quinta-feira, 23 de outubro de 2025

Avanço e desafio da educação, por Míriam Leitão

O Globo

As escolas não podem ficar de fora da revolução tecnológica com a IA, considera presidente da Fundação Lemann

Antes da pandemia, o índice de crianças alfabetizadas aos 7 anos era 50%. Em 2021, caiu para 31%. A partir de 2023, começa o trabalho para reversão desse quadro. Em 2024, o percentual chegou a 60% das crianças alfabetizadas no segundo ano, com 7 anos. Em 2027, a meta é 80%. “No fim da década, chegaremos a 100%”. Quem conta é o presidente da Fundação Lemann, Denis Mizne, que atua na área de educação desde 2014. Ele diz que, apesar dos números que nos afligem, há boas novidades na área.

— Esse vai ser o primeiro ganho de aprendizagem. Os ganhos do Paulo Renato (ministro do governo Fernando Henrique) foram os de acesso. Depois, se seguiram os desafios de medir com o Ideb, de pagar mais, com o Fundeb, e de ampliar o acesso para o ensino infantil. Temos o Ceará, mas não temos uma história de sucesso de aprendizagem em nível nacional. Um país que garante que toda criança chegou na escola, dois anos depois, está alfabetizada isso já é um ganho enorme. Nosso próximo foco é o Ensino Fundamental 2.

A Fundação Lemann atua em conexão com o setor público, independentemente da tendência política do governador ou prefeito. Mizne diz que o principal foco da fundação é erradicar o analfabetismo escolar até o fim da década.

— O que eu tenho sentido nos governadores é entusiasmo, com esse compromisso e nesse modelo de atuação com a sociedade civil.

O Brasil teve outros avanços importantes na educação ao longo das décadas, e ele enumera:

— Ter escola, merenda, professor, livro, transporte escolar e um currículo de base nacional. Hoje, o país tem quase 95% das crianças de 4 anos numa escola pública perto de sua casa. E isso não é trivial. O país fez um trabalho importante, mas a qualidade ficou para trás.

O que outros países têm feito de certo? Denis Mizne tem visitado muitos países em busca destes pontos de sucesso, estudando casos tradicionais como Finlândia e Coreia, mas também Singapura. Recentemente, esteve na Índia.

— A primeira coisa que nos demos conta é que todo país no mundo que deu um salto teve lideranças fanáticas para fazer da educação a mola propulsora. Em Singapura, o primeiro-ministro recebe diretores de escola para dizer que se o país chegou onde chegou foi pela educação. Portanto, cada um que atingiu esse posto de liderança ouve do líder do país: ‘eu conto com você’.

Pode-se argumentar olhando outros casos que o sistema educacional brasileiro é muito grande. E é mesmo. Mizne repete os números de cabeça: o Brasil tem 140 mil escolas, dois milhões de professores, 50 milhões de alunos. Isso é muito? É. Mas cabe em Uttar Pradesh, estado da Índia.

— Estive lá, temos feito uma colaboração muito forte com a Índia desde então. Eles utilizam a tecnologia de forma muito inteligente. Assim como criamos o Pix, uma tecnologia digital aberta, pública, podemos criar isso para gestão de matrícula, formação de professores, acompanhamento dos diretores. A Índia tem usado essas ferramentas e também a inteligência artificial como apoio para professores na escala deles.

Mizne disse que, no Brasil, o caso de sucesso de Sobral se espalha e hoje está em 18 estados. Em 2005, o município tinha todas as crianças alfabetizadas. Depois isso foi espalhado para todo o Ceará.

— O governador poderia dizer: ‘Não é meu problema, tenho que cuidar do ensino médio’. Mas, sem um bom ensino fundamental, não há qualidade no ensino médio. Hoje não é só Sobral. Tem Teresina, Branquinha em Alagoas, Vargem Grande no Maranhão ... Já são 18 estados com políticas de alfabetização inspiradas no Ceará, e isso está mudando os dados do Brasil.

Mizne, que eu entrevistei na GloboNews, olha a educação no longo prazo e, por isso, alerta para a necessidade da inclusão da inteligência artificial como ferramenta essencial.

—Estamos no meio de uma revolução tecnológica que é a IA. As últimas duas, o computador pessoal e a internet, a estratégia foi ficar fora. No Brasil, 30% das escolas hoje têm um computador para dez alunos. Outras têm menos. Na internet, demos um salto em conexão, mas as escolas não. O aluno não tem computador, o aluno não está conectado, mas a criança tem um celular, e está conectada. Mas a escola é o lugar de mediação. Não podemos perder a chance de fazer a escola ser um grande mediador da tecnologia, e não deixá-la fora da tecnologia.

 

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