Argumenta-se que a Constituição dá prerrogativa ao presidente para nomear ministros, mas a Carta também estabelece a reputação como princípio a ser seguido
A acidentada nomeação para o Ministério do Trabalho da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), apadrinhada pelo pai, Roberto Jefferson, presidente do partido, é bem um retrato das mazelas da política brasileira, em que padrões éticos e morais são deixados em plano abaixo ao de objetivos políticos. No caso, algo até relevante, a reforma da Previdência, sem a qual o sopro de recuperação econômica se extinguirá em não muito tempo, devido ao estrangulamento das contas públicas.
A distorção do fisiologismo tem ficado mais visível com a fragilidade do governo de Michel Temer, que esgotou, ou quase, o estoque de benesses com o dinheiro do contribuinte, para conseguir que a maioria dos deputados barrasse duas denúncias contra ele envolvendo corrupção e encaminhadas ao Supremo pela Procuradoria-Geral da República. Conseguiu, mas perdeu substância política.
Tanto que tem se submetido a ações nem sempre subterrâneas de interesses privados de grupos em torno da nomeação do ministro do Trabalho, pasta cedida ao PTB de Roberto Jefferson, ex-presidiário do mensalão. Primeiro, foi a ingerência do cacique emedebista José Sarney, ex-presidente, ainda ativo na política, que vetou o adversário maranhense Pedro Fernandes, deputado do PTB.
O caso da deputada fluminense Cristiane Brasil chega a ser bizarro. Descuidado, o Planalto nomeou para o cargo uma processada e condenada por infringir a legislação trabalhista. Algo como tentar-se colocar na pasta da Fazenda alguém punido por crimes financeiros.
O resultado é que a nomeação se arrasta na Justiça, desde a primeira instância, em Niterói, numa guerra de liminares. Nela, advogados, inclusive o de um dos lesados por Cristiane, um motorista particular, arguem o princípio da moralidade para barrar a posse da deputada. O governo tenta recursos, mas não tem conseguido derrubar a tese da reputação ilibada. Há a possibilidade de recurso ao plantão do Supremo, onde está a ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte, em fase de recuperação de imagem depois de barrar o escandaloso indulto que Temer e grupo queriam distribuir entre corruptos.
A Constituição, de fato, dá ao presidente prerrogativas na nomeação dos auxiliares, mas também, no seu artigo 37, estabelece a moralidade como requisito a cargos públicos. Varejista, detalhista, a Carta permite várias leituras, como encíclicas papais, e por isso o Judiciário é procurado com certa frequência para mediar conflitos de interpretação.
O governo Temer não inova. Doar ministérios como capitanias hereditárias vem de longe. Aconteceu na gestão FH, mas chegou ao paroxismo com Lula e Dilma no Planalto.
Se há choque de leituras da Constituição, preferível que se fique com o parâmetro da moralidade na escolha de ministros e de qualquer servidor público. Ou não existe alguém de reputação inatacável no PTB?
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