- O Globo
• Sistema político perdeu a legitimidade
A reforma política é imperativa e urgente. Em tempos de vacas gordas, esse não seria um desafio urgente. Frente aos desafios do Brasil, é.
O país necessitará de muita governabilidade para aprovar o teto de gastos, as futuras medidas para cumpri-lo e obter a obrigatória interrupção do crescimento da dívida pública. Da mesma forma que para produzir uma revolução de produtividade nos serviços e políticas públicas que permita, mesmo com redução de gastos per capita, melhorar e muito a qualidade destas. Isso é perfeitamente possível, considerando o baixo patamar de eficiência da oferta de serviços públicos.
“A resposta é a infelicidade da pergunta”, disse o francês André Green. Reforma política para quê? Descarte-se de imediato a ideia de “para o povo votar melhor”. Como já escrito neste espaço, votar melhor é votar igual a mim, supõe, com razão, qualquer eleitor. Trata-se de pensamento, portanto, antidemocrático.
Um argumento muito mais forte é o objetivo de restabelecer condições de governabilidade, verificado que o presidencialismo de coalizão não resistiu à proliferação de partidos. Cláusula de barreira e fim das coligações partidárias já, para 2018. Absurdamente corporativista a ideia de protelar para 2022. Reforma política também para reduzir o peso do dinheiro na competitividade eleitoral que, no atual sistema, onde os estados da Federação são gigadistritos, tornou-se desproporcional em relação a qualquer democracia do mundo. Com a expressiva redução dos recursos disponíveis na última campanha municipal (mas não podemos ofertar o tempo para que novas formas imaginativas, quase sempre criminosas ou onerosas para o contribuinte, restabeleçam o fluxo do dinheiro), os próprios candidatos a parlamentares em todos os níveis podem se interessar por uma redução do espaço de disputa. Voto distrital, portanto.
Mas a principal razão é intangível. A legitimidade do sistema político-eleitoral evaporou, e é impossível sua recuperação. Os fatos e as conclusões sobre eles são evidentes demais. A pasta de dente não volta mais para o tubo e, se voltar, não será mais a mesma pasta nem o mesmo tubo.
É preciso produzir o sentimento de que algo mudou de fato, restabelecendo a legitimidade do sistema em todas as camadas da população. Só uma reforma tem a capacidade de ser facilmente entendida e apoiada até pelos eleitores menos informados ou interessados, produzindo esse tipo de reação: a ideia de proximidade, de conhecimento, acesso e controle pessoal do seu representante. Voto distrital, novamente.
Preferencialmente misto (20% ou 30%), para que as lideranças partidárias não fiquem nos bastidores e para que se eleve, com sua presença, o nível do Parlamento. Idealmente, voltando à Constituição de 1946 e permitindo que o candidato a cargos majoritários possa estar na lista partidária.
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Sérgio Besserman Vianna é presidente do Instituto Jardim Botânico do Rio de Janeiro
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