Protagonista da onda de manifestações de junho de 2013, o Movimento Passe Livre (MPL) volta hoje às ruas de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte contra o aumento da tarifa do transporte público. Os protestos serão os primeiros do novo mandato da presidente Dilma Rousseff e acontecerão sob críticas de falta de diálogo com governos municipais, estaduais e federal.
As manifestações contra o reajuste da tarifa, que afetou 17 capitais desde 2014, acontecem depois de atos pontuais, realizados no fim do ano passado por grupos que pediram o impeachment da presidente e a volta da intervenção militar. Em São Paulo, onde a tarifa do ônibus, metrô e trem subiu de R$ 3 para R$ 3,5 nesta semana, 46 mil pessoas confirmaram no Facebook a participação no ato, que terá início às 18h em frente ao Theatro Municipal, no centro da capital. O MTST apoia os protestos, mas não deve participar de forma organizada, segundo o coordenador do movimento, Guilherme Boulos.
O MPL teme a repressão policial e a repetição dos atos violentos que marcaram 2013. O comando da PM disse que isolará os manifestantes, poderá usar bala de borracha e revistará quem passar pela região do ato ou entrar no isolamento policial. A Defensoria Pública acompanhará a ação da PM.
Lideranças do MPL analisaram que será difícil repetir os protestos de 2013. "Não é o nosso objetivo fazer um novo 2013", disse Luíze Tavares, do MPL. "Agora a nossa luta não só pela revogação do aumento, como foi naquela época. Queremos o fim da tarifa".
Integrante do MPL, Marcelo Hotimsky reclamou da falta de espaço para dialogar com o prefeito Fernando Haddad (PT) e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) sobre o reajuste. "Ninguém conversou com a gente".
No Rio, o reajuste de R$ 3 para R$ 3,40 da tarifa do ônibus reacendeu a chama dos protestos na cidade. O MPL marcou três atos na capital em menos de uma semana. O primeiro será hoje, na Cinelândia e pelo Facebook cerca de 8 mil pessoas confirmaram presença. No entanto, o movimento parece enfraquecido e dividido.
Movimentos sociais e centrais sindicais do Rio, que costumavam participar de atos pela redução da passagem, não foram comunicadas oficialmente do protesto e ficarão de fora do ato de hoje. Segundo o presidente da CUT-RJ, Darby Igayara, "os grupos estão um pouco desarticulados, o debate precisa ser mais organizado e extrapolar o mote dos 20 centavos - que agora são 40". Para o líder da CUT-RJ, "há um distanciamento das pautas necessárias".
Um dos principais problemas é como organizar os atos para atrair de volta a população, que ficou assustada com a violência das últimas manifestações. Em nota, a PM do Rio se limitou a dizer que "estará presente na manifestação".
Os ativistas também terão de lidar com divisões partidárias dentro do movimento. Na segunda, durante reunião que serviria para organizar o protesto de hoje, ficou evidenciado um racha entre os grupos políticos que comandam as passeatas. Partidários de PSOL, PT e PCdoB trocaram ofensas durante a plenária.
Ao longo de 2014, a polícia realizou diversas operações para desarticular grupos black blocs. As ações prenderam ativistas e acabaram esfriando o movimento durante a Copa do Mundo. Segundo o estudante de Ciências Sociais da UFRJ José Antônio Abrão, "as pessoas que foram presas não faziam parte da liderança. O movimento não depende de um líder".
Em Belo Horizonte, um ato contra o aumento da tarifa está marcado para hoje. Na semana passada, uma mobilização reuniu manifestantes na região central. Agora, a expectativa é que o protesto movimente mais manifestantes. "Nossa perspectiva é ampliar a participação nesse ato para as periferias, para os trabalhadores", disse Leonardo Péricles, do Movimento de Lutas nos Bairro, Vilas e Favelas, o MLB, que está em 14 Estados. No Facebook, o ato contra a tarifa havia 7,7 mil confirmações.
Segundo a economista Júlia Nascimento, do movimento Tarifa Zero, a data do ato em Belo Horizonte foi definida para coincidir com os de São Paulo e Rio. No fim de dezembro, o prefeito Marcio Lacerda (PSB) determinou reajuste médio de 8,5% nas passagens de ônibus. A mais alta saiu de R$ 2,85 e foi para R$ 3,10. Houve uma tentativa, por parte de alguns grupos, de barrar na Justiça o aumento, mas a tentativa não vingou.
Júlia diz que espera ver mais estudantes do ato desta sexta, apesar dos esforços do Tarifa Zero e outros grupos - entre eles UNE e partidos políticos de esquerda - de buscarem participação de trabalhadores, principalmente os de regiões mais pobres. Entre os posts na página no Facebook do ato de hoje, há vários críticos à reeleição de Dilma e ao PT, de modo geral; e também críticos ao PSDB do senador e candidato derrotado à Presidência, Aécio Neves (PSDB-MG). Para Júlia, a disputa eleitoral ainda ecoa nessas declarações.
Para o filósofo e professor da USP Pablo Ortellado, que acompanhou de perto os protestos de 2013, a falta de diálogo do poder público com o MPL continua. O aumento das tarifas foi decretado, sem negociação, o que aumentou a insatisfação. Autor do livro "20 centavos: A Luta Contra o Aumento", Ortelllado disse que as grandes manifestações "estão no horizonte", mas ponderou que ainda é cedo prever se haverá a repetição da onda de protestos. "É difícil voltar a acontecer no curto prazo", disse.
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