• Diferenças entre Levy e Barbosa não devem surpreender
- Valor Econômico
Pode-se atribuir a vários motivos o adiamento do anúncio dos nomes dos ministros da área econômica do novo mandato de Dilma Rousseff, previsto para a última sexta-feira. Mas não é razoável dizer que ela hesitou depois de feitas as escolhas. Dilma nem tinha porque "amarelar", como foi especulado. É visível o dedo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na formação da equipe. Mas a presidente e o PT, embora não digam, também saíram das eleições presidenciais de outubro convencidos de que precisavam fazer uma aliança para acalmar um setor refratário a seu governo. O resto é discurso fácil contra o setor financeiro.
A presidente não gosta de vazamentos e pode ter se aborrecido quando os nomes de Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Alexandre Tombini (Banco Central) foram divulgados na sexta-feira. Pode ser. Mas não foi só. Havia também outros motivos para o adiamento. Um deles é que ainda tem notícia ruim sobre a economia a caminho. Outro: os novos ministros precisam de tempo para preparar medidas que devem ser apresentadas junto com a nova equipe. Dilma também queria falar com o PT. O partido realiza um encontro nacional, neste fim de semana, em Fortaleza (CE).
Salvo declarações feitas para a plateia de um ou outro dirigente, o PT não deve constituir problema para a nova equipe econômica. A situação atual é parecida com o que ocorreu em 2003, quando o ex-presidente Lula assumiu para o primeiro mandato, mas nem de longe exibe a mesma tensão. À época, o ajuste conduzido por Antonio Palocci acabou no cisma partidário que levou à criação do PSOL. Visto na perspectiva do PT, o arrocho de Palocci valeu a pena porque criou as condições necessárias para que o ex-presidente Lula da Silva, já a partir do segundo ano de mandato, esculpisse a marca social de seu governo. Inflação baixa e resgate da conta social lhe garantiram a reeleição, em 2006, apesar do escândalo da compra de votos no Congresso, o mensalão.
O roteiro é o mesmo. A inflexão à ortodoxia do governo Dilma pode dar problemas internos, mas deve ser assimilada, especialmente se projetar a perspectiva de que a presidente possa entregar resultados positivos em seus dois últimos anos de governo e fazer a transição para um novo governo do PT. Esse é o horizonte também de Lula, que fala em ser candidato em 2018. A sério, segundo ministros do atual governo que se mantêm próximos do ex-presidente.
Apesar do discurso de campanha, a cúpula do PT sempre soube que 2015 seria um ano para fazer ajustes na economia. O que o partido espera é que seja feito com o mínimo de dor. A expectativa petista é de um ajuste gradual, sem grandes impactos sobre emprego, renda e salários.
O comportamento de Joaquim Levy durante as eleições também conta a seu favor no PT. Ao contrário de Marcos Lisboa, outro ex-secretário de Antonio Palocci no Ministério da Fazenda, Levy não foi visto fazendo campanha para outros candidatos. Muito menos para Aécio Neves (PSDB). Sempre haverá alguém para reclamar, mas uma boa parte do PT também se queixava do atual secretário do Tesouro, Arno Augustin, sem que isso tivesse algum peso sobre a decisão de Dilma de mantê-lo no cargo. Não é possível reduzir o PT a esta ou aquela facção. O partido é bem mais complexo que isso.
A nomeação de Joaquim Levy para a Fazenda preenche os requisitos que eram reclamados pelo mercado financeiro, sem que Dilma tenha que se justificar por ter indicado um banqueiro, como teria se houvesse escolhido o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, um dos nomes preferidos do ex-presidente Lula. Outra vantagem comparativa de Levy é o conhecimento dos meandros da máquina pública. O economista foi o secretário do Tesouro, na gestão de Palocci, e da Fazenda do governo de Sérgio Cabral, no Rio.
Levy não deixou boas lembranças à bancada do PT na Câmara de quando era secretário do Tesouro. Enquanto Palocci fazia cortes com um sorriso, o secretário passava a faca no Orçamento de cara feia. A bancada está calada. Nada que o próprio ministro escolhido não possa superar. Problema maior talvez sejam as diferenças do triunvirato. Não será surpresa, no PT, se Levy e Barbosa tiverem diferenças, ao longo do governo. Nem se Levy e Tombini se juntarem em oposição ao ministro do Planejamento. A arbitragem será da presidente. Só então será possível avaliar o grau de envolvimento de Dilma Rousseff com a mudança da matriz macroeconômica de seu governo.
A reação do PT à escolha da senadora Katia Abreu (PMDB-TO) é bom exemplo do pragmatismo partidário no século 21. O que o PT espera dela é a manutenção do financiamento da agricultura familiar e grandes safras para a exportação de commodities. Se a reforma agrária não andou no governo da presidente Dilma, não é porque o agronegócio tomou conta do Ministério da Agricultura. Aliás, reforma agrária é assunto do Ministério do Desenvolvimento Agrário, onde atualmente tem assento um dos ministros que devem integrar o núcleo duro do governo Dilma: Miguel Rossetto, cotado para a Secretaria Geral da Presidência da República. Não bastasse isso, a nomeação de Katia abrirá vaga no Senado para seu suplente, Donizeti Nogueira, que é do PT. A reação a Katia Abreu é maior no PMDB, que a considera uma escolha da cota da presidente, e do agronegócio de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo.
O líder da bancada do PMDB e candidato favorito a presidente da Câmara, Eduardo Cunha, tem se movimentado também nos bastidores do governo. Recentemente, reuniu-se com o ministro Paulo Bernardo (Comunicações). Se conseguir compor com o governo, que desconfia dele, será praticamente aclamado. Na superfície, o PT fala nas candidaturas de Marco Maia (RS) e Arlindo Chinaglia (SP). Mas se o partido for efetivamente para a disputa, deve emergir o nome de José Guimarães (CE), hoje talvez o nome do PT de mais fácil trânsito entre os aliados.
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