Enfraquecido em várias frentes, Bolsonaro atiça 'seu povo' e 'seu Exército' contra a democracia
O
ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva ganhou duas vezes no Supremo, com a anulação de
suas condenações na Lava Jato e a correspondente volta ao jogo
eleitoral, e essas duas vitórias devem ser aprofundadas nesta semana com a
ratificação em plenário da suspeição do ex-juiz Sérgio Moro. Significa
começar tudo do zero, para ficar no zero.
A
grande dúvida é quanto ao “efeito sistêmico” das decisões que envolvem Lula,
tanto na questão da competência de Curitiba para julgá-lo quanto na suspeição
de Moro. Se valem para Lula, por que não valeriam para todos aqueles condenados
brancos, poderosos, de colarinho branco? E o que sobra da Lava Jato?
Um a um, os ministros do Supremo negam a possibilidade, argumentando que cada “paciente” é um “paciente” e o que cabe para Lula não cabe, ao menos necessariamente, para os outros da Lava Jato. E o jornalista Carlos Alberto Sardenberg lembra que, pela psicanálise, se tantos precisam insistir que não cabe, é justamente porque cabe – ou pode caber.
Há
excitação entre condenados e alvoroço entre seus advogados, mas, quando a
Segunda Turma do STF decidiu pela suspeição de Moro, o ministro Gilmar
Mendes enumerou fatos que distinguem a situação de Lula da dos demais e
jogam luz no que seria uma perseguição política específica.
A
esses fatos: prisão coercitiva de Lula sem motivo; divulgação de uma conversa
obtida fora do prazo legal entre ele e a então presidente Dilma Rousseff,
para impedir sua posse na Casa Civil; o vazamento de partes da delação do
ex-ministro Antonio Palocci às vésperas da eleição. Sem falar nos
diálogos da The Intercept Brasil e no ponto fraco de Moro: o cargo no
governo Bolsonaro, com as urnas ainda quentes.
Dificilmente
houve algo assim em relação a empreiteiros, executivos da Petrobrás e de
empresas privadas, governadores e parlamentares, os peixes graúdos da Lava
Jato. Logo, a estratégia no Supremo para evitar o tal “efeito sistêmico” é
focar em Lula como alvo político, diferentemente dos demais.
Toda
decisão envolvendo Lula mexe com eleição, paixões, temores e ímpetos golpistas,
porque tem dois efeitos opostos para Jair Bolsonaro em
2022. Ajuda, porque a polarização fortalece a unidade do seu lado e pode atrair
parte do centro – caso não se encontre, como não se encontrou até hoje – uma
alternativa competitiva. Mas ameaça porque, afinal, Lula é Lula.
Bolsonaro
está irado, enfraquecido, nas mãos de um Centrão que não é de brincadeira e
pressionado até por líderes do capital e, claro, pelos Estados Unidos de Joe
Biden. Nada está fácil. Covid, registros de morte pela cloroquina, Orçamento
maluco, corrosão do meio ambiente, terra arrasada na política externa e a
diligência de STF, TCU e MP. A economia teria de ser um sucesso estupendo para
equilibrar. Não é nem será.
Assim,
Bolsonaro perde todas na CPI da Covid: não queria a CPI e ela foi
instalada; achou que teria maioria, não tem; tentou tirar Randolfe Rodrigues da
vice e Renan Calheiros da relatoria, perdeu; e Omar Aziz foi o “menos ruim”, o
que restou ao Planalto para a presidência, mas ele não vai sabotar a comissão,
até porque é do Amazonas, exemplo de dor, asfixia e tragédia.
Resta a Bolsonaro atiçar sua turba contra o Supremo, pelos votos de Lula, os governadores, cara a cara com a pandemia, e a mídia, que relata toda a história. Parte do plano é martelar que essa turba é o “povo”. Se 200 ou 500 alucinados atacarem de novo o prédio do STF, Bolsonaro apoiará: “Não jogarei o ‘meu’ Exército contra o ‘povo’!”. Saberemos então, finalmente, qual foi sua intenção ao derrubar toda a cúpula militar. A que saiu defendia a Constituição. A que entrou se escuda no “povo”, esse “povo”?
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