Ludmilla Amaral - Revista IstoÉ
• Aos 35 anos, o partido promove o Congresso da contradição. Para agradar suas bases, faz ressalvas ao governo, mas não quer largar as benesses do poder nem admitir seus erros
O Partido dos Trabalhadores (PT) sai de seu 5º Congresso Nacional, que aconteceu em Salvador entre os dias 11 e 13 de junho, mergulhado num clima de tensão e contradição em meio à maior crise de seus 35 anos de história. Hoje, o partido encontra-se numa encruzilhada. Ao mesmo tempo em que precisa dar sustentação ao segundo mandato de Dilma Rousseff, que ainda está em seu início e cujo fracasso pode jogar por terra as pretensões eleitorais de Lula, o seu principal líder, em 2018, é também conveniente ao PT manter uma distância regulamentar do Palácio do Planalto para não ser totalmente contaminado pelo seu eventual infortúnio. Foi como o partido se comportou durante o encontro que reuniu as principais correntes petistas. Apesar de atenuar o tom das críticas sobre as medidas adotadas pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o PT fez questão de realçar suas diferenças em relação ao governo Dilma.
Atualmente, no momento de deterioração da popularidade de Dilma, em que a presidente adota políticas contrárias às teses sempre defendidas pelo PT na tentativa de tirar o País de uma crise econômica legada por ela mesma, estar associado ao governo não é um bom negócio para quem será submetido ao teste das urnas nas eleições municipais do próximo ano. Por isso, antes mesmo do início do encontro, as principais correntes do PT já planejavam divulgar um documento recheado de petardos contra a política econômica de Levy. Graças à intervenção de Dilma, que ameaçou não comparecer ao Congresso do PT, mas foi demovida da ideia em cima da hora, e do ex-presidente Lula, o tom dos ataques é amenizado.
As maiores tendências petistas, o "Partido que Muda o Brasil" (PMB) e o "Mensagem ao Partido", que juntas possuíam 74% dos 800 delegados do Congresso são as que mais recuam na artilharia contra o governo. Inicialmente, a ideia era dizer que "o ajuste fiscal recaiu mais sobre os trabalhadores do que outros setores das classes dominantes." O novo texto diz que eles prometem se fiar "na determinação e competência do governo da presidente Dilma para nos liderar nessa travessia." Mesmo assim, os petistas, alegando que o governo perdeu a conexão com a classe trabalhadora e com os ideais que o partido sempre defendeu, propõem uma guinada à esquerda da atual gestão e criticam a adoção do que chamam de medidas "neoliberais" para tirar o País da crise. Outro recuo oportunista diz respeito ao financiamento das campanhas. Há dois meses, o presidente do PT, Rui Falcão, disse que a legenda não mais aceitaria doação de empresas. O Congresso petista determinou que tudo permanece como antes.
Ou seja, o partido continua a receber recursos privados. Durante discurso, Dilma pediu união e que militantes "não se submetam aos que torcem pelo fracasso do governo e do partido". Disse ainda que as medidas tomadas foram "fortes" e "conscientes" para que o governo "preserve os direitos dos mais pobres e daqueles que mais precisam do apoio do Estado." Apesar dos apelos, na lateral do auditório, um grupo de militantes estendeu uma faixa onde se lia "abaixo o plano Levy".
O PMB defende ainda a taxação de fortunas e a volta da CPMF. Já o Mensagem cobra a reformulação da política de alianças e, por meio de um de seus principais líderes, o ex-governador Tarso Genro, prega o fim do atual arranjo com o PMDB. "Não serve mais", diante da "situação de alta complexidade que vive o governo", afirmou Genro. "Se o PT não refundar imediatamente seu sistema de alianças, dificilmente terá credibilidade para se apresentar com força política em 2018", disse. A ala mais radical, a Articulação de Esquerda, que engloba a Esperança é Vermelha, de Valter Pomar, é a única que mantém as duras críticas a Levy. "(O ajuste) Coloca o PT contra a classe trabalhadora e as camadas populares", diz o texto.
Engana-se quem pensa que há algo de ideológico nas proposições das principais correntes do PT. Com exceção das tendências à esquerda, que perderam a batalha interna ainda no longínquo ano de 1995, quando José Dirceu, então deputado, assumiu o comando da legenda, as principais alas do PT seguem o receituário pragmático do líder mensaleiro. Para eles, que não se constrangeram nem em aplaudir de pé e por três minutos o ex-tesoureiro João Vaccari, apanhado pela Lava Jato,vale tudo para triunfar nas próximas eleições. Por isso, a bandeira da guinada à esquerda e mesmo a da taxação de grandes fortunas são mais uma retórica eleitoral num esforço para se reconciliar com setores da sociedade que se desencantaram com o PT do que propriamente uma tese que, para eles, deve ser seguida à risca.
Tome-se como exemplo a taxação de grandes fortunas. Como levar a sério uma proposta que vai atingir diretamente empresários que hoje são os principais financiadores das campanhas petistas e que, nos últimos anos, distribuíram dinheiro a ex-dirigentes, como Dirceu, a pretexto de pagamento de serviços de consultoria? Do mesmo modo, cheira a forte oportunismo a crítica das alas dominantes do partido à política de alianças adotada pelo governo. Foi graças a ela que o partido alcançou e se manteve no poder nos últimos 12 anos.
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