Acabado o segundo turno das eleições, é hora de os partidos e seus líderes
se esforçarem para dar significado político ao resultado das urnas.
Teima-se em usar a lógica das eleições locais, ignorando suas circunstâncias
próprias, como viés determinante para projetar o futuro. Assim, busca-se
ajustar os resultados às conveniências do momento, daqueles que venceram ou
sucumbiram ao voto popular.
A contabilidade mais importante, a que interessa, porém, é outra. Passadas a
euforia e as comemorações, os novos prefeitos vão ter que se haver com uma dura
realidade: o enfraquecimento continuado das nossas cidades -cada vez mais
pobres em capacidade financeira e, por consequência, sem autonomia política.
Os novos administradores terão que governar com arrecadações e
transferências de recursos em queda e responsabilidade administrativa cada vez
maior, sem a necessária contrapartida financeira. Obrigatoriamente, serão
instados pela realidade a esquecerem a briga política e os palanques para
buscar parcerias e fazer funcionar uma inventividade gerencial, a fim de cumprirem
os compromissos assumidos com os eleitores.
Lembro que a Constituição de 1988 tratou da distribuição de recursos entre
os diferentes entes federados de acordo com suas obrigações e deveres com a
população. Movia os constituintes a lúcida percepção de que não pode existir
país forte com Estados e municípios fracos e dependentes, de pires na mão. Um
crônico centralismo redivivo aos poucos permeou governos de diferentes matizes
e se exacerbou agora, incumbindo-se de desconstruir a obra federativa criada
naquele momento histórico, de revisão constitucional.
Fato é que, hoje, do total arrecadado no país, mais da metade fica nos
cofres federais. Os Estados e os mais de 5.000 municípios brasileiros têm que
sobreviver com percentuais muito inferiores, incluídas as transferências
obrigatórias. Cada vez menos a União participa com recursos e responsabilidades
das principais políticas públicas nacionais. Basta fazer as contas: nas
principais áreas, a presença federal é minoritária, quando não decrescente.
A consequência, óbvia, consta de recente estudo da Federação das Indústrias
do Estado do Rio de Janeiro: 83% dos municípios brasileiros simplesmente não
conseguem se sustentar.
Impassível diante dessa realidade, o governo central ignora Estados e
municípios como parceiros e poderosas alavancas para a produção de um
crescimento diferenciado, descentralizado, mais inclusivo e também mais
democrático, fundamental neste momento de crise, em que as fórmulas
tradicionais estão esgotadas e fechamos o ano na lanterna dos países
emergentes.
Aécio Neves é senador (PSDB-MG)
Fonte: Folha de S. Paulo
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