A deputada venezuelana María Corina Machado durante evento em Washington.
Os Estados membros acordam que a sessão em que a deputada oposicionista Corina Machado de manifestaria será privada
Eva Saiz
WASHINGTON - A Venezuela impôs nesta sexta-feira, de novo, sua ascendência na Organização de Estados Americanos (OEA) sobre os países afins a ALBA e os indispensáveis estados caribenhos. Dessa vez, o Governo de Nicolás Maduro conseguiu silenciar o discurso da deputada opositora María Corina Machado ante o Conselho Permanente da OEA ao forçar, com seus votos, que a sessão se celebre a porta fechada. Com esta manobra, o oficialismo venezuelano trata de desvirtuar a legitimação da dissidência ao Governo do presidente Maduro ante a instituição e impedir que a reunião se converta em uma caixa de ressonância das denúncias contra o chavismo.
“Esta é a mesma censura, é a censura que nos impôs um regime na Venezuela e que seu braço censurador chega até aqui”, assinalou Machado à imprensa antes de que se iniciasse a reunião, quando já parecia iminente que a Venezuela conseguiria que a sessão fosse privada, algo que conseguiu aglutinando 22 votos a favor (bloco do Alba e afins –Brasil, Argentina e Uruguai-, 10 na contramão e uma abstenção).
A intervenção da deputada, que depois da prisão de Leopoldo López surgiu como líder moral da oposição venezuelana, unicamente poderá ser escutada de maneira imediata pelos Estados membros, ao não estar a imprensa nem se oferecer através do streaming da OEA, no entanto, o discurso de Machado, realmente, não será dirigido aos países que deram as costas à dissidência, por meio da própria OEA e de outros organismos regionais como o Mercosul e a Unasul, senão aos cidadãos latino-americanos.
De acordo com o que sugeriu nesta quinta-feira durante uma conferência no CSIS, Machado tem previsto apelar ao “apoio e a confiança” que lhe demonstraram os cidadãos venezuelanos e do resto do continente para pôr em evidência a indiferença de seus governantes ante a “repressão e tortura próprias de um Estado policial” exercidas pelas autoridades chavistas. Para Machado, em seu país não só está em jogo a democracia da Venezuela senão a de todo o hemisfério. “Não é um tema de confiança na OEA, temos confiança nos latino-americanos, nos povos das Américas que são os que, finalmente, farão seus Governos saberem que devem acompanhar no fortalecimento da democracia na região”, advertiu.
A Venezuela já conseguiu impor a incomum modalidade de sessão privada –a priori, as reuniões do Conselho Permanente são públicas- durante o debate, há duas semanas, para abordar a posição da OEA ante a crise nesse país. Então, os Estados membros aprovaram, só com a oposição dos EUA, Canadá e Panamá, uma decepcionante declaração que apoiava de maneira velada o labor de Maduro à hora de lutar com os protestos, eludia uma menção expressa à oposição e legitimava o foro de diálogo impulsionado pelo Governo e repudiado pela oposição.
Essa resolução e a aceitação da visita de chanceleres a Caracas proposta pela Unasul à que se empenharam nestes dias vários estados membros para impedir, sem sucesso, a presença de Machado no Conselho Permanente, requisitada pelo Panamá. Ainda que consiga calar a deputada, a Venezuela ainda contempla mais estratégias para enfraquecer o impacto do discurso da opositora. Dá-se por fato, que seus votos consigam que não se debata o primeiro ponto da ordem do dia que tem previsto discutir a situação na Venezuela e onde Panamá pensava outorgar a palavra a Machado.
Cabe a possibilidade de que o Panamá lhe permita falar durante o ponto do dia que trata sobre a comemoração do Dia Internacional da Mulher. Se o fizer, os mesmos países que votaram por que a sessão seja privada é muito provável que abandonassem a sala. Uma medida que também levaria a cabo se o embaixador panamenho esperar o turno de outros assuntos, ao final do Conselho, um artifício que, há pouco, se repetiu por motivo da visita do ex-presidente do Paraguai, Federico Franco.
Machado, no entanto, não abandonará a sede da OEA sem pronunciar um discurso no que, pelas declarações desta quinta-feira, apelará à Carta Democrática Interamericana. “Qualquer pessoa que objetivamente analise a situação do meu país se dá conta de que a Carta Democrática está sendo violada pela Venezuela e pelos demais países ao não a botar em prática, ao não a respeitar e a defender como é seu compromisso”, advertiu a deputada. No entanto, nem o secretário geral da OEA, José Miguel Insulza, nem sequer Panamá, EUA ou Canadá, os três países mais críticos com a infração das liberdades civis por parte do Governo de Maduro, consideram que se deem os requisitos pela força de um governo democraticamente constituído, a ruptura da ordem democrática e a alteração da ordem constitucional que afeta gravemente a ordem democrática- para invocar um instrumento que contempla a suspensão de um país da OEA.
Em público ou em privado, Machado teve a oportunidade, nesta sexta-feira, não só de invocar ante a organização “uma versão diferente da do regime, a versão do povo”, como ela mesma afirma, senão de dar visibilidade internacional a uma versão da realidade que se vive em Venezuela. Um gesto que, para a deputada, tem mais transcendência que o efeito mobilizador que possa provocar entre os membros da OEA, de cuja efetividade duvida, e que, uma vez mais, tem evidenciado a fratura que reina em seu seio e de sua incapacidade para influenciar na resolução de um conflito que já resultou em mais de 30 mortes.
Fonte: El Pais
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