quinta-feira, 30 de outubro de 2025

Messias, guinada conservadora no STF, por Carolina Brígido

O Estado de S. Paulo

Tribunal tomou decisões essenciais pelos direitos de parcelas vulneráveis; hoje, evita o tema

Aprovável chegada de Jorge Messias ao Supremo Tribunal Federal (STF) engrossa a crescente bancada conservadora da Corte. Se nas décadas passadas o plenário tomou decisões de vanguarda a favor de grupos minoritários da sociedade, hoje esse cenário é cada dia menos provável de se repetir.

Um termômetro da mudança dos ventos é o julgamento a conta-gotas da ação que descriminaliza o aborto até a 12ª semana de gestação. Rosa Weber votou em 2023 e Luís Roberto Barroso votou há duas semanas. Um pedido de vista jogou a discussão para um futuro distante.

No STF, há quem considere que o momento não seja propício para se debater o aborto. Há também quem acredite que essa não seja uma tarefa para o Judiciário. Uma minoria até gostaria de impulsionar a votação, mas não encontra apoio interno para por o plano em prática.

Não foi assim nas décadas passadas. Em 2011, o STF legitimou as uniões homoafetivas como núcleos familiares por unanimidade. No ano seguinte, legalizou o aborto para gravidez de feto anencéfalo por oito votos a dois.

A mudança na formação do tribunal, com a aposentadoria de ministros de perfil progressista, ajuda a entender a guinada conservadora dos últimos anos. Do time vencedor da votação sobre a anencefalia, cinco se aposentaram: Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Ayres Britto, Rosa Weber e Joaquim Barbosa. A saída de Barroso representa mais uma baixa no grupo progressista.

Por outro lado, chegaram ao STF ministros de perfil conservador: Kassio Nunes Marques, André Mendonça, Cristiano Zanin e Flávio Dino. Um dos resultados da nova composição é a fuga de julgamentos espinhosos.

Outros fatores contribuem para esse fenômeno. Um deles é evitar atrito com o Congresso em um momento delicado para as relações institucionais. O outro é tentar manter o fogo baixo diante dos ataques sofridos pelo tribunal – especialmente, em meio ao julgamento sobre a tentativa de golpe de Estado.

A iminente nomeação de Jorge Messias traz a expectativa de mais um voto conservador para a Corte. Frequentador da Igreja Batista, ele conta com o apoio da bancada evangélica no Congresso. Mas costuma demonstrar ponderação em temas de costumes. Em manifestação ao STF sobre o ensino de gênero, disse que conteúdos antidiscriminatórios devem “perpassar toda a base curricular nacional”.

Ou seja: apesar de ser conservador, Messias é ideologicamente alinhado com a esquerda, e não com os evangélicos do entorno de Jair Bolsonaro. Mas o novo ministro do STF não vai precisar mostrar logo de cara como vai votar em temas de costumes, porque não há nenhum julgamento desse tipo agendado. E nem haverá tão cedo. •

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