O presidente Michel Temer vem colecionando reveses e agora luta por sua sobrevivência, ao inaugurar a galeria dos mandatários da República acusados de corrupção no exercício do cargo. O pedido de abertura de inquérito dirigido pela Procuradoria Geral da República ao Supremo Tribunal Federal é claro. Temer indicou auxiliares seus para receber propinas que lhe eram dirigidas. Resta provar, se houver autorização da Câmara para a investigação no STF, para a qual é necessária a aprovação de 342 dos 513 deputados.
Temer não está sozinho. Desde a formação do ministério, os escolhidos são alvejados sucessivamente por denúncias feitas aos procuradores da Lava-Jato. Não há no núcleo palaciano ninguém que tenha passado incólume nos depoimentos dos delatores das construtoras e de Joesley. As suspeitas se estendem aos auxiliares não graduados, como Rodrigo Loures e o coronel João Baptista Lima Filho, suspeitos de recebimento de propinas. O próprio Temer já foi citado diversas vezes e será mais algumas, porque a Polícia Federal, que validou a fita fatídica feita por Joesley com o presidente na noite de 7 de março, vê fortes indícios de obstrução de Justiça. As ligações de Temer com o porto de Santos é outro veio de investigação. Há a suspeita de um decreto que beneficia a Rodrimar, no qual Loures também estaria envolvido na intermediação de propinas com destino ao presidente.
A estratégia de defesa de Temer ficou explícita em seu pronunciamento feito ontem à tarde. Ele atacou Rodrigo Janot, insinuou que ele pode ter recebido dinheiro de um ex-auxiliar, qualificou a fita de prova ilícita, preparada com "conversas induzidas", chamou a denúncia de "ficção" que busca "destruição, revanche e vingança" e se sustenta inteiramente em ilações. "Onde estão as provas concretas do recebimento destes valores?", indagou Temer, em alusão aos R$ 500 mil na mala fugidia de Loures e aos R$ 38 milhões na denúncia da PGR.
O discurso de Temer foi mais um toque de reunir para a base aliada para a batalha política da qual não pretende desistir. O governo está confiante de que contará com pelo menos 172 deputados para barrar o pedido de abertura de inquérito e está reunindo políticos de confiança do Planalto para compor a Comissão de Constituição e Justiça, primeiro destino do pedido que será encaminhado pelo STF.
Até a delação de Joesley Batista, obter um placar desse porte seria fácil para Temer. Após mais de 40 dias ininterruptos sob denúncias - e novas estão a caminho - seu desgaste cresceu e sua popularidade, já baixa, caiu mais ainda. Os efeitos da deterioração sobre a fidelidade da base governista, porém, é uma incógnita. Os tucanos, de olho nas eleições, não sabem para aonde vão - uma parte apoia o governo, outra quer romper com ele e o decano do PSDB, Fernando Henrique prega um "gesto de grandeza" de Temer antecipando eleições gerais.
O centrão, com vários políticos também em fuga da Justiça, é pragmático. Abandonou Dilma Rousseff e condenou-a para ficar com Temer. A aderência a um presidente impopular e crivado de denúncias cobra um preço eleitoral alto que ele pode não estar disposto a pagar, especialmente se puder fazer o que está fazendo com o sucessor de Temer que, em uma eleição indireta, terá a força do número para ajudar a indicar. Os indícios contra Temer são fortes e eventuais provas cabais contra ele levarão à debandada dos partidos fisiológicos.
Até que se decida a batalha política pelo menos, a reforma da Previdência não andará e há sérias dúvidas de que seja aprovada depois. O comportamento dos investidores é de inusual calma. Nem a denúncia da PGR nem a defesa de Temer provocaram grandes oscilações nos mercados. Como cabe à atual coalizão governista manter Temer ou indicar seu sucessor até o fim do mandato - a oposição não tem força para realizar seus desejos -, a política econômica, a ser conduzida pela mesma equipe, não deve mudar e essa é uma garantia de que se as coisas não podem melhorar rapidamente, pelo menos não se deteriorarão. Além disso, as condições econômicas sob as quais se desenrola o drama político são agora, apesar de nada animadoras, muito melhores que durante o afastamento de Fernando Collor e Dilma Rousseff.
O risco maior está em que, caso Temer permaneça, as concessões para se manter no cargo desviem a rota da política econômica, com consequências sérias no front fiscal, com o próprio governo que criou o teto de gastos contribuindo para derrubá-lo na prática.
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