Vera
Rosa e Andreza Matais / O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA
- Pela primeira vez desde que foi incentivado a entrar na disputa de 2022, o
senador Tasso Jereissati (CE)
admitiu participar de prévias do PSDB para a escolha do candidato à Presidência
e construir uma terceira via, diante da polarização entre a esquerda e a
extrema direita. “Se meu nome servir para unir, em algum momento, vamos
trabalhar nessa direção”, disse o senador ao Estadão.
Integrante
da CPI da Covid, Tasso gostou de ser chamado de “Biden brasileiro” por um grupo
do PSDB que se refere a ele como o único político capaz de agregar forças no
campo de centro. Nos Estados Unidos, o presidente Joe Biden, de 78 anos, teve
esse papel. “Vejo nele um cara que está mudando a história do mundo”, afirmou o
tucano, que tem 72 anos.
As prévias do PSDB estão marcadas para outubro, mas Tasso acha melhor adiá-las para 2022. “Ainda tem muita água para rolar debaixo da ponte”, previu. Até hoje, o PSDB tinha três pré-candidatos à sucessão de Jair Bolsonaro: os governadores João Doria (São Paulo) e Eduardo Leite (Rio Grande do Sul), além do ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio. Agora Tasso, ex-governador do Ceará, também entrou no páreo.
O
presidente do PSDB, Bruno Araújo, lançou sua candidatura à sucessão de Jair
Bolsonaro. O sr. pode ser a terceira via?
Ser
candidato à Presidência não está ainda nos meus planos. Eu falo “ainda”. Eu
defendo a ideia de uma união do centro. Quando eu digo união é porque vejo
espaço, nas próximas eleições, para um candidato entre Lula (ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva) e
Bolsonaro, que não seja nem de esquerda, nem de extrema esquerda, nem de
extrema direita. Com certeza eu não acho bom para o País mais quatro anos de
Bolsonaro. É um governo desastroso em todos os pontos, da condução da pandemia
de covid – levando o Brasil ao maior número de mortes do mundo por dia – à
política econômica, que não anda. E também não vejo como repetir o governo do
PT. Então, está na hora do equilíbrio. Se dividir muito, ninguém vai
ter (apoio para chegar ao segundo
turno). Se meu nome servir para unir, em algum momento, vamos
trabalhar nessa direção.
O sr.
aceitaria disputar uma prévia no partido com João Doria, Eduardo Leite e Arthur
Virgílio?
Eu
sempre fui defensor de prévias. Mas ponderando que essa prévia seja feita
dentro do limite da coerência, de um posicionamento ético. E que sirva para
unir, não para desunir. Nunca falei isso, mas acho que as prévias deveriam
ficar um pouco para mais tarde, para que nós pudéssemos conversar com os outros
partidos. Quando defendo essa união, eu acho que não deve ser só dentro do
PSDB.
Mas, com
tanta divisão no PSDB, é possível um consenso, sem necessidade de prévia?
As
prévias são boas. Eu não sei se são oportunas agora (em outubro). Até o início do ano
que vem, muita coisa vai acontecer. Mas isso é minha opinião. Vai prevalecer,
evidentemente, a visão do partido, dos dirigentes.
Esse
vácuo não beneficia a polarização Bolsonaro-Lula?
Não tem vácuo, não. Tem é candidato demais. Daqui a pouco, um começa a dar cotovelada no outro. Ainda tem muita água para rolar debaixo da ponte. Um exemplo de como as coisas mudam: eu não sabia (em 2018) que tinha uma extrema direita tão radical e tão organizada. Foi uma surpresa gigantesca. E esse movimento se uniu ao antipetismo e à facada (sofrida pelo então candidato Bolsonaro). Ninguém sabia o tamanho dessa direita porque ela estava enrustida há muito tempo. Bolsonaro soube catalisar isso através das redes sociais.
Como
ninguém enxergou que a direita estava se estruturando pelas redes sociais?
Desde
a redemocratização se criou uma espécie de preconceito contra a direita. Era
difícil você encontrar alguém que dissesse que era de direita, mesmo sendo.
Significava uma afinidade com o golpe, com a ditadura, com o período
autoritário. Quando falavam que o Bolsonaro poderia ganhar, eu desprezava
a hipótese, solenemente. Tinha certeza de que não seria possível porque um
político que fazia aquele discurso nunca poderia ganhar. Se tem uma coisa do
Bolsonaro que nós temos de respeitar é que ele não mudou.
Passados
dois anos de governo, Bolsonaro ainda é um candidato competitivo, apesar
de todas as crises? O centro se preparou para enfrentá-lo nas redes sociais?
Não.
O centro não tem rede social organizada e espalhada. Nenhum desses candidatos
que estão aí tem. Vamos precisar ter.
O sr.
chegou a dizer que o marqueteiro João Santana, quando estava com o PT, espalhou
fake news e derrubou Marina Silva. Agora, ele foi contratado por Ciro
Gomes, que é próximo ao sr. e tem conversado com esse campo de
centro. Isso preocupa?
Eu
não sabia que o Ciro tinha feito essa contratação. Pelo caráter do Ciro, acho
muito estranho. Agora, o João Santana pagou tanto pelos seus pecados, indo
preso, que talvez tenha mudado e queira se redimir.
