segunda-feira, 17 de novembro de 2025

Insegurança tem custo alto, por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Empresas evitam o país ou certas regiões, não apenas pelos gastos com segurança, mas também para não expor seus funcionários

Antigamente era o “dinheiro do ladrão”. Hoje, o “celular do assaltante”. Esse antigamente é de décadas atrás. Os mais velhos diziam que não se devia sair de casa sem algumas notas no bolso. No caso de topar com algum meliante, você teria aquela reserva para entregar e evitar um desfecho mais desagradável do episódio. Hoje não se anda mais com dinheiro. Nem os assaltantes querem dinheiro, querem um celular, de preferência desbloqueado.

Como se carrega tudo no celular, de conversas íntimas a contas bancárias, incluindo a carteira de investimentos, o roubo do aparelho tem um custo econômico que pode ser desastroso. Além dos danos morais e psicológicos. Vai daí, muitas pessoas saem com um celular mais simples, apenas com os aplicativos de comunicação e localização. Os aplicativos financeiros ficam noutro aparelho, bem guardado em casa.

Não foi uma vez que ouvi essa história. Ao contrário, tem aparecido com frequência nos diversos ambientes — no trabalho, no clube, nas reuniões sociais. Está aí, nesse, digamos, “microcomportamento”, o custo da sensação de insegurança. As pesquisas confirmam. Segundo apurado pela Quaest, a violência, ou a questão da segurança, é a maior preocupação dos brasileiros. Foram 38% os entrevistados que responderam assim. A economia? É a maior preocupação apenas para 15%.

Claro que essas avaliações mudam conforme os acontecimentos. A última pesquisa, conhecida na semana passada, seguiu a repercussão da megaoperação no Rio, nas comunidades do Alemão e da Penha. De todo modo, ampla maioria manifestou apoio à ação policial que deixou 121 mortos, mostrando que a população está cansada da percepção de insegurança.

Essa situação traz custos evidentes tanto para as famílias quanto para as empresas: contratação de seguranças com seus carros e motos, instalação de portões eletrônicos, câmeras de vigilância, veículos blindados. E o segundo celular. São os gastos operacionais, que incluem as despesas com seguro. Mesmo com tudo isso, muitos têm receio de circular pela cidade, evitam trabalhar em empresas estabelecidas em locais considerados perigosos.

Os economistas falam dos “custos ocultos” da criminalidade, especialmente quando o crime organizado atinge as proporções verificadas no Brasil. Empresas que evitam o país ou determinadas regiões, não apenas pelos gastos com segurança, mas também para não expor seus funcionários a um ambiente hostil. Não raro, são os profissionais de alta qualificação que evitam ou deixam o país. Tudo somado, isso significa menos investimentos privados, atrasando o desenvolvimento econômico.

Há também o gasto público não apenas com as forças policiais, os sistemas de segurança e os presídios. Podem-se incluir aqui os custos com saúde — ou com as vítimas de crimes. Outro custo está na corrupção do setor público. O crime organizado não vive sem comprar o silêncio e a cumplicidade de servidores, autoridades e políticos. E a desigualdade. A criminalidade atinge mais duramente a população pobre, exposta às quadrilhas nos locais onde vivem. Perdem-se jovens para o crime.

E, por falar em políticos, o Congresso passou a semana discutindo uma nova lei antifacção. Trata-se de um cacoete: diante de qualquer acontecimento dramático, deputados e senadores aprovam leis aumentando penas e definindo novos tipos de crime. É claro que se precisa de uma legislação dura. Mas se precisa mais de um sistema policial eficiente, integrado com um Judiciário que tenha um regime especial mais rápido para julgar os casos vinculados às organizações criminosas.

Essa é mais uma questão técnica que política. Há exemplos de países eficientes no combate ao crime organizado, preservando os valores da democracia. Não precisa inventar nada, muito menos politizar. Basta seguir os casos bem-sucedidos. A Itália tem o que ensinar no combate às máfias.

Quanto é o custo do crime organizado para o Brasil? Difícil calcular, variam os métodos, mas deve estar perto do que se gasta com saúde e educação. Sem resultados.

 

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