais significativo partiu do relator do tema. o líder do PMDB no Senado. Eunício de Oliveira. "Temos com o Brasil o compromisso de não ir para as eleições de 2016 com o mesmo sistema eleitoral", afirmou. De fato, se for sancionado até outubro, o novo sistema já valerá para a disputa do ano que vem. O próprio Serra, porém, reconhece que a luta na Câmara não será tão simples. "O esforço vai ser bem maior", afirma. "Mas, como no Senado a proposta foi aprovada a jato, os deputados terão tempo para debater."
Na Câmara, o projeto deve ser apensado às propostas de reforma política que estão sendo discutidas desde fevereiro em uma comissão especial, e lá deve sofrer alterações. O presidente do colegiado, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já deixou claro que se opõe à medida. O relator da comissão, Marcelo Castro (PMDB-PI), também não crê que a proposta passe como chegou do Senado. "A comissão está dividida entre distritão e distrital misto. É difícil que se aceite o que veio, ou seja, o distrital puro", diz Castro. O projeto de Serra é visto como ponta de lança para a aplicação do voto distrital nos pleitos para os legislativos estadual e federal, daí a previsão de um debate acirrado. Mas o debate, desta vez, está no trilho certo.
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