Leandro Loyola – Revista Época
• Ele recebeu R$ 4,5 milhões de uma empreiteira do petrolão. Está cada vez mais acuado. Mas continua senhor de seu partido.
Era perto das 21h30 da quinta-feira, dia 11, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente, Dilma Rousseff, chegaram ao 5" Congresso do PT, em um hotel em Salvador, na Bahia. Uma locutora procurava criar o clima de animação necessário à recepção dos dois, com incentivos para que a militância se incendiasse com os surrados cantos de torcida. "PT, PT, PT, PT, PT, PT, trabalhadores no poder!" e "Olê, olê, olê, olá, Dilmá, Dilmá..." Mas não dava muito certo. Está muito desanimado! Nosso presidente e nossa presidenta estão aqui!"", disse a locutora. Não adiantou muito. Mas Lula e Dilma sentaram-se depois de cumprimentar uma infinidade de pessoas. Era só o começo.
Lula tem missões difíceis a cumprir. Os destinos de Lula e do PT, apesar da devastação provocada pelo mensalão e pelo petrolão, permanecem indissociáveis. Lula e sua turma, mesmo desfalcada — dois tesoureiros e dois presidentes do partido cumpriram, ou cumprem, temporada na cadeia —, mandam como nunca no PT. E os poucos adversários internos choram como sempre. — bem baixinho. Hoje, Lula precisa evitar que seu partido se descontrole. Precisa evitar que integrantes do PT dentro do governo desestabilizem ainda mais as relações com o PMDB, o principal parceiro do governo. Precisa evitar que o mau desempenho de sua pupila, a presidente Dilma Rousseff - 75% de ruim e péssimo e apenas 7% de ótimo/bom em pesquisa nacional recente, recebida e guardada pelo Palácio do Planalto comprometa de vez suas chances de ser candidato em 2018. Precisa evitar que o PT desestabilize o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que comanda um duro, impopular e indispensável corte de gastos públicos, em meio a uma séria crise econômica criada pelos descontroles adotados pela própria gestão Dilma. Precisa, ao mesmo tempo, desancar um pouco Levy para não dar as costas ao PT e a sua base de eleitores, que não estão muito preocupados com responsabilidade fiscal Vida dura essa de dono de partido.
Para piorar, o mundo lá fora não ajuda. Na semana passada, mais um golpe acertou Lula. Documentos apreendidos pela Polícia Federal na sede da Camargo Corrêa mostram que a empreiteira deu R$ 3 milhões ao Instituto Lula, divididos em três contribuições anuais. A Camargo pagou ainda mais R$ 1,5 milhão à LILS, empresa de palestras de Lula. Não há nada de ilegal nisso. Qualquer empresa pode contribuir com os institutos de ex-presidentes como Lula e Fernando Henrique Cardoso. Pode também contratar a empresa de palestras de um ex-presidente. Mas, desde que a Operação Lava Jato desnudou o esquema de empreiteiras e políticos para sangrar bilhões de reais da Petrobras, é um incômodo um político que teve comando sobre a Petrobras aparecer em relações comerciais próximas com empresas desse ramo. Na quinta-feira, a CPI da Petrobras passou por cima dos parlamentares petistas e aprovou a convocação de Paulo Okamotto - que, além de presidente do Instituto Lula, é amigo de Lula, fiador de uma dívida sua com o PT e seu companheiro de muitas viagens e estadias no exterior.
No congresso, Lula encontrou seu caminho ante a platéia petista. Discursou com a veemência costumeira. Evitou os temas complicados que o congresso do PT gostaria de discutir, como as críticas ao ajuste fiscal do governo Dilma, o imposto sobre grandes fortunas, a volta da CPMF e se o partido deve receber dinheiro de empresas nas campanhas eleitorais, entre outros. Lula jogou no campo mais seguro. Dedicou boa parte do tempo a atacar a oposição e a imprensa e a defender os governos petistas. Fez uma defesa disfarçada de Joaquim Levy, sem ser incomodado pela platéia. "O povo está dizendo que temos de manter o combate implacável à inflação. O povo está dizendo que temos de arrumar a casa, como o governo da presidente Dilma está fazendo para inspirar confiança e continuar recebendo investimentos"", disse. Ficou tão animado, que até pediu à militância mais contribuições financeiras ao partido. Saiu, como sempre, ovacionado.
Muitos petistas ajuizados preferiam que o evento nem tivesse acontecido. A ocasião era ruim. O PT é acusado de ser o principal artífice e beneficiário do esquema que desviou bilhões de reais da Petrobras para bolsos alheios ela via da propina* Seu ex-tesoureiro está na cadeia. O PT governa o Brasil na pior crise financeira na história recente e seus parlamentares tiveram de defender o ajuste fiscal.
Graças à atuação de seus aliados> Lula não foi muito incomodado. Lula defende uma volta às origens, uma guinada para a esquerda onde o PT nasceu, para sobreviver ao cenário mais desfavorável em 20 anos, A principal ideia agora é a formação de uma frente com partidos de esquerda e movimentos sociais, para disputar a eleição de 2018. É hora de fingir que nada aconteceu - um nada que, claro, nada teve a ver com Lula. Que nada tem a ver com o governo Dilma. Lula, provável candidato em 2018, parece acreditar que será possível concorrer como candidato de oposição, Voltará a se apoiar na turma que, desde 2002, o PT deixou meio de lado para vencer eleições e se manter no poder. Lula viu o presidente do PT, Rui Falcão, defender a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas, uma bandeira defendida por ele e pelo PT desde a década de 1980 até chegar ao poder. Desde então, Lula e o PT esqueceram o imposto. Desde que deixou o poder, em 2011, Lula, o candidato franciscano, passou a trabalhar para as grandes fortunas das empreiteiras financiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, em especial a Odebrecht, como ÉPOCA mostrou.
Para ter chance de ganhar em 2018, Lula terá de sobreviver às investigações abertas contra ele em Brasília (tráfico internacional de influência em negócios da Odebrecht) e no Paraná (petrolão)* Conforme crescem as suspeitas de que o petista está envolvido em esquemas de corrupção, aparece a rede de proteção montada pelo PT no governo. Na sexta-feira, o jornal O Globo revelou que o Itamaraty quer tornar secretos documentos públicos, referentes aos negócios da Odebrecht durante o governo Lula. O objetivo, como mostrou um memorando publicado pelo jornal, é impedir que ÉPOCA tenha acesso aos documentos, os quais foram pedidos mediante a Lei de Acesso à Informação.
Antes de Lula falar, Rui Falcão citou uma frase do papa Francisco sobre o desemprego. "Ê o resultado de uma escolha mundial, de um sistema que tem em seu centro um deus falso, um deus chamado dinheiro." Foi esse "deus chamado dinheiro" que, de acordo com as investigações da Lava Jato, alguns integrantes do PT veneraram no caso da Petrobras. Um deles, o ex-tesoureiro João Vaccari, está preso* Todos os dirigentes fizeram menção à prisão de Vaccari, E a platéia cantou para ele o refrão que ficou famoso com José Dirceu: "Vaccari, guerreiro, do povo brasileiro!". Lula pode ficar sossegado.
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