Alivio para cortar juros
• Inflação recua mais que o esperado, e analistas veem redução da Selic já este mês
Marcelo Corrêa - O Globo
RIO E WASHINGTON - A inflação recuou mais que o esperado em setembro, o que, segundo analistas, eleva as chances de que o Banco Central decida começar a cortar juros já este mês. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a alta de preços oficial no país, despencou para apenas 0,08% em setembro, a menor taxa para o mês desde 1998. Em agosto, havia ficado em 0,44%. Com isso, há quem espere um corte de até 0,5 ponto percentual na taxa básica Selic, estável em 14,25% ao ano desde julho de 2015.
O número divulgado ontem pelo IBGE veio muito abaixo do esperado por economistas do mercado financeiro. A mediana das projeções estava em 0,19%, segundo a Bloomberg. A surpresa veio principalmente do comportamento dos preços de alimentos, que caíram mais rápido do que o projetado por analistas. Depois de subir 0,3% em agosto — taxa que já mostrava desaceleração em relação ao mês anterior —, o grupo registrou deflação de 0,29%.
Foi a primeira vez que esse conjunto de produtos apresentou taxa negativa desde agosto do ano passado, quando recuou 0,01%. Entre os destaques, está a queda de 7,89% dos preços do leite longa vida, um dos vilões da inflação no início do ano. Foi a primeira deflação do produto desde novembro de 2015.
ILAN GOLDFAJN: ‘SURPRESA POSITIVA’
Eduardo Velho, economista-chefe do INVX Global Partners, foi um dos que se surpreenderam positivamente com o resultado. Para ele, a inflação abaixo do esperado mostra que os elementos que o BC tem sinalizado como condicionantes para dar início ao ciclo de corte de juros já começaram a aparecer na economia.
— O resultado reforça a expectativa de queda de 0,5 ponto percentual já em outubro. O primeiro fator indicado pelo BC era a devolução do choque de alimentos ocorrido em julho e agosto. O segundo era verificar o impacto das elevações passadas sobre a inflação de varejo, que também diminuiu, o que é confirmado pelo viés de queda da inflação de serviços. O terceiro ponto é o avanço do ajuste fiscal, indicado pela aprovação do texto base da PEC dos gastos na Câmara. Esses três fatores estão se confirmando. Parece-me que todo o contexto é que o mercado vá reduzir mais ainda a projeção para a inflação de 2016 e, principalmente, a mediana de 2017, para menos de 5% — avaliou Eduardo Velho.
Já Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria, pondera que o BC pode ser mais cauteloso ao começar a fazer o corte. A última alteração feita na taxa básica de juros foi no fim de julho do ano passado, quando a Selic passou de 13,75% para os atuais 14,25% ao ano. A taxa não cai desde outubro de 2012, quando foi de 7,5% para 7,25% ao ano, o menor patamar da série histórica. A próxima reunião ocorrerá em 18 e 19 de outubro.
— Nossa projeção é queda de juros a partir de novembro. Mas agora aumentou o risco de um movimento em outubro. Acho difícil ser de 50 pontos (0,5 ponto percentual). Se for em outubro, começaria com 25 pontos (0,25 p.p.). Quando olhamos para as expectativas, vemos que ainda estão acima de 5%. Mesmo no cenário do BC, só havia inflação realmente na meta (4,5%) no cenário em que os juros ficavam estáveis — afirmou a especialista.
A inflação mais branda surpreendeu até o governo. Em Washington para a reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, classificou o resultado como uma “surpresa positiva”. Ele, porém, foi cauteloso ao analisar o dado, sem sinalizar que estratégia a autoridade monetária deve adotar em relação aos juros.
— Eu diria que a inflação abaixo do consenso (dos analistas) no mês passado é uma surpresa positiva, mas tivemos também surpresas negativas (no passado) e temos de manter a serenidade, olhar a tendência da inflação — afirmou Ilan.
Já o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, também na capital americana, avaliou que o resultado mostra sinais de melhora.
— Parece que a economia brasileira está voltando à normalidade. Aos poucos, o país está encontrando seu ritmo — disse o ministro.
A expectativa de que o BC aproveite a folga na inflação para cortar juros não é unanimidade. Matheus Rosignoli, economista do Santander, considera que os sinais de ajuste fiscal ainda são frágeis para dar segurança suficiente a um alívio monetário.
— A aprovação das medidas de ajuste fiscal tem de acelerar até a próxima reunião do Copom. Se houver uma avaliação de que a PEC vai ser aprovada, o arcabouço que o BC colocou vai se concretizar, logo ele vai poder cortar. (Por enquanto) é cedo para falar — observou.
Colaborou Henrique Gomes Batista, correspondente
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