Governadores
que entregaram carta a Biden praticaram uma marquetagem imprópria, incompetente
e inútil.
Os
24 governadores que entregaram ao embaixador americano Todd Chapman uma carta ao
presidente Joe Biden oferecendo o “desenvolvimento de parcerias e de
estratégias de financiamento” para a proteção do meio ambiente praticaram uma
marquetagem imprópria, incompetente e inútil. (Os governadores de Santa
Catarina, Rondônia e Roraima não assinaram a carta.)
Foi
uma iniciativa imprópria, porque não compete a governadores propor
“estratégias” a governos estrangeiros. Na carta, os doutores falam em nome dos
“governos subnacionais brasileiros”. Ganha um fim de semana num garimpo ilegal,
quem souber o que é isso.
É incompetente, porque uma colaboração internacional para defender o meio ambiente (leia-se proteger a Amazônia dos agrotrogloditas aninhados no bolsonarismo) não precisa ser buscada na Casa Branca. Até o ano passado, ela era ocupada por um tatarana. Existem organizações credenciadas para negociar essas “parcerias”.
À
incompetência e à impertinência junta-se um fator de inutilidade historicamente
documentada. Os Estados Unidos, como qualquer outra nação, tem interesses. Os
amigos são asteriscos. Governadores “amigos” acabam virando massa de manobra.
Em
1961, o presidente John Kennedy lançou um programa chamado Aliança para o
Progresso. Tratava-se de barrar a influência do comunismo cubano promovendo
reformas sociais na América Latina. Coisa fina, mobilizando quadros da elite
que trabalhara nas transformações dos Estados Unidos durante os mandatos de
Franklin Roosevelt e na Europa do pós-guerra. Nesse grupo, estava o professor
americano Lincoln Gordon, com seu currículo de Harvard e Oxford, mais a
experiência adquirida durante o Plano Marshall .
Kennedy
nomeou Gordon para a embaixada no Brasil, e ele fez parcerias com governadores
amigos, como Carlos Lacerda, no Rio, Ney Braga, no Paraná, e Aluízio Alves, no
Rio Grande do Norte. O que havia sido uma ideia de reformas sociais para o
continente transformou-se aos poucos num instrumento de interferência política.
Em menos de um ano, Gordon estava no Salão Oval da Casa Branca, discutindo
também a possibilidade de um golpe militar no Brasil. Trabalhava-se com os
“bons governadores” e estimulavam-se projetos que impedissem avanços de
candidatos de esquerda.
No
final de 1962, Gordon percebeu que a essência reformista da Aliança para o
Progresso tinha morrido. Sua embaixada, e ele, estavam noutra.
Em
1964, deposto João Goulart, os governadores Ney Braga, Carlos Lacerda e Aluízio
Alves tornaram-se joias da coroa da Aliança para o Progresso e da nova ordem. Quatro
anos depois, Lacerda e Aluízio Alves foram banidos da política pela ditadura.
Em
1971, o diretor do programa de segurança pública da USAID, filha da Aliança
para o Progresso, foi perguntado por um senador que pretendia denunciar a ação
dos torturadores brasileiros:
—
Uma dura declaração de nosso governo ou de sua embaixada talvez os inibisse?
(...) O senhor não concorda ?
—
Eu não acredito, senador, e estou habilitado a responder assim.
(O
doutor disse aos senadores que não sabia o que era a Operação Bandeirantes. Era
a mãe do DOI.)
A
essa altura, Gordon estava desencantado com os rumos do regime brasileiro, e a
embaixada em Brasília informava que seria inútil aconselhar os empresários
americanos a se afastarem da caixinha de colaborações para as agências de
repressão política.
Vila
Kennedy, um sonho americano
No
mesmo depoimento aos senadores americanos, o burocrata da USAID disse que à
noite se sentiria “mais seguro no Rio” do que em Washington. Em 1971, a capital
americana estava mal das pernas, e o Rio tinha o Esquadrão da Morte. Passou o
tempo e deu no que deu.
Um
dos projetos mais vistosos da Aliança para o Progresso foi a construção da Vila
Kennedy, no Rio de Janeiro. O projeto fazia a alegria do andar de cima. Havia
uma favela no Morro do Pasmado, entre Botafogo e Copacabana. Tratava-se de
tirar os moradores dos barracos, levando-os para um subúrbio da cidade.
Construíram-se casas populares, instalou-se uma pequena réplica da estátua da
Liberdade numa pracinha. A USAID botou US$ 25 milhões em dinheiro de hoje.
Passou
o tempo, e no entorno da Vila surgiram mais de dez comunidades e as
narcomilícias. Em 2018, a demofobia entrou na região com a cloroquina da
ocasião: a intervenção do Exército, com a utilização de 1.400 soldados.
Militares distribuíram flores no Dia da Mulher, e a Vila Kennedy deveria ter
sido a vitrine das operações militares. Virou resort do Comando Vermelho, e
dois anos depois drogas eram vendidas no pedaço em regime de drive-thru.
Madame
Natasha
Madame
Natasha faz qualquer coisa pelo meio ambiente, mas não participa de queimadas
do idioma. Na quinta-feira, não houve reunião de cúpula de chefes de Estado.
Houve, quando muito, um vídeo muito chato.
Desde
sempre, as reuniões de cúpula reúnem governantes que às vezes discursam, mas
sempre conversam reservadamente. Essa é a parte útil dos encontros. Na cúpula
de Biden, houve só a parte inútil.
No
mesmo dia, houve muito mais interesse e emoção com a plenária virtual do
Supremo Tribunal Federal confirmando a suspeição do então juiz Sergio Moro.
Rascunho
perdido
No
rascunho que Ricardo Salles preparou para o discurso de Bolsonaro de
quinta-feira, alguns países europeus seriam atacados
Os
parágrafos foram para o arquivo.
A
Europa livrou-se de uma boa.
Receio
real
Jair
Bolsonaro e seu pelotão palaciano estão convencidos de que há uma articulação
para tirá-lo da cadeira.
Quando
esse temor entra no palácio, o governo deixa de ter projeto.
Só
isso explica que Bolsonaro tenha sido capaz de dizer que “o Brasil está na
vanguarda dos esforços de parar o aquecimento global”.
Salles
na mira
O
ministro Ricardo Salles haverá de se dar conta de que a mais letal das
encrencas em que se meteu foi a da joelhada que deu na Polícia Federal, com a
demissão do delegado Alexandre Saraiva.
Para
a corporação, Salles solidarizou-se com delinquentes. Nenhuma polícia do mundo
deixa isso barato.
Braga
Netto em 22
O
general da reserva Walter Braga Netto, ministro da Defesa, defendeu o governo
dizendo que “é preciso respeitar” o “projeto escolhido pela maioria dos
brasileiros” para dirigir o país.
Fica
combinado que ele continuará na mesma posição em novembro 2022 quando terminar
a contagem dos votos da eleição presidencial.
Isolamento
no ócio
Nos próximos quatro domingos, o signatário cumprirá um programa de isolamento com ócio.
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