sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Claudia Safatle - Bolsa Família pode ser prorrogado

Valor Econômico

O governo ainda não desistiu da aprovação, pelo Senado, do Projeto de Lei nº 2.335, de 2021, que reforma o Imposto de Renda e tributa os juros e dividendos, e negocia com os senadores um pacote de emendas parlamentares. Para não comprometer novos recursos, a área econômica tenta fazer uma redistribuição das emendas do relator.

Como casa dos Estados, o Senado também espera obter alguma medida que atenue a oposição dos governadores ao projeto de lei que, segundo argumentam, continua produzindo prejuízo aos Estados.

A Medida Provisória nº 1.061 extingue o Bolsa Família no início de novembro, para dar lugar ao programa Auxílio Brasil, de maior valor e amplitude (a proposta aumenta de 14 milhões para 17 milhões o numero de famílias beneficiadas), que seria financiado pelo imposto sobre juros e dividendos. Caso o Senado não aprove a tempo o pacote do Imposto de Renda, deixando para o ano que vem sua votação, o governo deverá prorrogar a existência do Bolsa Família.

Nesse caso, uma alternativa seria o aumento do benefício para R$ 300, valor que seria definido para o Auxílio Brasil, mediante decreto presidencial. Isso já ocorreu no passado recente — aumento por decreto — a partir da interpretação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), em parecer de 2018. Por esse entendimento, o Bolsa Família não é uma despesa obrigatória de prestação continuada e, portanto, não demanda compensação de receitas.

Caso contrário, conforme a interpretação da área econômica agora, o aumento do Bolsa Família requer a definição das receitas que vão custeá-lo e estas seriam a arrecadação do IR sobre dividendos.

O aumento do valor do programa, dos atuais R$ 189 para uma média de R$ 300, com a escalada da inflação deixou de ser uma medida “eleitoreira” para ser uma questão social, de sobrevivência de quem vive do benefício, argumentam fontes oficiais.

Toda a discussão original de substituição do Bolsa Família pelo Auxílio Brasil decorreu do desejo de Jair Bolsonaro ter a paternidade de um programa de renda básica para encorpar sua candidatura à reeleição em 2022. O Bolsa Família é um programa do PT, partido do principal adversário de Bolsonaro na campanha, Luiz Inácio Lula da Silva.

A inflação que, medida pela variação de preços da cesta básica, atinge 50% transformou esse reajuste em mera reposição do poder de compra, perdendo, assim, seu caráter populista e eleitoreiro, avaliam fontes da área econômica do governo.

No momento, o benefício do programa social disputa com as emendas parlamentares e com os precatórios um lugar no teto de gastos, na discussão com a equipe de economistas do governo. Uma solução para os precatórios está desenhada e deverá prevalecer.

Trata-se de permutar dívidas de cerca de R$ 50 bilhões — soma dos precatórios fora do teto de gastos — por ativos públicos. Pagamentos à vista teriam deságio de 40%.

Fontes oficiais garantem que vai ficar claro para os mercados que o teto de gastos prevalecerá, como têm afirmado os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

Tão logo se tire a questão fiscal do raio de preocupação dos agentes econômicos, afasta-se um fator de grandes incertezas que contribui para a sobrevalorização do dólar frente ao real.

A cotação, que superou R$ 5,40, não deveria estar, pelos fundamentos econômicos, superior a R$ 4,20, assinalam os economistas do governo. Incertezas e ruídos políticos produzidos pelo próprio governo estariam na raiz da depreciação da taxa de câmbio.

A política de aperto monetário para combater a inflação, ao elevar a taxa básica de juros (Selic), também poderá atrair investimentos estrangeiros em busca de maior rentabilidade no mercado financeiro, atenuando a desvalorização da taxa de câmbio.

A não aprovação, neste ano, do Projeto de Lei nº 2.335, de 2021, que trata do pacote do Imposto de Renda, não trará danos para a arrecadação de impostos até porque, hoje, a grande restrição à expansão fiscal é dada pelo teto de gastos, e não pelo comportamento das receitas.

Para fontes da área econômica, a não votação no Senado produzirá uma grande frustração no ministro da Economia, Paulo Guedes, que tem na tributação de dividendos uma das contribuições ele gostaria de deixar da sua passagem pelo governo.

Tramitação de propostas de reformas preparadas pelo Executivo é um objetivo que deve ser colocado de lado, pois o ambiente propício para o avanço de reformas estruturais já passou. “Não há mais clima”, avaliam fontes oficiais, até porque a campanha eleitoral para o pleito de 2022 precipitou-se e já está nas ruas.

 

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