- O Estado de S. Paulo
Um terremoto se abateu sobre a política brasileira, e alguém já usou a imagem da guilhotina para identificar o perigo que ronda o pescoço da quase unanimidade da elite política brasileira.
Não é a Revolução Francesa, por certo, mas a classe política, salvo exceções importantes, está ferida de morte em virtude das descobertas da Operação Lava Jato. Nesse caso, não é uma morte súbita, mas uma agonia que pode durar anos ao sabor de investigações, denuncias e processos de crimes praticados no financiamento de campanhas eleitorais, ao fim dos quais o resultado, quase certamente, será a condenação, a prisão e o banimento da vida pública.
Tão grande é o medo do ostracismo - como os cidadãos da Grécia antiga designavam processos similares menos radicais - que políticos das mais diferentes matizes ideológicas estão confundindo a sua situação com uma derrocada da Nação, e não propriamente com a derrocada de uma cultura política e de um modelo de condução da vida pública que comprometem a qualidade da democracia.
O montante assombroso de recursos públicos desviados de sua finalidade, ao comprometer políticas públicas vitais, exemplifica bem isso, tendo gerado descrença, desconfiança e raiva dos cidadãos, não só de políticos, mas também de instituições que deveriam representá-los e garantir seus direitos.
Agora surgem as exortações de que, se não quisermos o pior – o risco de outsiders, fascismo ou frustração igual a da Operação Mãos Limpas -, temos de “salvar a política”. Mas embora seja verdade que a subordinação dos interesses públicos aos privados tenha ido tão longe que pareça pelas delações de executivos da Odebrecht que as empreiteiras tomaram de assalto o Estado, não fica claro se a demanda de salvação da política não é apenas um atalho para a salvação dos próprios políticos que nos meteram no enrosco atual.
A salvação da política é algo sério e remete à reforma política. Em primeiro lugar, a mudança das regras de financiamento de campanhas eleitorais que, até recentemente, foram fonte de corrupção; além disso, o sistema de representação política e as normas de organização dos partidos. O País não aguenta mais um sistema de representação que desvincula representantes de representados, e menos ainda um quadro de fragmentação partidária que prejudica a governabilidade e pouco significa para os eleitores. Não precisamos jogar os partidos no lixo, por certo, mas os partidos precisam tirar a política do lixo.
Até agora, os que rebaixaram a política ao seu nível atual não pediram desculpas ao País, nem apresentaram propostas capazes de enfrentar o problema, mas, os que têm culpa no cartório precisam pagar por seus feitos.
*É professor de ciência política na USP
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