• Investidor quer ver rumo e velocidade das reformas no país
- Valor Econômico
O governo interino de Michel Temer corre o sério risco de dar um tiro no pé, se anunciar as medidas de ajuste fiscal a prestação depois de apresentar - à vista - a nova meta fiscal para este ano, um déficit de R$ 170,5 bilhões para o governo central. A probabilidade de ocorrer um anúncio parcelado tornou-se crescente sobretudo com o adiamento da divulgação das decisões fiscais de hoje para amanhã, terça-feira, às 11 horas, como informou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles ao final da reunião, sábado, em São Paulo, com o presidente interino e o ministro do Planejamento, Romero Jucá.
Ficou decidido que, nesta segunda, Temer apresentará ao Congresso as propostas do governo para reorientar as contas públicas. Na terça, Michel Temer faz uma exposição ao mercado e à sociedade. É descabida a suposição de que um encontro de tal relevância no parlamento não tenha seu conteúdo disseminado a toque de caixa ainda hoje para além da Praça dos Três Poderes, em Brasília.
A demora do governo em anunciar o remédio depois de escancarar a doença pode comprometer o efeito positivo das propostas. Na sexta-feira, um gestor de investidores, baseado em Nova York, disse à coluna em condição de anonimato que alguns clientes passaram a questionar, nos últimos dias, se Temer não estaria cedendo mais do que deveria aos apelos de descontentes. A expectativa com medidas de ajuste fiscal é justificada, inclusive, pelo elevado prestígio da equipe econômica. Todos altamente qualificados.
O frustrado anúncio de medidas na sexta, que os mercados esperavam que acompanhassem a estrondosa meta fiscal, acabou atenuado por surpresas. Uma delas foi o destaque dado pelo ministro Meirelles ao fato de a execução do Orçamento deste ano não depender de aprovação de medidas legislativas.
Também surpreendeu a pronta reação do ex-ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, aos dados apresentados pela equipe do governo interino. A meta fiscal para este ano é quase o dobro dos R$ 96,65 bilhões previstos pelo governo da presidente afastada Dilma Rousseff.
"Destacar a independência da execução do Orçamento em relação ao Congresso foi uma atitude corajosa, mas talvez contraproducente por parte de um governo que é interino porque o Congresso aprovou o afastamento provisório da presidente", comenta o gestor de Nova York à coluna, lembrando que o Senado tem a prerrogativa de julgar o processo de impeachment da presidente por denúncias de crime de responsabilidade.
"O governo deve trabalhar para ter, no Congresso, um aliado. Não deve dispensá-lo. Democracias não se vangloriam por descartar decisões de um parlamento", avalia o gestor.
O projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) revisto pela equipe do governo interino é um dos mais importantes a chegar ao Congresso na semana de 23 a 27 de maio, exatamente por alterar a meta de resultado primário deste ano. O projeto deverá ser votado amanhã. É intenção do relator, Dagoberto Nogueira (PDT-MS), que a matéria seja votada hoje na Comissão Mista do Orçamento (CMO). Na terça, a votação é no Plenário do Congresso.
"A aprovação desse projeto é fundamental para não haver risco de interrupção de serviços básicos pelo governo, além de indicar ao mercado a real situação das contas públicas", pondera o economista Gesner Oliveira, sócio diretor da GO Associados. Ele chama atenção para o cuidado demonstrado pelo governo interino no trato dos números por entender a importância de se recuperar a credibilidade na condução da política fiscal neste momento, ainda que a situação do quadro seja alarmante.
Eduardo Castro, diretor de Investimentos da Santander Asset Management, em entrevista à coluna, disse que em todas as avaliações sobre reformas no Brasil feitas por investidores estrangeiros há um alerta para a "execução" dessas reformas.
"O Brasil parece se preparar para um momento único considerando a excelência da equipe. Não há retoques a fazer nos escolhidos para as secretarias do Ministério da Fazenda, de Ilan Goldfajn para o comando do Banco Central, Maria Silvia Bastos para o BNDES e a confirmação de Pedro Parente para a presidência da Petrobras ", afirma Castro que vê, contudo, investidores com um pé atrás quando são informados de que praticamente todas as reformas são representadas por Proposta de Emenda Constitucional (PEC). E elas dependem do Congresso.
O diretor da Santander Asset atribui 70% da recuperação dos preços dos ativos financeiros do início deste ano à melhora do cenário externo. A aprovação pela Câmara dos Deputados da abertura do processo de impeachment de Dilma respondeu por 30%. "Os investidores estrangeiros já estavam mais otimistas com o Brasil pelo fato de o país estar no grupo dos emergentes. A definição da nova equipe econômica e o andamento do governo interino devem melhorar a posição dos estrangeiros movidos, desta vez, por questões locais."
Castro explica que não houve movimentos adicionais nos mercados quando Henrique Meirelles concedeu sua primeira entrevista como ministro da Fazenda, há poucos dias. "Por essa razão é razoável inferir que investidores estrangeiros - e também os locais - talvez não abram novas posições até que existam evidências de que a execução do Orçamento caminha na direção e na velocidade esperadas".
A excelência da equipe econômica de Michel Temer também é reconhecida pelo Eurasia Group. Em relatório, a consultoria mantém sua opinião de que o progresso no ajuste fiscal tende a ser modesto, dada as resistências políticas no Congresso. Mas avalia que, em compensação, a definição dos comandos do BNDES e da Petrobras reforça a convicção de seus analistas quanto a avanços na participação do setor privado em infraestrutura. "O anúncio da equipe e dos presidentes das estatais sugerem que Michel Temer está prestes a embarcar em um impulso reformista ambicioso. O progresso não será uniforme, mas será expressivo o suficiente para mantermos a perspectiva 'positiva' para o Brasil no curto prazo", afirma o Eurasia.
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