A conquista da prefeitura de São Paulo fez do PT o partido vitorioso na
eleição municipal, por tudo que o cargo representa e por tudo que uma derrota ali
representaria: outras vitórias seriam minimizadas e trunfos importantes, como a
colheita do maior número de votos no país, seriam menosprezados. O PSDB sofreu
uma derrota de grandes proporções em São Paulo, mas, com vitórias em outras
paragens, embora de menor relevância, como em Belém e Manaus, o partido
conserva o posto de maior legenda de oposição e formula o discurso de que, no
conjunto do país, melhorou seu posicionamento anterior. Aliás, como no primeiro
turno, o resultado propicia discursos otimistas a todos os partidos. Perdas e
ganhos à parte, as duas siglas polares da política nacional saem da eleição com
um desafio comum: renovar seus quadros, produzir uma nova elite dirigente e
lançar novos atores políticos para substituir a geração ainda vinculada ao
período da resistência ao regime militar.
A eleição do petista Fernando Haddad confirma essa necessidade, reconhecida
ontem, em relação ao PSDB, pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em São
Paulo, da parte do PT, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva identificou
essa demanda do eleitorado e tratou de responder com ousadia, lançando um
candidato "sangue novo", desconhecido do eleitorado e sem experiência
eleitoral. Mas o PT não fez o mesmo em todo o país. Onde atendeu ao anseio por
renovação, com candidato próprio ou de partidos aliados, foi bem-sucedido.
Outros partidos que atenderam à demanda por renovação foram exitosos. Velhas
raposas, com João Castelo, em São Luís, foram derrotadas por emergentes na
política, como Edivaldo Holanda, da coligação PTC-PCdoB. A eleição de prefeitos
e vereadores é o momento natural de renovação das fileiras partidárias. Depois,
uma espécie de darwinismo político selecionará aqueles que galgarão outras posições
e disputarão outros pleitos.
Para os tucanos, a necessidade de renovação deriva do envelhecimento ou da
fadiga eleitoral de seus nomes mais notáveis, como o próprio José Serra.
Candidatos alternativos havia, bem como já era sabido, quando o partido optou
por Serra, que o PT faria um lance ousado com Haddad. Um dos postulantes no
PSDB era o secretário estadual de Energia, José Aníbal, que, embora não sendo
exatamente novo na política (já foi deputado e mais de uma vez secretário de
estado), para o eleitorado seria uma novidade. Mas, como outros postulantes,
foi atropelado pela engrenagem serrista. Arthur Virgílio, eleito em Manaus, é
da primeira geração tucana, mas os demais prefeitos eleitos pelo PSDB, nos dois
turnos, como Zenaldo Coutinho (Belém) e Rui Palmeira (Maceió), entraram na vida
política depois da restauração democrática (1985).
Para disputar a presidência, o PSDB agora só tem Aécio Neves, que, embora
seja da primeira geração tucana, é jovem o suficiente para ser considerado como
novidade no plano nacional. Mas a carência de quadros novos é tão grande,
inclusive em Minas, que ele lançou um técnico sem experiência política, Antonio
Anastasia, para sucedê-lo, numa ousadia parecida com a de Lula com Haddad. Teve
êxito. No primeiro turno, ganhou a disputa pela prefeitura de Belo Horizonte,
mas apoiando um nome do PSB, Marcio Lacerda, depois de atuar para afastá-lo do
PT. Atento à demanda pela renovação política, o PSDB planeja valorizar nomes
que emergiram agora, ainda que não tenha sido vitoriosos, como o jovem Daniel
Coelho, terceiro mais votado no Recife, no primeiro turno.
Para o PT, o imperativo da renovação é agravado pelo julgamento do mensalão.
Dois fundadores da maior importância, José Dirceu e José Genoino, foram
aniquilados pelo julgamento, e outro, Antonio Palloci, foi triturado por
escândalos que o tiraram dos governos de Lula e de Dilma. Ao longo dos 10 anos
em que o PT governa o Brasil, alguns deixaram o partido, outros ficaram pelo
caminho. Lula, com sua fina intuição, prepara o prefeito reeleito de São
Bernardo, Luiz Marinho, para concorrer ao governo de São Paulo. Mas o dilema do
PT é a renovação nacional e, especialmente, a criação de uma elite dirigente.
Fora isso, a eleição só lhe trouxe bons resultados e augúrios. Apesar dos
prognósticos de que sofreria uma devastação eleitoral por conta do julgamento
do mensalão, o PT foi o partido mais votado e será majoritário entre os
municípios mais populosos e ricos. O maior número de prefeituras continuará com
seu parceiro, o PMDB. A aliança PT-PMDB, por sinal, sai fortalecida e
consolidada, apontando para a reedição da chapa Dilma-Temer em 2012. O resto, a
vista não alcança. Depende da economia, das políticas públicas e da boa gestão
do patrimônio político que o eleitorado lhe entregou.
O futuro do PSB. O PSB sai da
eleição municipal com um crescimento superior a 40% em número de prefeituras, o
governo de cinco capitais e de cidades importantes, como Campinas, Duque de
Caxias e Petrópolis. Foi uma ascensão, mas, apesar dela, trata-se ainda do quinto
maior partido no plano municipal. Houve, sim, um importante deslocamento para
outras regiões, fora do Nordeste.
Muita especulação será feita agora sobre o destino de Eduardo Campos e de
seu partido. Como aliado histórico, o PT deve estar ressentido com as derrotas
que lhe foram impostas pelo parceiro, tal como em Fortaleza e Campinas, no
segundo turno, afora Belo Horizonte e Recife no primeiro.
Mesmo assim, se o PT não tratar agora de uma reconciliação efetiva, pode ver o
PSB deslocar-se para o outro campo, e não necessariamente lançando a
candidatura de Campos a presidente em 2014. Sozinho, o PSB pode não ter bala na
agulha para tanto. Mas está no ar (e nas urnas) o flerte com o PSDB, que
precisa cada vez mais de uma nova coalizão. O DEM, mesmo ganhando em Salvador,
é a sombra do que foi o velho PFL. Ontem mesmo, quando votava, o ex-presidente
Fernando Henrique saudou a possibilidade desta aliança, completando:
"Agora, se vão nos apoiar ou esperam ter o nosso apoio, é cedo para
saber". É certo, porém, que os protagonistas dos dois partidos, com vistas
a 2014, Eduardo Campos e Aécio Neves, juntos atendem ao anseio pela renovação.
Fonte: Correio Braziliense
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