No mutirão de agregados e ideias que se forma em torno do candidato favorito à Presidência, Jair Bolsonaro, líder folgado nas pesquisas, começa a se delinear um programa liberal na economia, com mais iniciativa privada e bem menos regulação e controle, e um projeto social ultra-conservador. Não é certo o que resultará disso tudo porque a incógnita principal é o que pensa Jair Bolsonaro (PSL). O que passar pela moderação entre seus pendores nacionalistas e estatistas e o menu privatista de seu já nomeado ministro da Economia, Paulo Guedes, ainda terá de transpor um Congresso balcanizado, travessia que não será emocionante para o governo - qualquer governo.
Dos economistas agrupados em torno de Guedes emergem os esboços de um programa mais radical que a "ponte para o futuro" do governo Temer. Algumas definições básicas parecem assentadas, como a da manutenção do tripé macroeconômico, com teto de gastos, câmbio flutuante e metas de inflação. E, também pelas indicações disponíveis, se Bolsonaro vencer, seu governo vai demorar para desamarrar o nó fiscal, a principal bomba a desarmar a curto prazo, sem a qual a economia desandará em um par de anos.
Bolsonaro detonou a reforma da Previdência que está no Congresso, enquanto que o plano aparente de Guedes é ensaiar uma reforma com capitalização em uma situação de extrema penúria de recursos. São iniciativas incompatíveis, mesmo na hipótese (inexistente) de privatizações selvagens. Da mesma forma, há contradições entre elevar a arrecadação e realizar uma mudança forte na estrutura tributária, que, ao que tudo indica, implica redução de recursos. Assessores falam em ter um ou dois impostos federais apenas, enquanto que haveria isenção do IR a quem ganha até 5 salários mínimos e uma alíquota de 20% para todos - o que não só seria iníquo como reduziria o imposto dos mais ricos.
Caberá ao setor privado deslanchar os investimentos, já que o Estado não têm recursos. Para isso será importante, segundo assessores, fazer uma faxina na regulação para torná-la amigável aos investidores e juridicamente garantidora. A tentação, já esboçada, é a de tirar do caminho os órgãos reguladores e de controle do Estado. É o caso do "balcão único" para os projetos, que envolveria licenciamento ambiental sumário (até 60 dias) e desburocratizado. No dizer de Carlos da Costa, economista, sobre o licenciamento, "parece que o Brasil tem um departamento de prevenção de investimentos". Na agricultura, o ministério do Meio Ambiente seria incorporado e subordinado ao da Agricultura, historicamente permeável aos interesses dos grandes produtores.
As ideias ao redor de Bolsonaro caminham na direção de ampliar a produtividade - 20% em 4 anos, dizem assessores - para a qual contribuiriam a abertura comercial, com redução de tarifas unilateral, e algum emagrecimento das maiores empresas estatais, como Petrobras, que se desfaria de nacos no refino e transporte e da incômoda carga das exigências de conteúdo local. Definição e acompanhamento de metas seriam feitos por um Conselho de Produtividade, ligado à Presidência ou ao poderoso Ministério da Economia - unindo Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio.
O rearranjo institucional do Estado favoreceria uma concentração de decisões inédita no período de redemocratização. Com a configuração imaginada, Paulo Guedes seria o ministro mais poderoso da República desde Delfim Netto, na ditadura. Da mesma forma, o "balcão único" daria a um número reduzido de burocratas o poder de decisão sobre todos os projetos bilionários. Neste desenho, haverá óbvias restrições ao "toma lá dá cá" habitual na formação de coalizões no Congresso, que Bolsonaro diz que não fará. Não à toa, uma das ideias do núcleo econômico foi o de encurtar o caminho para a aprovação de projetos ao sinal verde dos líderes, e não das bancadas, que não parece ter prosperado.
Não será fácil lidar com um Congresso com 30 partidos. Nos projetos não econômicos, uma estratégia é mobilizar as bancadas suprapartidárias, como a evangélica, a da bala e a ruralista, que garantiriam em princípio a aprovação da revisão do Estatuto do desarmamento, permissão para exploração econômica em reservas indígenas, diminuição do poder do Ibama etc. Nas questões macroeconômicas estas bancadas racham em muitos pedaços, o que dificulta a coordenação e é um obstáculo de peso a políticas restritivas de participação no Executivo que um projeto centralizador requer.
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