O Estado de S. Paulo
Tribunal tomou decisões essenciais pelos direitos de parcelas vulneráveis; hoje, evita o tema
Aprovável chegada de Jorge Messias ao Supremo
Tribunal Federal (STF) engrossa a crescente bancada conservadora da Corte. Se
nas décadas passadas o plenário tomou decisões de vanguarda a favor de grupos
minoritários da sociedade, hoje esse cenário é cada dia menos provável de se
repetir.
Um termômetro da mudança dos ventos é o
julgamento a conta-gotas da ação que descriminaliza o aborto até a 12ª semana
de gestação. Rosa Weber votou em 2023 e Luís Roberto Barroso votou há duas
semanas. Um pedido de vista jogou a discussão para um futuro distante.
No STF, há quem considere que o momento não
seja propício para se debater o aborto. Há também quem acredite que essa não
seja uma tarefa para o Judiciário. Uma minoria até gostaria de impulsionar a
votação, mas não encontra apoio interno para por o plano em prática.
Não foi assim nas décadas passadas. Em 2011, o STF legitimou as uniões homoafetivas como núcleos familiares por unanimidade. No ano seguinte, legalizou o aborto para gravidez de feto anencéfalo por oito votos a dois.
A mudança na formação do tribunal, com a aposentadoria de ministros de perfil progressista, ajuda a entender a guinada conservadora dos últimos anos. Do time vencedor da votação sobre a anencefalia, cinco se aposentaram: Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Ayres Britto, Rosa Weber e Joaquim Barbosa. A saída de Barroso representa mais uma baixa no grupo progressista.
Por outro lado, chegaram ao STF ministros de perfil conservador: Kassio Nunes Marques, André Mendonça, Cristiano Zanin e Flávio Dino. Um dos resultados da nova composição é a fuga de julgamentos espinhosos.
Outros fatores contribuem para esse fenômeno.
Um deles é evitar atrito com o Congresso em um momento delicado para as
relações institucionais. O outro é tentar manter o fogo baixo diante dos
ataques sofridos pelo tribunal – especialmente, em meio ao julgamento sobre a
tentativa de golpe de Estado.
A iminente nomeação de Jorge Messias traz a
expectativa de mais um voto conservador para a Corte. Frequentador da Igreja
Batista, ele conta com o apoio da bancada evangélica no Congresso. Mas costuma
demonstrar ponderação em temas de costumes. Em manifestação ao STF sobre o
ensino de gênero, disse que conteúdos antidiscriminatórios devem “perpassar
toda a base curricular nacional”.
Ou seja: apesar de ser conservador, Messias é ideologicamente alinhado com a esquerda, e não com os evangélicos do entorno de Jair Bolsonaro. Mas o novo ministro do STF não vai precisar mostrar logo de cara como vai votar em temas de costumes, porque não há nenhum julgamento desse tipo agendado. E nem haverá tão cedo. •

Nenhum comentário:
Postar um comentário