quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Liberdade, liberdade, por Ivan Alves Filho

Predomina hoje uma concepção que restringe a ação do homem baseada somente em uma questão de escolha. Sob essa ótica, quase tudo se torna prisioneiro do mercado, dos objetos que se compra na esquina de casa ao voto exercido a cada quatro anos pelos cidadãos. Na realidade, muitas das nossas opções são impulsionadas pela busca do lucro e do poder. Segundo dados revelados pelo Instituto Federal de Tecnologia, da Suíça, apenas 147 mega corporações 
controlam 40% de toda a economia no mundo. Não creio ser preciso dizer muito mais. Até mesmo o exercício do voto obedece a determinadas leis da propaganda e ao controle dos mecanismos de indicação por parte de minorias encasteladas nos partidos políticos. Ou seja, o voto como mercado pura e simplesmente.

Assim, há uma imposição do mercado sob o comando do capital; essa imposição não se exerce por intermédio da força bruta do Estado necessariamente. Ainda que não se possa esquecer que fenômenos como o fascismo ou o populismo tentam fazer, mais uma vez, com que a balança pese para o lado da dominação pelo carisma do chefe, apresentado como “escolha” – vá lá – da população. Uma combinação explosiva se aproxima do nosso horizonte, reunindo imposição do mercado e imposição política. 
 
O desgaste e o cansaço provocados por práticas que excluem a cidadania pode estar trazendo de volta a noção do chefe e do poder mantido pelo indivíduo forte, que tudo resolve e centraliza, justamente, acima das próprias instituições. Isso, com a ajuda de partidos que nada representam em matéria de lutas pela liberdade, limitando-se ao triste papel de extensão ou "puxadinho" do Estado ou até do chefe no poder. É o que nós estamos vendo ao redor do mundo.  

Estou convencido de que devemos repensar a noção de liberdade, enriquecendo-a com a inclusão em seu bojo da noção de sujeito coletivo, do homem da pólis. Debater o valor da cidadania enfim. A liberdade do indivíduo não pode se restringir à liberdade individual, centrada em escolhas muitas vezes induzidas. E isso, a meu juízo, por uma razão muito forte: vivemos em sociedade, somos seres sociais, com seus direitos e também deveres. Pertencemos a um coletivo. Indivíduo não se iguala a um posicionamento individualista.   

Vale dizer, a participação conta e muito. No caso brasileiro, a sociedade tem buscado ir à luta, apesar das dificuldades. Temos milhões de pessoas trabalhando por conta própria, entre as quais cerca de dez milhões de artesãos. Isso na economia. Mas, na Cultura, o mesmo fenômeno ocorre, com uma criatividade que se espalha pelos quatro cantos do país, com músicos, escritores e atores apresentando suas peças de teatro na própria rua, ao mesmo tempo que cresce o número de envolvidos na busca pela solução dos nossos graves problemas ambientais. 

Ou seja, a liberdade vai se exercendo das mais diversas formas, multiplicando seus campos de atuação. Aos trancos e barrancos, mas vai, colocando cada vez mais empecilhos à continuidade de práticas que se assemelham às da chamada República Velha. Falta agora que esta liberdade atinja a área institucional, a área da representação política, e mesmo jurídica, tão necessitada de novos atores e mecanismos. 

*Ivan Alves Filho, historiador.

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