Dizem
que o sr. é o único que pode convencer Ciro a desistir da candidatura
presidencial em nome de uma aliança maior.
Eu
acho difícil o Ciro sair (do
páreo). Mas não acho muito difícil o Ciro vir. O Ciro já foi de
esquerda, mas hoje é de centro. E acredito que ninguém vá mudar o desejo
dele de tentar a Presidência. Ele tem esse objetivo na vida.
O
manifesto assinado por seis presidenciáveis, em defesa da democracia, é um
caminho para construir a terceira via, em 2022?
Acho
que foi um primeiro passo. Como diz o poeta, “você começa o caminho
caminhando”. Mas a abertura de diálogo entre todos esses candidatáveis é
fundamental. Eu posso ajudar, acho até que tenho uma facilidade de diálogo.
Isso não indica que seja eu o candidato. Tenho enorme admiração pelo governador
Eduardo Leite.
O que
falta, na sua opinião? É um programa para unificar esse grupo ou deixar
as vaidades de lado para montar uma aliança?
A
palavra principal é desprendimento. Mas alguns pontos são relevantes para uma
agenda comum, como meio ambiente, respeito à ciência e não desprezar a questão
fiscal.
O sr.
tem sido chamado por algumas alas do PSDB de ‘Biden brasileiro’ por ter um
perfil capaz de unir diferentes correntes. O que acha dessa comparação?
Fico
extremamente lisonjeado, mas acho que é por causa da idade (risos). Vejo nele um cara que está
mudando a história do mundo. Eu meço, hoje, a responsabilidade do Bolsonaro na
nossa pandemia através dos Estados Unidos. Prestem atenção na mudança que houve
lá no combate à pandemia depois da eleição. E agora Biden está colocando a
questão do meio ambiente na agenda do planeta.
O PSDB
passou por várias crises e não conseguiu chegar nem ao segundo turno da eleição
de 2018. Como o partido pode se reposicionar no jogo?
Todos
os partidos sofreram crises. O PSDB, o PT, o MDB... De uma maneira geral, os
partidos estão bastante desmoralizados. Nessas eleições agora, vamos ter de nos
reconstruir com um programa claro e, ao mesmo tempo, restabelecer a questão da
ética.
Além do
sr., quais outros nomes podem furar a polarização na campanha presidencial?
Tem
o Mandetta (ex-ministro da Saúde Luiz
Henrique Mandetta) pelo DEM. O PSDB tem aí tanto o Eduardo
Leite quanto o Doria. Tem o Ciro pelo PDT. Luciano Huck é o que tem mais
popularidade e está com meio caminho andado. Tem um grupo grande muito
consciente dos riscos que o Brasil corre e se dispõe a conversar.
Quais
riscos?
Se
nós tivermos mais quatro anos de Bolsonaro, vamos ser um pária internacional,
isolado do mundo. E com a economia no caos. O primeiro governo do Lula foi bom,
mas ele teve como formulador de política econômica o Marcos Lisboa. Se ele vier
com a política do Guido Mantega, do descontrole fiscal, nós também iremos por
um caminho equivocado. Temos de reconstruir credibilidade.
A CPI da
Covid pode desembocar em um processo de impeachment contra o presidente?
Não
é o objetivo. Com certeza, a CPI vai levantar responsabilidades sobre esse
drama que o País vive. Agora, eu acho que nós não devemos chegar a impeachment.
Além de ser outra crise, é inócua porque uma CPI demora seis meses. E depois,
se começar um processo de impeachment, vão no mínimo mais seis meses. O País
ficaria parado e sem rumo, já chegando às eleições do ano que vem. Agora é
trincar os dentes.
O
ex-secretário de Comunicação Social Fábio Wajngarten disse à Veja que o Brasil não comprou
antes vacinas da Pfizer por culpa do então ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
É crível que o presidente não soubesse de nada?
Eu
não acho crível. Temos de averiguar, mas acho estranho que a compra de vacinas
passe pelo secretário de Comunicação, e não pelo presidente. Até porque tem a
célebre frase do então ministro da Saúde: “Ele manda, eu obedeço”.
O que se
pode esperar da economia com o desemprego em alta e orçamento apertado? O
“Posto Ipiranga” do governo corre o risco de incendiar?
Não
tem mais gasolina (risos). Existe
uma sensação de descontrole. A economia parada, o déficit e a inflação subindo.
É o pior dos mundos. Mas
há uma coisa para prestar atenção, no ano que vem. É que, em função da
inflação, haverá uma bomba fiscal maior. Em 2022, o governo Bolsonaro terá mais
dinheiro para gastar. Acho muito difícil o Paulo Guedes (ministro da Economia) avançar
em seus planos liberais. Esse choque aconteceria de qualquer forma porque
Bolsonaro nunca foi liberal. Ele sempre foi corporativista.
Muitos
acreditavam que os militares fossem atuar como freio para o presidente, mas
ocorreu o contrário. O sr. acha que eles podem não apoiar o projeto da
reeleição?
Eu acho que os militares também ficaram surpresos. Não deveriam ficar porque Bolsonaro foi saído, não digo expulso, do Exército pela hierarquia militar. Eu acho que os militares têm de ficar neutros, como sempre estiveram. Não devemos nos preocupar com eles nas eleições. Eles têm de estar ali, respeitando a Constituição e fazendo o seu papel.
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