O Estado de S. Paulo
Voto abre fresta para revisão da pena de Bolsonaro e abala hegemonia de Moraes no STF
O voto de Luiz Fux livrando da cadeia os
principais réus da trama golpista não muda a tendência de condenação do grupo
pela Primeira Turma, mas produz duas consequências. A primeira é abrir uma
fresta para a defesa de Jair Bolsonaro tentar reverter a sentença no futuro,
quando mudar o cenário político do País. A segunda é trincar a soberania de
Alexandre de Moraes, relator do processo.
Não é raro o Supremo Tribunal Federal mudar de ideia com o passar do tempo. No auge da Lava Jato, o tribunal avalizava as decisões do então juiz Sérgio Moro. Virou a chave depois de divulgadas mensagens trocadas entre Moro e Deltan Dallagnol. Lula deixou a prisão e foi liberado para concorrer às eleições.
Com a ajuda de Fux, Bolsonaro pode sonhar com
enredo parecido. No julgamento sobre a tentativa de golpe, o ministro embarcou
em várias teses dos advogados. Defendeu a nulidade total do processo com o
argumento de que o caso deveria estar longe do STF.
Em mais de dez horas de voto, Fux afirmou que
o 8 de Janeiro não foi tentativa de golpe, mas ato de “turba desordenada”.
Ressaltou que Bolsonaro não teve relação com a quebradeira, muito menos
planejou um golpe. “Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”,
explicou.
O ministro deixa uma trilha para os advogados
seguirem. Se hoje não há clima no Brasil para anistia ou revisão das sentenças
que serão aplicadas aos golpistas, tudo pode mudar em caso de vitória da
direita nas urnas.
O voto também afronta a hegemonia de Moraes
no STF. Na prática, a condenação teria o mesmo efeito se tomada por unanimidade
ou por placar de quatro a um. Mas, se os cinco ministros votassem na mesma
direção, a decisão teria maior força: revelaria um tribunal coeso no combate ao
golpismo.
Com um voto computado para os bolsonaristas,
aliados do ex-presidente renovam o estoque de munição contra Moraes. Antes
mesmo de Fux encerrar o voto, aliados do ex-presidente postavam trechos da fala
do ministro nas redes. Michelle Bolsonaro foi uma das primeiras.
Dallagnol também comemorou. Aproveitou para
ressuscitar em uma postagem um bordão da década passada: “In Fux we trust”. A
frase teria sido cunhada por Moro em mensagem para Dallagnol. Os dois
conversavam sobre o apoio supostamente prometido pelo ministro à turma de
Curitiba.
Os outros integrantes da Primeira Turma
estavam visivelmente incomodados durante o voto de Fux. Respeitaram o pedido
para não ser interrompido. Em clima de protesto silencioso, mantiveram os
microfones baixos, assim como os olhares, enquanto a voz de Fux enchia o
plenário dizendo que Bolsonaro não tentou dar um golpe. •
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