- Valor Econômico
• Dilma se deu conta de que é real o risco de perder o mandato
Emissários da presidente Dilma Rousseff fizeram sondagens na sociedade civil de nomes para seu futuro ministério. Não encontraram muita receptividade. Se for concretizada, Dilma fará a reforma que deveria ter feito ao tomar posse, em janeiro, quando executou apenas uma mudança realmente importante, a de Guido Mantega por Joaquim Levy na Fazenda. Não será fácil, conforme demonstra o pouco entusiasmo de quem já foi abordado para a empreitada.
A nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o Ministério das Relações Exteriores foi seriamente discutida no governo. Lula brecou as conversas. Em vez de sentir júbilo por ser chamado para ajudar numa hora de dificuldades, considerou o convite um desejo de alguns de mantê-lo longe do país. Quem primeiro arruína o príncipe é sua corte, já dizia quem entende do riscado. O governo Dilma sofre do mal da falta de credibilidade.
Tem algo errado quando o governo fala em mudar o ministério para escalar nomes com influência no Congresso. Esse é o modelo do atual ministério. Quem mais do que Gilberto Kassab (Cidades) pode arrecadar votos no PSD? O mesmo serve para Armando Monteiro (Indústria e Comércio) em relação ao PTB, Eliseu Padilha (dublê de secretário da Aviação Civil e coordenador político), no PMDB, e assim sucessivamente. Não deu certo. Ponto. Nominalmente o governo tem cerca de 400 votos na Câmara, mas deve soltar foguetes toda vez que o painel marcar 150.
Numa reunião com seu colégio de vice-líderes, o deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, foi surpreendido quando o deputado Hugo Leal (Pros-RJ) sugeriu a renúncia de todos, pois estava mais que provado que não tinham voz nenhuma de comando sobre as bancadas. Guimarães percebeu que a proposta, levada às últimas consequências, implicaria na própria renúncia. Irônico, Leal esclareceu que não, os vice-líderes é que estavam sendo incompetentes para conseguir os votos.
Houve época em que a saída de Aloizio Mercadante (Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça) era garantia de arrefecimento do ânimo belicoso das bancadas governistas. Já não é mais. Ajuda, pois retira o argumento de quem acha que a Operação Lava-Jato tem o dedo de Cardozo e daqueles para os quais Mercadante é o sabotador por trás das tentativas de Michel Temer para recompor a base do governo com verbas do orçamento e cargos. Mas não resolve. Dilma perdeu o bonde da reforma ministerial.
Nem tudo é notícia ruim para a presidente. A articulação tentada com o presidente do Senado, Renan Calheiros, pode render algum alívio. Menos pela atuação do Palácio do Planalto e mais pelas questões internas do PMDB. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, nunca fez o estilo do partido, mais afeito a resolver suas pendências na conversa que no confronto. Não é dos usos e costumes do PMDB rifar os seus, mas também ninguém vai se suicidar por causa de Eduardo Cunha, um deputado sempre associado a histórias mal explicadas.
A velha guarda do PMDB aconselhou Renan a se distanciar de Cunha, pois assim como há evidências concretas de envolvimento do presidente da Câmara na Lava-Jato, o nome do presidente do Senado foi citado apenas de passagem, até agora. Se o procurador-geral Rodrigo Janot estivesse efetivamente empenhado em perseguir Renan e Cunha, em vez de mandar investigar teria denunciado os dois diretamente. Cunha é um risco que os caciques do PMDB não estão dispostos a correr. O lobista Fernando Baiano, apresentado como o representante do PMDB no esquema da Lava-Jato, é desconhecido da grande maioria do partido. Sua área de atuação era o Rio. E o estrago maior de sua eventual delação premiada deve ser no PMDB do Rio.
Para os pemedebistas mais experientes, ameaçado pela Lava-Jato, Cunha quer explodir o quarteirão e levar quem puder junto. Tarefa facilitada porque ajudou umas cinco dezenas de deputados na campanha eleitoral e porque é grande o número de deputados novatos na Câmara usados como "inocentes úteis" na guerra que declarou ao Palácio do Planalto.
O que apareceu sobre Renan na Lava-Jato, até agora, é frágil. Pode sair algo mais sério? Sempre pode. A regra do jogo é que cada qual pague o que deve no cartório. Tenta-se convencer Renan de duas coisas: o governo não está por trás das acusações contra ele e Cunha na Lava-Jato, operação que caminha com as próprias pernas a partir de Curitiba, e a classe política não pode ser responsável pelo aumento do déficit público. Na reunião da coordenação política no Palácio da Alvorada, no domingo, Temer afirmou que a pauta bomba da Câmara pode transformar o país "numa Grécia".
O ex-senador paraibano Ney Suassuna costumava dizer que governo é como cobra, até morta mete medo. Dilma tem a caneta, nomeações e verbas. E carga para lançar ao mar: seu ministério. Mas não é do seu feitio montar no cavalo que passa selado. A melhor aposta hoje na presidente é que Dilma pode até chegar ao fim do mandato, pelas tabelas, como José Sarney (1985-1990), em dieta de feijão com arroz.
Na abertura da reunião do Alvorada, Temer fez um discurso duro contra a fofoca de que conspira contra Dilma. O discurso do vice, semana passada, foi previamente combinado com os caciques pemedebistas e tinha por objetivo fazer Dilma entender que está isolada e precisa mudar. Quase um ultimato.
O vice está no centro do palco. Dilma se deu conta do risco que corre no Congresso, por isso correu para defender a legitimidade de seu mandato. Depois de dar o recado em Brasília, Temer foi para São Paulo, onde se encontrou com o governador Geraldo Alckmin, aspirante à sucessão de Dilma para quem a corrida sucessória deve seguir seu curso até 2018, em vez da antecipação das eleições defendida por seu colega de PSDB Aécio Neves. Pouco antes esteve nos EUA, para mostrar que é confiável aos mercados. Queira ou não, seu nome está posto. A sorte de Dilma é que ninguém tem uma fórmula para a saída da crise. Pelo menos até os protestos do dia 16.
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